ESCRITOR E CRÍTICO LITERÁRIO Manoel Ferreira Neto ENSAIA O POEMA LEGITIMIDADE DE Ana Júlia Machado




Habitam-nos o espírito e toda a nossa vida a busca de real-izá-los, com a real-ização sentirmos presente a Vida, sentirmos a felicidade e alegria de havermos dado sentido, havermos construído a nossa imortalidade, havermos alimentado de nosso próprio pão com o nosso suor e esforços. A vida é curta e muitos deles, devido a estas ou aquelas circunstâncias, não tiveram oportunidade de real-izarem-se, fomos obrigados a escolher entre os mais urgentes, necessários, deixando os outros para outros tempos e possibilidades. E muitos destes, que esperaram por real-iz-ações depois, eram as seivas da vida, eram as águas que saciariam as sedes de ESPIRITUALIDADE E VIDA.
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“Lá se vão arrebóis/de minhas auroras. Onde estão girassóis/de cor tão louçã?” Cada pessoa precisa des-cobrir, à sua maneira, as alegrias da velhice. Os arrebóis dos alvoreceres não são, na memória do personagem, as alegrias da sua vida? - com certeza, sentiu-os presentes e fortes no passado, sentiu-se alegre e feliz com eles, e agora nas suas lembranças são sementes e raízes deste novo tempo.
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E os girassóis de cor louçã, onde estão? Algumas formas e expressões de alegria e felicidade características da mocidade, já não possuem o mesmo atrativo, na velhice; outras já nem são mais possíveis. Por exemplo, a participação em esportes fisicamente difíceis, as viagens e o fascínio do amor jovem podem ter sido fonte de felicidade e de júbilo em dias passados; mas para muitos velhos são apenas lembranças.
Manoel Ferreira Neto
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Legitimidade
É legítimo que certas ocasiões ambicione lacrimejar,
Mas se o gemido tapar a faringe,
Alinho as costelas, alteio a barbela e gracejo.
Gracejo francamente
Em vanguarda aos que encaram-me abatida
Pois vexatório é desprezar-se os modestos.
É legítimo que ensaie-me e somente consume-me
No sem-fim do meu inerente isolamento!
Mas quando o retiro causar repercussão na minha existência,
E avaliar-me atormentada mente isolada,
Enlaço o que cinge-me,
Aspiro visceralmente e recorda-me que a existência
É um repto em extenso tempo, ou não...
É um canto de semideuses, não de derrotados.
Emanei para avassalar.
É legítimo que feneça vagarosamente,
Quando submerge-me na nostalgia.
É legítimo que feneças
Quando avalio o pretérito a fugir pelas mestrias,
Como sombras insufladas pelo vendaval.
É legítimo que olhe para o passado na agonia
De jornadear para abaixo da idade.
É legítimo que os aljôfares pretendam explodir nos olhos
E os joelhos pretendam flectir ao ónus dos andares,
Quedes de quem não percebe por onde caminhar...
É legítimo que a perplexidade desalente
É legítimo que avalie-me confusa nas datas
É legítimo que abomine o planeta que circunda-me
É legítimo que suceda
As criaturas possuam a aparência de imagens
Narcotizadas, independentes, trucidadas, desclassificadas.
Seja quem for a criatura é nula
Nem eu sou o planeta. O que é o planeta?
Para lá de tudo é a pujança dos grandiosos
a mortificar os frágeis;
Frágeis açaimados com a realidade
a abespinhar-se pelos interstícios,
Porque a boca quedou silenciosa,
Escassa a energia, não da realidade,
Mas a energia que converte robustos os frágeis...
Assim inicia a pugna díspar nesta selvática existência.
Na floresta meramente resistem os robustos!
Se almejar-me lacrimejar, gracejo
Gracejo não coercitivamente, mas com tranquilidade
Se almejar aquietar-me imóvel a um recanto,
Sem energias para protestar...
Alteio-me e arranjo -me para operar,
Mesmo que não possua erudição de como fazê-lo.
Parada jamais
Os sepulcrários é que estão habitados
de representações entorpecidas.
Não cedo que os distintos ensaiem
a dimensão da minha míngua
Não exibo-lhes a tua avidez, nem a tua míngua,
nem o teu desamparo
Neste mundo cada vez mais feroz e desumano...
Ana Júlia Machado
#RIO DE JANEIRO, 15 DE ABRIL DE 2020, 23:38 p.m.#

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