CANTO QUE O HOMEM COMPÕE SECRETO NO LABOR DAS OFICINAS# GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: PROSA $$$




Epígrafe:
Onde terminam as palavras, começam os sonhos das imagens e vozes do silêncio, ritmo e cores da solidão, arranjo da liberdade.(M.F.N)
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Proseados os silêncios da noite, vozes sussurram "existir" ser "cuidá-la, amá-la", a existência, sabendo, conhecendo as tramóias, trambiques do efêmero, contradições, nonsenses, trafulhas do destino e da liberdade, ruminam, cochicham, murmuram sons verbais de desejos, desafio e liberdade em questão...
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Noite passada, a esposa disse "Oh, meu amor, as idades sessenta e três e sessenta e quatro são de risco, muitos partem. Se deseja mesmo viver mais, há-de se cuidar...." Por mais longas sejam as {vias por onde projectar as perspectivas}, o tempo é ainda curto para semear as sementes colhidas, mister a presença da ousadia de enfrentar o inevitável, {o diamante, polido, que risca o etéreo é a consciência das mazelas pretéritas}, o resto é saber os tempos mudam, o que fora autodestruição tornou-se amor, hei-de cuidar, serão inúmeras as travessias antes do nada eterno. Inda hei de cavar o objeto que intencionei, degustar-lhe o sabor. Não é longo mentar uma flor? E permitido, efetivamente, correr o espaço da ponte para realizar a travessia do rio presente ao futuro rio, construir de sombras a aurora bureal? Há inúmeras travessias a serem inda realizadas.
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Sou voz de olhares, sou olhares de palavras pronunciadas com perfeição, ditas na imperfeição do pretérito, nas dúvidas e inseguranças do presente do indicativo ou subjuntivo, ímpeto de lábios úmidos de êxtase, sorrisos, volúpia de palavras, tesões e tensões do Eros, pathos e logos, volúpias de sentidos e significados, êxtases da vontade e desejo de ser-com-o-ETERNO, de com-o-ETERNO, pelos, poros, pensamentos, as mãos serem os objetos do destino...
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Sou desfrutar de um... desfrutar de um sono cuja tarefa é a própria vigília, as reticências e as pausas por quê? Seria que não fossem o que poderia ter esperado? Não poderiam ter sido gravadas no coração. Ver o mundo por meio de valores e ideais, eis a face da cruz eterna exposta a todos os universos. Palmilhar este mundo é convidar as intempéries para um banquete dos mais suntuosos, a redenção nos labirintos dos tempos edificar-se-á. Belíssimo conforto!...
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Sou espera, movimento, gota de chuva que desce serena o vidro da janela da sala de estar, onde sempre me encontro, pensando nas real-izações e fortunas, procurando um pote de ouro, enquanto observo o céu, os horizontes, o uni-verso, enquanto con-templo o mundo, em mim dentro volúpias, sensações e sentimentos ávidos, mergulhando-me inteiro em busca de mim, desejando perder-me e entrelaçar-me ao que é em suas profundezas – a chuva é sempre iluminação que se me a-nuncia para os questionamentos mais profundos, abissais, abismáticos, convite para riscar o étereo com a pena de caneta tinteiro, desejo de ouvir-me sendo, de escutar o ser, recitando a lírica da vida, declamando os versos dos sonhos e utopias, con-templ-orando as estrofes das quimeras em ilusões da verdade e do espírito do ser-eterno, nos seus valores e virtudes que nascem e re-nascem na roda-viva das situações, nas voltas e re-voltas do coração, discursando em verbos defectivos as imaginações do real e equívocos do irreal, em equívocos do real, as imaginações de verbos defectivos, uma lufada de vento vindo de leste, lua boiando na noite, estrelas nadando no nada e no itinerário de suas quedas, risco de estrela cadente, brilho transparente por velar as utopias da humanidade, os ossos da injustiça.
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Proseadas as vozes ouvidas no sonho, vozes que diziam coisas sussurradas, mas inteligíveis, haveria de encontrar modos e estilos para re-presentá-las, pude guardar na lembrança algumas passagens, teria de dizê-las.
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Sou descrença em tudo que foi composto, fabricado, construído ontem e hoje. Sou mal-estar e escárnio que não podem mais suportar o "brechó" de conceitos das mais diversas origens para a Verdade, que performam os passos para a dança nos mercados editoriais e publicitários.
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Sou a mão que tece o pano e nudez de corpo sereno. Sou tear na madrugada, esperando-me acordar, trajar-me, ir trabalhar na fábrica têxtil e fabricar dias plenos, a imortalidade da vida feita de trabalho e de esforços di-versos, de lutas in-versas, lazeres re-versos, segundos e minutos sublimes, criando fantasias e ilusões que me encaminham e orientam nas veredas dos desejos e vontades de encontro comigo, de ser-me, de viver-me, retornar-me ao fim do expediente e descansar na rede, lendo A hora e vez de Augusto Matraga, como guia de leitura e aprofundamento na obra rosiana, que saiba eu o que con-templa a estética da arte e a ética da filosofia, vislumbra e a-lumbra os desejos da verdade, a vontade de conhecimento, ou deixando-me livre no seu balançar, balançando ao ritmo do presente e do futuro de minha vida e ec-sistência, são as memórias e lembranças.
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Se ec-siste diferença entre viver e ec-sistir? Sinto essa diferença no íntimo de mim, é fruto de minhas andanças, dos pensamentos e idéias que se afloraram no de-curso e per-curso delas, das experiências e vivências ao longo das atitudes e ações, problemas e conflitos, dores e erros, sofrimentos e acertos. A vida permite que as águas límpidas do rio que passam por mim, águas vivas, da Fonte In-finita fluam livremente pelos canais finitos – a vida é suprema sabedoria e perfeita felicidade. Ec-sistindo, o silêncio auscultativo da alma escuta o silêncio eloqüente do Espírito, ouve a solidão, semente dos desejos e vontades do verbo da alma.
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No silêncio e na solidão encontro o verso poiético da vida, sigo as veredas do quotidiano sentindo no peito e no espírito os prazeres e felicidades de estar-sendo. Atando-me estritamente/Aos fragmentos de peculiares sonhos/Fantasias estranhas, vezes fugazes/ tornarem_se grande fator de intensidade/No equilíbrio das emoções e sensações/Nessa lépida travessia/o encontro de sucedâneos correspondentes às minhas vontades./
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Sou o novo canto que o homem compõe secreto no labor das oficinas. Vou aprender no campo o ofício das mãos que lavram a terra e vão jogando nas covas os grãos que serão colheitas, como um índio apache, Massai, que se inspirou na arte da plantação dos cherokees. Como na tribo de Cochise, na cerimônia de casamento, os corpos são dois, mas há somente um sangue que corre nas veias de ambos - quando da preparação do cerimonial, corta-se o dedo indicador de ambos e amarra-os juntos, depois ajoelham-se. Quero a existência e o amor conciliados, o sangue único nas veias a correr os sonhos e utopias da Vida e Arte. Quero estar perto no dia em que a madura espiga seja o pão que mate a fome daquele que a plantou.
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Sou rumores, sou gemidos. Sou sussurros, sou murmúrios, sou cochichos, sou cochilos. Sou ruminâncias, nos dias de angústia e vazios, nas horas de lembranças e recordações, nos minutos de vazios e medos, sobretudo da morte, nos segundos de inseguranças e utopias, sou tristeza e desolação na morte de ente querido, de amigos por quem alimentei desejos de muitas felicidades e alegrias, sou gritos de angústia, sou risos de alegria e felicidade. Sou a Felicidade de comungar, aderir, re-colher, a-colher o que é vivido na intimidade do AMOR, dividir sonhos e esperanças...
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Sou pernas varando o tempo, sou pés re-duzindo as distâncias, multiplicando as long-itudes, sol no rosto e um fardo colorido, a hora que chega e se perde, mas volta com nova força, com nova dis-posição para outras jornadas e aventuras.
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Sou lembranças do raio de luz e o sopro com que apaga na noite o lume que acendo. Sou obstinação: a lenha que re-colho, o archote com que preparo o fogo que rasga o negrume, que des-fia a escuridão, que des-carna as sombras. Sou a idéia de uma pombinha a ciscar em praça pública no alvorecer da manhã, enquanto transeuntes passam para mais um dia de trabalho, o pão para saciar a fome seja obtido com sinceridade e responsabilidade, pairando sobre um abismo.
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E quando sou a idéia, sou o pássaro, sou a pombinha. E quando sou o vôo, sou a liberdade de ser e viver, de rasgar os uni-versos e horizontes em busca da plen-itude dos raios de sol, das estrelas, da lua, {da sublim-idade da noite, do mistério, das sombras, da escuridão fechada e hermética}, que agora é cheia, e a terra parece toda iluminada e cristalina.
#RIO DE JANEIRO(RJ), 07 DE JULHO DE 2020, 07:34 a.m.#

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