NO HADES, SEM LANTERNA# - GRAÇA FONTIS: PINTURA/Manoel Ferreira Neto: POEMA






Não sou cúmplice da criação
Não sou álibi da invenção,
Não sou ovelha da re-criação,
Não sou maria-vai-com-as-outras da imaginação
Não sou cupincha da imaginação fértil,
Não sou capacho dos desejos artífices das quimeras obtusas,
Fantasias oblíquas,
Sou igual à poeira das estradas - inconsciente bruto
E difiro das estrelas, lua, nuvens brancas e azuis
Pelas inépcias, inércias,
Solércias, peripécias,
Sou poeira nas calçadas de avenidas e ruas,
Nas margens de caminhos,
Da lama eterna, sou habitante
Danço, contradanço
Hipocrisias performa passos
Ao som das ideologias chinfrins
Posturas e condutas aleatórias
Tempo presente de silêncio
Ipsis verbis introspectivo
Não viajo, não remo barcos ou canoas,
Não velejo
Não mergulho nas águas do mar,
Senão sentindo posso retornar à superfície,
Dando-me pé,
Sento-me na cadeira de praia,
Deixo as ondas tocarem-me os pés, a anti-perna
Tenho atrás dos raios numinosos do sol
A dor e a vida, o sofrimento e a ec-sistência
Dados de há muito a muitos como pena
Inscrevê-las nas tábuas dos sonhos e utopias.
Sou parente, irmão, de um rio sem fundo,
De um fundo sem rio, de um sem-fundo do abismo,
De águas sem moléculas.
Estou encurralado no abismo.
Estou enchafurdado nas cavernas.
Estou enclausurado no vácuo
Que separam céus de infernos.


Estou no Hades; e sem lanternas.


#RIODEJANEIRO#, 03 DE NOVEMBRO DE 2018)

Comentários