#LEITE BALSÂMICO DOS ÚBERES DA LUZ# GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: PROSA
Quem sabe possa, inspirando-me na luz incidindo na
tela do computador, vinda de por trás e acima de mim, acendo esta ao invés da
outra que me ilumina a cabeça, fazer surgir à luz todos os segredos, enigmas,
não por estar desejando decifra-los, deixar-lhes para trás, belo sorriso
esboçado no rosto, serpentear a modéstia de orgulhos ingênuos. Surjam do
interior.
Se é que posso descrever o centro, de onde pende a
lâmpada acesa, círculo de amarelo escuro, dizendo que a minha palavra busca
iluminar o reflexo do branco no papel.
Não é estranho que assim o diga, se busco me
justificar de algumas ignorâncias me surgem no íntimo, e nada posso fazer senão
deixá-las inscritas como uma repugnância por serem responsáveis por tantos
segundos sem uma única palavra na mente, vazio, puramente vazio, e, no tempo,
tornar-se-ão sabedorias das mais estúpidas que se possa encontrar nalguma
agenda escondida, dentro de cofres a sete e mais chaves, que não se sabe
quantas.
Sou homem demasiado limpo, então nos últimos tempos
não suporto vestir roupas escuras, sinto um nó de amargar as profundezas do
espírito e da alma, e, portanto, nos últimos tempos visto cores alegres,
amarelo forte, azul, cinza, vermelha... sou indivíduo demasiado limpo para a
mácula das palavras mentira, fantasia, imaginação. Fica a mentira isolada da
verdade.
Quanta repugnância quando me sai da boca a palavra
mentira! E quando alguém teimoso feito uma mula insiste que as palavras definem
o homem, conceituam seus impossíveis, fracassos, melancolias, e não sei mais o
que a dizer, sem cair numa repetição sem limites e fronteiras? Olho-o de
soslaio de imediato e o que me resta na retina é um branco esquisito e
estranho.
Na realidade, isto me diverte muito, de ouvir as
pessoas tagarelem por todos os becos, alamedas, avenidas, ruas o sentido de
viver, da vida, de não sei mais o quê sobre os dramas e faltas incólumes que
habitam ingenuamente o íntimo da alma humana. Só mesmo caindo na gargalhada com
estas palavras, pois dramas e faltas habitarem ingenuamente o intimo da alma
humana é um absurdo, por esta razão, pensando enfatizar bem a idéia que me
perpassa o espírito, e de soslaio, a olho e com ela me identifico bastante, a
ponto e natureza de a perseguir no ritmo da música que toca no computador,
enquanto registro no diário que há algum tempo venho tentando fazer, para
passar o tempo, enquanto o sono me vem convidar aos sonhos diferentes e
iluminados.
Ai! muitas vezes chega a enfastiar-me as letras que
a língua vai tecendo com os seus movimentos, quem sabe gestos, não o sei, sei
que as letras unidas dizem-me de tédio, angústia, náusea, não sei mais o que
poderá fechar com chave de ouro, a verdade, enfim, fora pronunciada, não
esperava que algum dia o fosse, perdera a esperança nalgum recanto ou canto,
não interessa saber.
A mentira, sobre o que garatujo nesse espaço
pequeno de entre linhas, as letras quase exprimidas de todo, até fazendo com
que comece a bordar as letras, encontrar as minhas próprias, as que ninguém
será capaz de imitar, só poderá con-templar, nenhum artista seja capaz de
re-criar mantendo a perspectiva...
Enfastia-me o talento de com elas ir tecendo a rede
em cujas espaços não há saída plausível, se houver é que algum mistério está
sendo vivido agora, e como estou preocupado em registrar o que se me apresenta
de imediato, sem pensar que nada tem sentido em tudo isto, não passam de
palavras inúteis, muito difíceis de serem pensadas, chegando a assumir como
próprias ou dar-lhes as costas.
Por onde andam as lágrimas dos meus olhos, nalgum
tempo vertiam-se tão fáceis com estas letras? Aonde fora o ornamento do meu
coração, antes não sedento de saciar as carícias anteriores a quaisquer outras,
de saciar a fome que poeticamente me habita, se rasgo a folha deste dia, e nada
mais existirá disto que deixo inscrito em letras, agora estou buscando um
estilo barroco de cada uma, como as conheço de alguém íntimo?
Oh silêncio dos que brilham no leite balsâmico dos
úberes da luz! Por que hei de ser luz? E avidez das imagens e sentimentos
revelados em sentidos que fogem à capacidade de entender e compreender o que
mesmo estão a dizer, se o que digo não tem sentido tanto melhor para mim.
É noite. Eleva-se mais intensa a voz das fontes; a
minha alma é uma fonte. A minha luz dirige-se a tudo o que é obscuro. Se por
todos estes anos, vinte e cinco agendas, correspondendo aos anos em que venho
registrando algumas coisas, quem sabe desejando inclinar-me para a sabedoria, e
frequentemente sem medir limites e fronteiras, é porque me recordou a vida,
haver algo desconhecido ao meu derredor, que me olha de soslaio, esboçando
sorrisos muito ensaiados para o meu paladar refinado; de esguelha, quando me
olho ao espelho, a imagem refletida, sou o único responsável por ela, mesmo que
não aceitem, ninguém poderá mudá-la, nem eu mesmo.
Se houvesse alguém quem, com insistência, nada
podendo fazer para me desvencilhar dele, questionando-me: “Quem é você? Se não
quiser gastar seu tempo com futilidades, responda-me com uma palavra apenas.
Dar-me-ei por satisfeito?"
De modo algum não me furtaria ao prazer de lhe
responder, não gastaria meu precioso tempo com banalidades, para não repetir a
palavra tão próxima da outra, o que bate contra o estilo. Teria de passar, quem
sabe, toda a vida procurando entendê-las com a contundência e pujança do desejo
de as ouvir, de caírem bem no peito, suscitando quem sabe esperanças outras que
não as tão já conhecidas da humanidade, dos homens em qualquer buraco deste
mundo sem fronteiras.
Responder-lhe que sou de entre essa gente quem, com
modéstia, raiando a imbecilidade, esquisitice, canta de galo nos galinheiros de
grandes sombras, onde as galinhas refestelam-se na poeira.
Admito que exagerei na tinta que imprime a letra,
não seriam necessárias tais palavras, nada acrescenta ou lega-lhes um sentido
profundo. Contudo, não houve outras que melhor dissessem o que perpassa a alma,
quando me estremeço inteiro, fatigado de mim mesmo. Não houve outras.
Orgulha-me confessar que, apesar de viver ser o
in-verso de exprimir, pudera-me haver dito algo que mereça a atenção de alguém,
estas palavras são poucas para o mistério anterior às horas outras, quem sabe
no crepúsculo, aonde o vento emudece, até à sombra divulgado de minhas
modéstias. Há-de chegar o minuto de as transformar em línguas ingênuas,
voluptuosidades, despertando-me a gratidão do muito apreço que nutro por elas,
sempre zelosas do vento.
Falaria, ao invés de todas as palavras, coisa
alguma, ficaria em silêncio, olhando a luz de por trás de mim que se reflete na
tela co computador. Falaria de sabedoria diurna, alegre e desperta que, se
olvida o que perpassa a alma, o espírito, desdenha de todos os orgulhos
ingênuos que poeticamente deixa-me-ser à luz de por trás.
#riodejaneiro#, 22 de junho de 2019#
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