ÁDITO DA ENTRADA# GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: PROSA
Meu modo de
agora, de instantânea dita, presenteia-me um deleite indomesticável como se
apanhasse um escol de esquiva formosura, brotada em loco inconsolável, ao gosto
da ventosidade. Meu estilo atual, de metafísicos dizeres, doa-me um
refestelamento indescritível como se colhesse uma erudição de adjacentes
esplendores, ao saber de chuviscos. Minha linguagem atual, de suspeitas falas,
lega-me verbos suspensos no tempo, e com eles vou tecendo sentimentos e ideias
do que precede a essência, a existência. O sigilo, enquanto assim possa ser
designado, conceituado, retem-me num gênero de extasio, num isolamento entre os
homens, num divórcio tão perfaço como o de um algar no meio da serrania.
O mundo me
avalia esquivo, pérfido e adverso, errado, re-verso, in-verso, alheio, avesso,
intransigente, prepotente, ovelha desgarrada(está no sangue andar sozinho por
entre os homens) O meu transcorrido, isolado e sombrio. O vindouro, uma
melancolia tosca que incumbia delinear em formatos toldados. Ultrapasso o ádito
da entrada, importando fé, canícula e júbilo, exportando náuseas, vazios e
nada. O instante travo converte-se, imediatamente, num instante bem-aventurado,
num momento de júbilo.
A luz
engolfa-se, condensa-se na borda fronteira do relógio - o mostrador escoa-se.
No escuro, disco suspenso no nada. Caos. Som imerso no primitivo. Alucinante.
Ritmos que não podem ser pensados, verbalizados.
Ando a
vagar. Ventos percebidos no espírito. Palpitação de asas sobrevive no mistério,
enigma. Dilatado. Esquecido de mim. Olvidado de lembranças, visões. Logo, não
além da eternidade, sim aquém da contingência.
O universo
imputa todo o seu progresso a sujeitos des-venturados. Os ditosos limitaram-se
dentro de modelos clássicos, regressivos. Postam as mãos à terra, os pés ao
céu, agradecendo a sublime inteligência e sensibilidade com que foram dotados.
Possuo a intuição de que, daqui por defronte, a minha legação será cultivar
sémenes de diferentes mastros, confeccionar vedações, e, quiçá mesmo no tempo
propício, edificar um lar para distinta gênese, e, numa locução, conciliar-me
aos preceitos e às praxes pacatas da agremiação. Meu comedimento será mais
pujante do que qualquer propensão titubeante da minha parte.
Nesta hora
tão repleta de receios e perplexidades, verifica-se o portento sem o qual toda
existência humana é um vazio. A graça, que converte tudo real, divino e
estético, descai sobre mim.
(**RIO DE
JANEIRO**, 13 DE MAIO DE 2019)🦋
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