#INSUSTENTÁVEL LEVEZA DA NORMALIDADE# GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: PROSA SATÍRICA
O homem
nasce despirocado, des-conectado, louco de pedra, com os instintos de
trans-gressão das leis, dogmas, preceitos, morais e éticos, princípios à flor da
pele, mas, no passar do tempo, a sociedade lhe vai mostrando os pingos nos iis,
para que sobreviva é preciso, em primeira instância, seguir o rebanho, rebanho
de ovelhas alucinadas pelo poder, pelas glórias, para que viva faz-se mister
aceitar e ad-mitir hipocrisias, farsas, falsidades, aparências, entregar-se ao
dinheiro, aos bens materiais, pois que são a semente e o húmus da vida, sem
eles nada é ou será. Curar a loucura, doidice com hipocrisias, farsas,
falsidades, aparências... quê supremo valor este da Trans-modernidade!...
E o doido,
ensandecido com a morte, aquele medo horroroso de morrer doido e haver passado
a vida em negras nuvens - se é que doido sabe o que é isto, a morte, se
distingue as negras e brancas nuvens -, assina a papelada da lealdade e
fidelidade, através do beijo molhado nas páginas, das digitais, não sabem ler
ou escrever, sem ao menos haver atinado com tudo que a sociedade canta,
decanta, declama, recita por todos os cantos e re-cantos. Um cadáver de louco é
um belo pensamento para o verme e o verme é um pensamento horrível para o louco
vivinho da silva. Os vermes, desde a essência que lhes habita os interstícios,
âmagos e redutos sonham com um reino celeste sob a forma de um corpo bem gordo,
os professores de psicanálise, psiquiatria procuram o deles, o reino celeste,
remexendo as entranhas de Schopenhauer e enquanto houver roedores haverá também
um paraíso de roedores.
O simples
fato de se per-mitir, con-sentir sua loucura, haver nascido louco, é em si uma
confissão. Todos tem o direito de escrever a própria biografia desde nascer
doido até o seu conserto, até a sua cura, depois dos quarenta anos. E já que a
paráfrase de Jean-Jacques Rousseau se mostra desde o início, parafraseemos
outra coisa: "Não acredite nos loucos depois dos quarenta, estão
perfeitamente consertados e curados", que foi, digamos assim, um lema dos
anos 60: "Não acredite nos homens depois dos trinta anos". De fato,
mesmo o mais louco está por vezes no caso de ter vivido algum segundo de plena
sanidade mental, de ter visto de perto o que é isto de maria-vai-com-as-outras,
os benefícios que traz, as glórias que recebe, coisas que para um pensador de
escol pode parecer algo de precioso e digno de atenção. Confessar a própria
cura da sandice despirocadamente louca é desde a eternidade ao infinito mais
pretensioso, pois, isso supõe que o louco que confessa sua cura com as verdades
da sociedade confere importância não somente ao processo que vai do nascer
pirado até a insustentável leveza da normalidade, mas também ao que acreditou e
acredita ser o seu conserto, a sua cura.
Há-de se
indagar, questionar, perguntar se há dois seres exatamente iguais, o louco e o
normal, e que a lei da di-versidade individual fundamenta toda a evolução do
homem desde o seu nascimento psiquicamente des-virtuado até o ápice do filisteu
instruído. E neste âmbito da cachuleta despirocada, creio que poderia sem
quaisquer pejos dizer que o mal dos homens é que preferimos ser arruinados pelo
elogio a ser salvo pela crítica. Convidai um louco para jantar: irá pentelhar
todo o tempo com um silêncio proscrito ou então com questiúnculas desincadas.
Convidai o louco a um baile e haverá de dançar como um camelo que corcoveia.
Levai um louco a um espetáculo e bastará seu aspecto para silenciar o povo que
diverte, espairece as idéias, obrigando os organizadores a retirá-lo, como
ocorreu com Catão que não conseguiu se desfazer de seu ar carrancudo
Mas qual é a
idéia da sociedade que cura o louco?: "Age como se não houvessem
diferenças individuais."
#RIODEJANEIRO#,
27 DE MARÇO DE 2019#
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