CORRENTE DAS VERDADES ÀS AVESSAS GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: PROSA
O dia que
amanhece atrás de uma beleza incrível a olhos nus; indizível, inverossímil.
Beleza muda, silenciosa: a mudez de sentimentos lindos e breves, de emoções
vivas e efêmeras, de sensações suaves; o silêncio da sensibilidade que anda em
câmera lenta num campo aberto, a perder de vista, numa grama respingada de
orvalho da noite; da emotividade que se senta ao portão de uma casa e fica a
olhar para o infinito, circunspecta, perquiridora, as nuvens brancas e azuis.
Uma
recordação irresistível e magnificente: a irresistibilidade de olhos que se
encontram numa noite enluarada, a luz cheia, vermelha e amarela, numa
conciliação de esplendor e maravilha, numa conjugação de infância, inocência e
ingenuidade; a magnificência de esvaimentos que se aniquilam a si mesmos;
magnificência de um viver marginal do fantástico, de uma vida estrangeira que
inventa a lei a que se submete, cria a verdade a que obedece e venera, sonha o
eterno a que se entrega in totum.
A memória de
um passeio ao final da tarde, passos comedidos, subindo a montanha, pisando nos
cascalhos, vendo poeira nas folhas das árvores, folhas e gravetos secos no
chão, árvores de troncos enormes e raízes que se afloram do fundo da terra, a
água cantante de um pequeno córrego, a grama dançante, a dança de uma evidência
que se faz necessário escovar-se todas as manhãs; as manhãs perderão as cores e
a vida saindo da água, subindo a corrente das verdades às avessas, num silêncio
mudo e seco.
O dia está
para além do corcovado, silencioso, radiante, esplendoroso: de um silêncio
indisciplinado e desordeiro, um pedaço de matéria escravizada, submetida a uma
ordem óbvia, mas o significado é desordenado, invertido, despido de
caracterização, palavra, mensagem, conteúdo.
Realidade
total do Homo Faber e Homo Sapiens. A palavra exprime e expressa o humano e o
sensível. A letra registra e imprime quem somos. A frase descreve o sentido
correspondente que pode ser exposto no coração puro, na consciência evidente,
na razão que diz a si mesma, na emotividade do homem bom e honesto. O parágrafo
narra a porção de harmonia possui os homens honestos, sinceros, espontâneos.
Disserta o homem jamais renunciará e resignará ao sofrimento e à dor, ao caos
da História Universal, em detrimento da História da Humanidade. A sentimentalidade
do amar apaixonadamente amado, ao carinho tenro e tênue, à afeição madura e em
plena civilização, à harmonia sonhadora, ao primitivo e à criança.
A identidade
filosófica e analítica de por baixo de feições singelas e agradáveis.
Um tempo
imenso estranho e estrangeiro. Há dias em que o sol parece ir rachar o chão; um
calor insuportável, seco, sem vento, suor escorre livremente pelo rosto,
independente da vontade, tudo aberto, escancarado, de um extremo ao outro. Tudo
irá ruir muito em breve frente aos olhos.
O sol quer
firmar-se. Não o fará. A sua claridade será por pouco tempo. Aqui dentro, faz
um pouco de frio. Esta pouca frieza permanecerá por todo o dia.
#riodejaneiro#,
28 de maio de 2019#
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