TUMBAS AO RÉS DO CHÃO# - GRAÇA FONTIS: PINTURA/Manoel Ferreira Neto: PROSA



De onde, a ampulheta em cujo espaço oval filtra a areia à luz dos instantes e momentos, seria que mostrasse a imagem, o signo das travessias que se realizam?


De onde, o desejo incólume do silêncio consumado, nada mais de palavras, nada mais de justificar, explicar as coisas, olhando, urubuservando, con-templando as coisas do mundo, nada mais a dizer, as palavras são mui difíceis de encontrá-las, pronunciá-las, o mais difícil não é a consciência da "solidão", mas saber que inda não me silenciei vez por todas?


De onde, a claridade diáfana que perpassa a frincha do teto, através de que se con-templa a imensidão de distância de quem observa, refestelando-se no leito, deixando acumular no peito sentimentos e emoções?


De onde, definitivamente, para todo o resto do Universo, o cio impotente, orgia intelectual de sentir a vida, a vida que dói quanto mais se goza e quanto mais se inventa?


De onde, as flores artesanais e naturais a embelezarem as tumbas ao rés-do-chão, as criptas de esculturas de mármore, as velas queimando, no ritual de finados?


De onde, eu, quem sente mais a dor suposta das ondas do mar ao baterem na praia do que as sensações que se revezam tão depressa, eu, o contradictório, o fictício, o aranzel, a espuma? de onde esta alegria, contentamento de andar na orla do mar, as ondas molhando os pés, cabeça baixa, por vezes o olhar perdido na imensidão das águas?


De onde, tempo vário in-cisivo, ad-verso, ao meu-próprio-ser, in-verso, ao meu-íntimo-estar-sendo, se aceno à inconsciência lúcida as coisas que fizeram as mãos que abrem as portas, portões, cancelas, porteiras, acho metafísico não me parecer igual à idéia que faço de mim, e se batem à porta zango-me, estupidifico-me?


De onde, a impossibilidade de exprimir todos os sentimentos, o que parece não dizer nada sempre deseja dizer e expressar alguma coisa, se conheci florestas-virgens, sonhei utopias, defendi ideologias, edifiquei caminhos, institui veredas, estabeleci sendas, construí apenas castelos, liberei apenas sonhos, realizei o amor como sonhara, libertei somente quimeras e fantasias, não almejara a tanto?


De onde, a fumaça de cigarro a trazer-me melancolias, saudades de idos que inda são presentes, vivos, se na minha busca não me foi preciso a mim partir no meu desejo, me não foi necessário prever a verdade, apenas trilhar cada pegada impressa pelo homem, nas cinzas-do-tempo, e todo universo range, estraleja e mutila-se em mim?


De onde, rola auroreada, crepusculada, entardecida, a prumo sob sóis, rola no espaço abstrato, invisível, inconcebível, na noite às escuras, faltou a energia eléctrica atoamente, realmente, a meta vazia, invisível, se ir ao intrínseco, ao fundo, às pre-fundas, para saber, não, não me foi preciso, não almejaria a tanto?


De onde...?
De onde...?
De onde...?


De instantes-limites, aspirando resolver a equação desta inquietação prolixa, hermética, dúbia, ambígua: palavras e silêncio.


#RIODEJANEIRO#, 03 DE NOVEMBRO DE 2018)

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