#LETRAS VELHAS E MIGALHAS DE PÃO SECO# GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: MONÓLOGO PROSAICO ***
Epígrafe:
"Porfiam
os ecos na solidão
Com ares
de imediata remissão
Sem
constrição, do espesso às sutilezas
Cresce-se,
cria e o irrevelável se revela
N'uma
canção silenciosa
Certificadora
da luz-da-vida."(FONTIS, Graça. In: Az-viando Caminhos, RJ, 2020)
***
Letras
velhas e as migalhas de pão seco, por caírem todas juntas no solo, antes que as
pudessem segurar por um minuto mais, cairiam nas águas, fazendo o barulho que
não consigo expressar em palavras, mesmo recorrendo a todas as intuições de
poemas; ouço o cair de todas juntas no chão, disse antes “solo”, fluxo de
imagem, e isto não tem qualquer importância, imaginariamente que seja, quando
os pingos de lágrimas enegrecem os caminhos de pedras... denigrem os caminhos
dos escravos...
***
Seria
isto, em verdade, o que estou buscando expressar desde tempos imemoriais e até
este minuto em que me vieram à mente idéias e sentimentos por os ter
perquirido? Fundamental para a compreensão o que é este mero vínculo de
sentimentos que me afloram espontaneamente, por mais incrível que possa
parecer, por "increça que parível", e todos os argumentos nada mais
têm a dizer senão que é a verdade; incrível que, se me revelam o único
mistério, este que sei lá o que é, rio-lhe nas faces, perguntando se é o único,
que outro então lhe legaria este poder, de ser o único... Para o único o juízo
de alguém é imprescindível!
***
Os poetas
dizem as estrelas brilham para velar o ossuário da terra... Digo, quem sabe até
plagiando, encontrando outras palavras que conservem a idéia: "o mero
vínculo de sentimentos, dado ao sossego das folhas de árvore qualquer nas
serras, brilha ao sol de minhas alegrias, embora um pouco contidas, por esperarem
outras noites que virão, envolvendo-me como a visão nítida de letras quaisquer
numa folha de papel, que fosse misteriosamente minha." "Porfiam os
ecos na solidão/Com ares de imediata remissão/Sem constrição, do espesso às
sutilezas/Cresce-se, cria e o irrevelável se revela/N'uma canção silenciosa/
Certificadora da luz-da-vida." Embora toda a parafernália da linguagem e
estilo, expondo com mais veemência a metáfora, os sentidos são "ad
versus", a poética torna-se metafísica das velas que instigam poetas a
deixar a pena em suspenso, ouvir a luz da canção silenciosa, o som de suas
faíscas, o ritmo de suas flamas, a melodia de seus raios.
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Para as
almas insolentes e meigas, como a minha, o aceno gentil e educado, a voz
inédita e implícita de todas as coisas nascem do silêncio. Não é de mim que as
palavras não podem expressar o que desejo tanto, deixam-me um vazio na língua,
a cabeça oca, a boca semi-aberta esperando algum som saindo da garganta, mesmo
que som algum seja revelado, se assim posso dizer. Para que estar calado com
vontade de gritar? Para que gritar, se o melhor é ficar calado? Há coisas que
se gritam e há coisas que gritam a si mesmas, e neste caso último que muvuca
não deixam em todos os cantos e recantos.
***
Mesmo
quase o avesso, sois parte do que minh´alma almeja escolher como nova morada -
oh, meros vínculos de sentimentos!... -, imaginar, a pedido de minha intenção,
o retrato-guardião do riso ingênuo, sorriso infantil. Queria eu uma caverna,
igual à que as vaidades arraigadas sustentaram um mundo de idéias. Queria eu um
bosque por onde devanear por alguns momentos por entre as árvores, vegetação
íngreme.
"Exílio
sem luz, horas de lamentos
Perpassos
sombrios anterior a risos
Por conta
dos sons que eu,
O dia e a
noite colhemos.
Pó de
constelação sobre caracteres audíveis
A
transcenderem o limite do vazio
Que esse
chão sem prévia
Esculpiu."
***
As
molduras na parede marcam o tempo suspenso no caos. Lembranças, recordações de
momentos de circunspecção, mergulho na caverna psíquica, quê despautério, mas
dera origem à pintura. A pintora encontra-se no momento na sacada de sua
residência, assistindo ao evento da Vesperata, esquecida de duas de suas peças
estão suspensas na parede deste botequim. Já tomamos um vinho com deliciosa
carne seca com aipim, falando sobre a caverna psíquica em suas peças, em tom
irônico e sarcástico dizendo: "densas alianças das moléstias."
***
Às vezes,
sinto-me perdido no meio de um sorriso. Não faço sucumbir a palavra ao fosso
onde enterrei a carne.
***
O portão
de entrada, se fechado está por cadeado, a porta de entrada escancarada, após
subir quinze degraus, por chave, indo re-colher-me, e eu tão aberto, peregrino
da solidão, espero a noite e não haver escuridão – que idiotice esta, não há
qualquer noite em que a escuridão não esteja presente, a escuridão é parte da
noite.
***
Eu no
escuro nu do quarto, quando dormir quero sonhar a licitude da alegria e do
júbilo. À procura da lua ou talvez de mim num piscar lento, boiando aos luscos
fuscos do olvidamento de quem insisto em ser.
***
Não
desejo versos no céu. Seria esquisito ler palavras nas alturas, dentro de
formas diversas, escritas a gosto e estilo dos poetas, de rimas ou não, da nova
moda de enfiar idéias e pensamentos na linguagem poética, isto não é poesia,
isto é "descascar bananas" filosóficas. Toda moda passa. Com certeza,
não levantaria mais os olhos à noite, fora de casa, não me seria possível ler
uma palavra sequer. Ademais, sentir-me-ia perdido e confuso com a ausência das
estrelas todas, o céu entupigaitado de palavras, a lua a iluminarem os cantos
inúmeros do mundo, a velarem o ossuário da terra. Seja-me consentido fazer, do
que dizem os poetas, recurso para "cofiar o bigode."
***
Não sigo
à risca o silêncio que faz gritar as não-palavras da perdida sensatez. Não sigo
à risca, para explicar a dosagem conveniente, o desejo do sentimento de
embaraçar os entremeios de uma ilusão, quimera, o mero vínculo de sentimentos.
"Toadas melódicas amainam/Regimentam passagem a ponte de turva areia/Sobre
águas rasas murmurantes/A frente, ramas e tramas entrelaçam-se/E o mar
relevante as tintas contingenciais/Tonalizam e tematizam seu toar
marulhante/Aquarela audível/A linguagem invernal nunca dita..." Medidas
faltam para encontrar os extremos. Tenho procurado por mim, sem ousadia alguma
em tecer quimeras, em ignorar que só saberei do dominó que vesti, noutros
tempos diferentes a este em que me encontro agora, ouvindo o riso do vento
diante de mim, aquele riso escroto, sensaborão, aquele que faz escorrer saliva
no queixo.
***
Gênio,
nem pensar... Feliz demais para sê-lo. Nem é preciso que a História
“capracheie” o registro de mim, capracheado rigoroso, "ninguém pode
negar." Disto não preciso. Não julgo palavras inúteis estas que estou a
falar comigo, enquanto sentado a uma mesa de barzinho, tomando uma cerveja e
uma “branquinha”, no Beco das Caveiras, pensando nas contingências da existência,
olhos perdidos na distância da rua, e todos dizem que insano fiquei, este seria
o destino que os céus escolheram para mim, não houve como me furtar a esta
triste condição, condição de "quando sei o sonho do "eu" e
"tu", quando descubro a existência, a paixão por ela: "o homem é
uma paixão inútil", a "existência é uma paixão sublime", o tempo
se torna bem resumido para o que desejava patentear." Haverá o aceno de
adeus, o que é "existir" se consumará. E para rimar, quem sabe
"à beira-mar." Não julgo inúteis estas palavras nem as que digo nem
as que me inspiraram o espelho e o raio de luz incidindo nele.
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Escuto o
riso da ampulheta, diante do tempo – o vento invade-me a voz que é sonho,
desejo da mente que é imensidão. O espelho procura por mim, buscando aprimorar
sem ousadia a imagem – desço pela janela do que se tornou inevitável, como a
taça que se estiola no chão e eu não quero ajuntar os pedaços. Não posso me
escusar do que fiz de mim, noutros tempos a lucidez que preparava a
consciência.
***
Conjugo
no tempo o verbo no infinito da primeira pessoa. O espelho mostra o contorno de
saudades, o bocejo de ansiedades que fizeram o retrato da noite. Driblo o
tremor que avassala o sono engomado.
***
Qual a
licitude dessas palavras? – não disse antes que eram letras velhas?! Enquanto
não acenar o adeus a este lugar zagaio, todo o resto serão velharias
consumadas. Eu no amor que carrega o vento, na alegria que brinca de
esconde-esconde no céu que mesmo perto fica tão longe... Eu subalterno do meu
eu, às vezes inteligível, na maioria delas hermético, obscuro. Sou também
cobiça que busca inquietação no desajuste entre a metafísica que não angustia,
apesar da dor, no desequilíbrio entre o verbo que dilacera os medos e a
metáfora que liberta as moléstias da psique, e cada sorriso matinal. Metafísica
e Sorriso Matinal! Hajam compêndios para registar o "mero vínculo de
sentimentos" que reside neles! Nada há de mais singelo.
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Qualquer
mero vínculo de sentimentos é pedaço do vazio que o tempo sela na eternidade,
inebriando um ponto vivo diante da imensidão, descobrindo que o eterno é também
do efêmero.
***
Tudo será
intervalo necessário a menos que os relógios interrompam os segundos acocorados
no tempo, ignorado em sonhos, pasmado dos risos incondicionais que nas
esculturas choram o amor eximido de enxergar a felicidade ingênua.
***
É a
montagem da vida no papel que consome o verbo, ficando sempre a incógnita da
intuição que vai completar a presença imponente que faz as voltas do tempo, a
quimera e utopia que vão complementar as náuseas e vazios hodiernos. No outono,
antes de primavera outra, o olhar não intimidava nem retorcia no tempo
conjugado do verbo, preenchendo o vazio das respostas às perguntas que perpassam
o espelhar os projetos superpostos na indagação.
***
Verbalizo
a verdade por traduzir presença. O rumor do silêncio começara a invadir o
limitado ínterim do tiquetaque. Estava ocupando os espaços intercalados entre o
tique e o taque.
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Nasce uma
ópera sem silêncio, preenchendo, dominando, ocupando o espaço que é por direito
do rumor dos desejos e vontades atravancados no peito, da algazarra que
ensurdece as utopias e quimeras sarapalhadas no inconsciente. Não adianta tapar
os ouvidos. São os pingos da tempestade que caem nas telhas.
***
Qual
seria a infelicidade para quem julga compreender estas palavras velhas? Tão
velhas quanto este botequim no Beco das Caveiras. Patrimônio Histórico. Ah...
ah... ah... Não sei. O que velho pode ser infeliz? A velhice é transluzente
felicidade, há sempre outros brilhos que ascendem o que é existir.
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Algumas
pessoas se afogam em rios de águas correntes?
Estou
"pelejando" em chegar à superfície.
#RIO DE
JANEIRO(RJ), 15 DE JUNHO DE 2020, 10:15 a.m.#
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