#AFORISMO 459/NEM TÃO REPENTE... CONSUMOU-SE TRANSIÇÃO# - GRAÇA FONTIS: PINTURA/Manoel Ferreira Neto: AFORISMO


Quero algum dia, sem noção de quando, sonhando
O além, fazendo versos dobrados, a flor maravilha
Quero trazer nas mãos em concha, regressando muitos anos
Aos pensamentos que não re-tornam mais,
Quero andar no campo, passeio, de capim viçoso,
As árvores de flores verdes,
Ouvindo os boiadeiros passarem, tocarem o berrante,
Tardes de gado passando, tardes de ovelhas, carneiros,
Sendo guiados por idoso homem, à beira dos trilhos da estrada
De ferro,
Pastor vai, pastor vem, na sua paixão pelo rebanho,
Refiro-me ipsis verbis e litteris ao homem que conduz as ovelhas,
Nada de metáforas, signos, símbolos...
Faço a separação,
Ouço o choramingar da cadela, que se faz auxiliar do pastor,
Neste trajeto até o curral...


Tocando os "fois", canção de idos, outroras,
Tocando-os-que-serão, a voz do além chamando o silêncio,
Este mistério... quê indevassável!
O pranto molha-me o rosto,
Sentindo-me emocionado, lágrimas descendo-lhe.


Ontem,
Os raios numinosos do sol foram vivos, ardentes,
Ontem,
Os sentimentos da verdade foram efêmeros, passageiros,
Ontem,
O verbo amar não tinha o indicativo, subjuntivo, gerúndio, particípio
Além de haver sido intransitivo, era defectivo
Ontem, na volta da estrada, bem em frente uma encruzilhada,
Imagens celestes aporeticamente desenhadas, pintadas,
De um lado tinha fogueira, ao lado tinha violeiro,
O coração sentiu frio,
Ontem, os desejos, vontades do eterno
Foram meras contingências diante da efemeridade do tempo,
Frente às carências, solidões,
Frente aos medos, inseguranças
Ontem, as esperanças, fé, sonhos
Foram projetos, foram inspirações, foram aspirações
À mercê das angústias, melancolias, nostalgias, saudades
Ontem, a vida consumou-se de pretéritos, aquis-e-agoras...
O tempo é uma serpente que leva para o fim da vida,
Face bem marcada,
Os sonhos estarão ficando para outras conjugações...


Ontem, a alma do espírito feneceu, o espírito da alma pereceu,
Ontem, o nada
Ontem, o não-ser
Ontem, as nonadas
Ontem, o vazio,
Ontem, o silêncio da viola,
De tudo, o que é isto - a vida?
De tudo, o que é isto - a esperança?
De tudo, o que é isto - o sonho?
Contingências, imanências,
Dores, sofrimentos...
Tenho por mim sentido e pensado muito,
Às margens do rio verde,
Só versos trovadores, perscrutando o
Toque do vento sereno...
O coração vazio,
Sereia pulou no rio, para onde fora não sei.
O chicote das recordações,
Avanço para o fim da estrada,
Por capricho, na minha mente
Está presente o meu passado.


Ontem, quem fui?
Ontem, o que fui?
Ontem, o que seria hoje?
Ontem, sonhei realmente?
Ontem, tive mesmo esperança?
Ontem, desejei o amor?


Ontem, a vida fácil - as contingências
Ontem, o que me era dado viver, o berrante ficou mudo - a espera da morte,
O destino, a saga, a sina
Ontem, o amor de efêmeros em efêmeros.


Hoje, o vento
Hoje, ao longe no horizonte a luz do sol
Hoje, aqui, a eternitude dos desejos, vontades


Hoje, a eternidade
Construída de eternítudes,
Montado na Liberdade,
Na carroça, na caravana, na traseira de caminhão,
Carro de boi, o Amor investigando, sentindo, vivendo
Hoje, o espírito do amor habitando o ser
Hoje, o amor do espírito vivido no ser.
Hoje, a felicidade
Hoje, a alegria
Hoje, o tempo na sua dimensão de amanhã.
Hoje, o sentimento de minh´amada na moldura do eterno,
Comunhão, síntese, adesão, koinonia,
Antíteses, contradições, o coração pulsando de liberdade,
Até mesmo a samambaia dependurada na parede, quer mergulhar
Na liberdade, quanto mais caminho - um estranho ao estrangeiro.


Verso-Uno da ilusão suprema, querença,
Liberdade e Amor, o espírito que se entrega num abraço... no coração
Voam livres, quando vai morrendo o dia, os raios de sol se recolhem...
O tempo é uma serpente que leva para o fim da vida.
Liberdade e Amor... O céu aqui na terra...
O silêncio é o condor que guia para as luzes do invisível...


(**RIO DE JANEIRO**, 10 DE DEZEMBRO DE 2017)


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