Ana Júlia Machado CRÍTICA LITERÁRIA, POETISA E ESCRITORA ANALISA A PROSA POÉTICA /**ISHDRIM**/



Este aforismo de Manoel Ferreira Neto, é bastante complexo de analisar…mais uma vez à cata do Ser, sem limites…. pois considero que a vida é uma insignificante farsa, um enredo…

Habitámos numa era, singularmente, atrofiada de consciência. A cultura do controle e temor inundou o espírito no prosaísmo denso. E sem espírito arruinamos o que existe de superior em nós: a percepção de quem somos!

A existência, ou o que percebemos como existência e ser, é uma pintura a ser avaliada. A percepção e o espírito incumbem, no entanto, ao outro flanco dessa pintura, incumbem ao mundo, ao cosmo, ao eterno.

A Erudição tem exibido que a substância não passa de oscilação de rasgo em estabelecidas frequências e que tudo no interior desse chão igualado partilha basicamente das mesmas miuçalhas, ou do mesmo campo energético. A Erudição igualmente tem alvitrado que há mais espaço oco, ou vazio, no interior da substância do que se considerava. Inovar os paradigmas dentro desses vazios de esclarecimento, leva a inserir um novo esclarecimento e, assim, inovar nossa circunstância da existência.

Parece que, para o ser humano é a realidade mais problemática de agir, meramente encontrar-se consigo mesmo, porque nós possuímos uma repugnância enraizada e um desagrado sobre quem realmente somos. Nós cremos que há alguma coisa excessivamente desacertada!

Parecemos, naufragantes com esquecimento sondando e alojando o que restou do azar aqui e ali mas sem poder recordar inteiramente quem somos ou de onde viemos.

A verdade mais lancinante é que a humanidade foi consumada cativa de um domínio superior. Um poder que nos ofusca para a existência do que somos e do que é a existência. Um poder tão esplêndido e sedutor que nos causou edificar toda uma rede arrevesada de relações corteses, um sistema sensivelmente exemplar, chamada culteranismo, que nos aprisiona desde que emanámos a um exclusivo modo de contemplar a existência e o planeta.

Somos conduzidos a acreditar naquilo que foi colocado defronte de nossos olhos como ímpar explicação de existência exequível. Mais do que isso, somos impelidos a magicar que o existente culteranismo é o aperfeiçoamento inato da humanidade através dos tempos, elevando-se dos fojos à extensão astral por procedimento ininterrupto e instintivo que perdura até agora e que decerto nos acarretará a uma condição de existência superior através do aperfeiçoamento técnico-social.

Nossa colectividade é uma dissimulação que espelha o nosso ego extrínseco. Muitos de nós antepõem viver sob essas antefaces a existência inteira, mas aquilo que somos efectivamente, como nos enxergamos pessoalmente, encontra-se sob essa carranca civil. A pluralidade de nós não acha vantajoso tirá-las e habitam toda sua existência representando nesse estrado, rigorosamente como faziam os idosos comediantes gregos de hipocrisia, alcunhados hipócritas.

A Realidade sobre nós, a existência e o planeta que edificamos acha-se sob as dissimulações que arquitectámos, extraí-las, traduz encararmo-nos como somos. Sucede, que a pluralidade de nós não suporta permanecer a sós consigo mesmo. Alguns aprovam o mundo e sua aragem, outros, enjeitam a condição do mundo porque enjeitam a si próprios, mesmo sem erudição.

Nossa História é uma trama bem enredada onde domínios, dirigentes, povos e comunidades, idealismos e filosofias, seguem-se em colisão e investidas ferozes que nos facultam a sensação de que somos conduzidos avante sempre, direcção a um perene e implacável período progressivo das práticas e da sociedade humana.

Mas, especificamente, para onde consistimos sendo dirigidos nesse procedimento ou qual é a verídico disparidade que pode ser vista no ser humano contemporâneo e aquele que despontou das obscuridades das sociedades rudimentares?

A existência é bem mais que um método automatizado de reações bioquímicas. A existência humana estreia-se a partir de uma alma divina. A percepção desse sistema conduz-nos a contestar a existência física. Conduz-nos a reconhecer a obscuridade sobre nossos olhos, barrando-nos de lobrigar a plenitude.

E continuamos a questionar sem obtermos resposta…por isso, o escritor Manoel Ferreira Neto termina este aforismo com toda a legitimidade verbalizando;
O não-ser totalidade
O não-ser enigma de totalidade
O não-ser incógnito de totalidade
O não-ser inacreditável de totalidade
De totalidade o não-ser inacreditável
De totalidade o não-ser xis
De totalidade o não-ser enigma
Totalidade o não-ser.

Ana Júlia Machado

#AFORISMO 335/MINÚCIAS DE UMA COMÉDIA, LOGO UMA FÁBULA#
GRAÇA FONTIS: PINTURA
Manoel Ferreira Neto: PROSA POÉTICA

ISHDRIM:

Acarreto em mim a energia descomunal de questionar, mais robustez que a robustez de uma questão. Porque a questão é uma interpelação inferior ou casual e a refutação, a expectativa para que a existência prossiga a sua expedição sem limites em procura do “Ser”, à cata de suas águas transparentes e vítreas.

CORO:

Tu – quem és? Quem és – tu? És tu – quem? Quem tu – és? Quem és – quem? O que é isso – ser tu? O que é tu – ser isso? Tu – quem isso ser? Isso – quem é o ser?

És a esperança de fé que perpassa os tempos de amanhã, do infinito, dos horizontes, do uni-verso, de confins, de arribas, ornamentos de arrebiques; és a fé que suprassume as controvérsias dos desejos e vontades do eterno e imortal; és a utopia da consciência-estética-ética, da cristianidade, da transcendência, da divinidade, trans-elevância do absoluto; és o desejo do belo e da beleza, de sonhos de encontro do ser, de ser o verbo do sublime e eterno de ser a carne do perpétuo, da cáritas; és a consciência-ética-estética que re-cria e cria outros uni-versos de sonhos e quimeras, de fantasias e vontades da beleza resplandecente do amor e da felicidade.

ISHDRIM:

Passo a vida a questionar-me acerca do meu eu, e que cogito que até ao fim dos meus dias jamais vou saber o que realmente pretendo. Pois não se afigura um tema simples. E, olhando ao nosso redor cada dia ficamos com mais dúvidas, incertezas, aquele sentimento de haver-me tornado um poço de equívocos e enganos. Sou eu ou o outro que está certo, mesmo sendo um ser execrável, mas que é mais apreciado do que o ser que pensa ser genuíno? Logra afigurar-se uma questão inadequada e sem significação. Curiosamente, a réplica não se sacia com um acessível: “Chamo-me …, e para os amigos … e profissão…”, e adicionar o habitual “às suas disposições e às de Divo”. Quê encenação teatral de diplomacia e etiqueta, ainda na expectativa do coro a declamar a luxúria dos deuses. A questão é muito mais penetrante e igualmente não chega a largada célere e “filosófica”: “Eu sou eu (e as minhas razões) ”. “E tu, quem és?” é uma questão de muita relevância e sublimidade. Creio ser concentrada análise sobre mim próprio, sobre as convenientes capacidades e carências. Para qualquer circunstância que se deseje conduzir a efeito deveras na existência (isto é, para as coisas que representam e que nos cativam) é necessário interrogar-se a si exclusivo acerca dos expedientes de que se conciliam para alcançar o fim.

Em primeiro lugar, coerentemente, é necessário erudição em que posição nos achamos. Entendermo-nos do “A” ao “Z”: os feedbacks, os prazeres, as propensões, as tendências, o jeito de cogitar. “Entende-te a ti próprio” era para os helenos da Antiguidade a máxima erudição, o rebo enviesado para a edificação do homem incorruptível.

CORO:

És tu – quem? Tu - quem és? Quem és – tu? És – tu quem?
És o verbo que perpassa o sonho de esperança do amor que fecunda o desejo de conhecer, concebe a sede de compreender o inaudito do espírito de luz; és a poiésis nos interstícios das querências de alegrias que preencham o vazio do ser; és a vontade que habita o sonho de fecundar o verbo do amor, o verbo do ser e das quimeras, conjugando temas e temáticas nas raízes do tempo, nas sementes dos re-versos, in-versos, avessos das querências, contramãos das tristezas; és o amor da esperança de conhecer o que é o divino em ti, em nós, nos homens.

ISHDRIM:

Deveras, quem quer que faça-se o feitor desta máxima, redigida no templo de Delfos, alcançou em repleto. No princípio do feito mais afamado de Sófocles, Édipo é-nos ostentado como rei e, ao mesmo tempo, pai apoquentado pela epidemia que fustiga o seu povo. Partilha o seu pesar, mas não se ajusta com expelir um berreiro infrutífero. Busca os meios para achar o recurso para as imperfeições de Tebas. Édipo é um homem coeso que alcança concretizações incontestáveis e não se lega capturar na mata dos “desejaria”, “apreciaria de”, “inquieta-me”.

 O seu cunhado Creonte retorna do oráculo de Delfos com a resolução, deportar o homicida de Layo (antigo rei de Tebas e esposo de Yocasta). Mas quem era tal indivíduo? Após de questionar o agoureiro Tirésias e um emissário de Corinto, Édipo encontra com a maior das constrições que ele é o homicida de Layo, seu pai, e que reside em porte incestuoso com a sua mãe. Quis conhecer a sua essência a todo o preço e remunerou custoso, mas chegou a saber-se tal como era. Não é de admirar-se que o final de Édipo fosse funesto. Exasperado, após de recuperar a sua cônjuge e mãe estrangulada, orfana-se deliberadamente dos olhos, enterrando neles dois broches da sua indumentária. E idêntico desataque conduz-nos a interrogar o que é que teria sido melhor para Édipo: se insciência alegre, ou erudição desventurada.

O não -ser tudo imaterializa
O não -ser tudo deífico
O não- ser tudo baseia na essência
O não- ser tudo formata para ser usado
Tudo desmaterializa o não -ser
Tudo endeusa o não- ser
Tudo baseia na essência o não-ser
Tudo formata para ser usado o não- ser
O não- ser tudo desabrocha.
O não- ser tudo aromatiza.
O não- ser tudo emprenha
O não- ser tudo despetala.
Tudo fica desnudo o não-ser
Tudo emprenha o não- ser
Tudo eflúvio o não- ser
Tudo desabrocha o não- ser
O não- ser tudo enuncia.
O não- ser tudo captura conhecimento
O não- ser tudo psicológico
O não- ser tudo enternece.
Tudo enternece o não- ser.
Tudo psicológico o não- ser.
Tudo captura conhecimento o não-ser
Tudo enuncia o não-ser.

Nos nossos dias são minúcias os indivíduos que aventuram o conforto da existência que transportam para acharem a realidade acerca de si exclusivos. A narrativa de Édipo é uma ocorrência limite. É uma comédia, logo uma fábula. Mas o exemplo é claro: é relevante entender-se a si próprio. É mais arriscada uma existência de quimeras que, não é mais que um lapso que logra transportar-nos a uma existência que não ocorre de uma vida que é uma aldrabice. Ele, ao entender-se, ingressou em exasperação. Mas ambulando a mesma senda até à realidade, porque não terminar com um sublime final? Conseguimos concretizar enormes factos no decorrer da nossa vida, porque perceberemos quem somos, como operamos, quanto conseguimos conceder. Saber-nos a reentrante, é o começo para toda a existência que queira existir em plenidão.

CORO:

Quem – somos nós? Nós – quem somos? Somos quem – nós? Nós – quem somos?
A ausência de nós, a querência do múltiplo, o instinto do obtuso, a busca do pleno, a vontade do absoluto, a perda, o des-encontro, o vazio, o vácuo, o nada, as sorrelfas, os idílios, as nonadas, travessias, os olhos voltados para o infinito, a alma no compasso do quotidiano e do real em busca da presença das alegrias, prazeres, do eterno e imortal, mesmo no vai-e-vem do efêmero e etéreo, mesmo na rede do sim e do não, mesmo na dança escalafobética da contradição e das ambigüidades da consciência do presente entrelaçada à consciência histórica.

Somos nós – quem? Somos quem – nós? Nós quem – somos?
Somos os braços para a-colher, envolver, afagar e dar o colinho do peito ao outro, aos humildes, aos pobres, aos simples; somos o coração para amar, somos o espírito para sensibilizar, somos a alma para desejar, somos a vontade da paz, da felicidade, de nos encontrarmos, de nos encontrarmos em Deus, nas emoções verdadeiras, nos sentimentos de compaixão, solidariedade, somos a verdade à busca do Espírito Santo de nossos pecados e culpas.

Que cantamos – nós? Nós – o que cantamos? Cantamos o quê – nós?
A graça de sermos vocacionados à felicidade, à paz, ao conhecimento de sermos quem somos; o espírito no ritmo das buscas do bem e da compaixão, nos acordes do tempo e vivências, da solidariedade e da amizade, a alma na musicalidade dos desejos de ser, da verdade.
De quem cantamos – a graça? A graça de quem - cantamos? Cantamos a graça – de quem?

ISHDRIM:

O não-ser tudo abriga
O não-ser tudo alberga
O não-ser tudo reduze
O não-ser tudo dissimula
Tudo dissimula o não-ser
Tudo reduze o não-ser
Tudo abriga o não-ser
Tudo abriga o não-ser
O não-ser tudo espelha
O não-ser tudo substitui
O não-ser tudo revive
O não-ser tudo renova
O não-ser tudo conserta
Tudo conserta o não-ser
Tudo renova o não-ser
Tudo revive o não-ser
Tudo revive o não-ser
Tudo espelha o não-ser.
O não-ser totalidade
O não-ser enigma de totalidade
O não-ser incógnito de totalidade
O não-ser inacreditável de totalidade
De totalidade o não-ser inacreditável
De totalidade o não-ser xis
De totalidade o não-ser enigma
Totalidade o não-ser.

(**RIO DE JANEIRO**, 08 DE NOVEMBRO DE 2018)

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