#UM INTELECTUAL PARA OS NOVOS TEMPOS – IN MEMORIAM# - MANOEL FERREIRA NETO: TEXTO
POST-CRIPTUM:
Toninho Fernandes, meu caríssimo Amigo das Letras e da Vida, muitas
saudades de você.
Antônio Carlos Fernandes, vulgo Toninho Fernandes, falecido aos 12 de
abril de 2010, vítima de enfarto fulminante. Professor de História na Faculdade
de Letras e História, Gerente do INNS, doutorando em História da Igreja,
Escritor, Autor de La Mezza Notte, cujo tema é a História da Vesperata e A
TERRA, O PÃO, A JUSTIÇA SOCIAL - A IMPORTANTE PARTICIPAÇÃO DA IGREJA NAS
POLÍTICAS PÚBLICAS DO BRASIL, em parceria com Wander da Conceição.
Este texto fora discursado por mim no Evento de Lançamento Póstumo do livro
A TERRA, O PÃO, A JUSTIÇA SOCIAL..., aos 11 de setembro de 2010, no Anfiteatro
da Escola de Odontologia de Diamantina
Tristeza e alegria se confundem neste instante em que me proponho a
escrever comentário sobre obra das mais importantes de nossa atualidade. Acabo
de receber das mãos de Sônia Frois Fernandes, viúva de meu amigo e companheiro
da vida e dos caminhos da intelectualidade Antônio Carlos Fernandes, “Toninho
Fernandes”, a sua última obra histórica A TERRA, O PÃO, A JUSTIÇA SOCIAL – A
IMPORTANTE PARTICIPAÇÃO DA IGREJA NAS POLÍTICAS PÚBLICAS DO BRASIL, em parceria
com Anísia de Paulo Figueiredo (org.), Antônio Carlos Fernandes, Wander José da
Conceição, que não teve oportunidade de vê-la publicada, faleceu dia depois de
havê-la concluído. Tristeza por haver “perdido” grande amigo e companheiro,
homem responsável com os sonhos e utopias de História que reflita os conflitos
sociais, culturais, artísticos, individuais, econômicos e políticos, resgate
mesmo da verdade da História, das tensões e interesses ideológicos na sua
“feitura” ao longo dos tempos, homem compromissado com os ideais de povo, cujo
“pão” é a História, Diamantina, Patrimônio Histórico da Humanidade, homem que
dedicou a vida ao engrandecimento e desenvolvimento da História, homem cuja
maior preocupação era a Justiça Social, como professor, mestre em História da
Igreja, doutorando no mesmo, não chegou a concluir, defenderia no final deste
ano de 2010 a sua tese, diretor regional do INSS; como homem, filho, irmão,
marido e pai exemplares, amigo sincero e leal, de quem recebi lições
intelectuais básicas de compromisso e responsabilidade com a cultura, artes.
Difícil é expressar o que penso e sinto com a leitura desta obra, os
sentimentos que me perpassam por sua ausência são demasiados fortes e
presentes, subjetividade e objetividades se amalgamam, mas creio ser o caminho
perfeito para mostrar o que deixou em mim disto que é a responsabilidade com o
homem e justiça social.
Não intenciono ensaio a critério e rigor de seu Ensaio, FIDELIDADE E
IDEAL DA MISSÃO EM NOVOS TEMPOS, cujos objetivos específicos foram a análise
das obras sociais do 1º Arcebispo de Diamantina, Dom Joaquim Silvério de Souza,
quem “vislumbrou um futuro de prosperidade para uma das regiões mais carentes
do Brasil, além de ser um grande intelectual”, membro fundador da Academia
Mineira de Letras e patrono da cadeira nº 75 do Instituto Geográfico Histórico
do qual fez parte” (cf. Introd. de A terra, o pão, a justiça social, pág. 16).
O interesse sine qua non aqui é o “homem e o intelectual” Toninho Fernandes:
sem conhecer o homem, o autor, impossível compreender a obra, objetivo
específico de seu pensamento e idéias em compor o ensaio sobre D. Joaquim
Silvério de Souza.
O primeiro pressuposto da história humana é a existência de indivíduos
vivos, ação e condições materiais de existência. O homem se diferencia da
determinação puramente natural, superando-a, por sua atividade produtiva.
Conforme Karl Marx, os homens começam a se distinguir quando iniciam a produção
dos meios de vida, passo em frente que é conseqüência de sua organização
corporal. Ao produzirem os meios de existência, os homens indiretamente
produzem a sua própria vida material.
O trabalho, a atividade vital, a vida produtiva mesma aparece ao homem
só como meio para satisfazer uma necessidade, a de manutenção física. Mas a
vida produtiva é a do gênero. É a vida engendradora de vida. No tipo de
atividade vital jaz o caráter inteiro de uma spécies, seu caráter genérico, e a
atividade consciente livre é o caráter genérico do homem. Quando, no Capítulo
7, subcapítulo 7.2, A Escola Profissional Irmã Luiza – EPIL, Toninho Fernandes
comenta a instituição da Associação das Senhoras da Caridade, cuja solene
autoridade era do Arcebispo Dom Joaquim, entre aspas, identificando os
objetivos dessa instituição, escreve “para alargar a esfera de sua ação em prol
da pobreza”, à página 36, vislumbramos o intelectual Toninho Fernandes, sua
vida e obra.
Sua produção intelectual, caminhos em prol da História, Justiça Social,
compromissos e responsabilidades, se fundamentam in totum na consciência
histórica, dimensão em nossa modernidade, especialmente em nossa atualidade,
esquecida, perdida ao longo dos tempos, sistema capitalista, ideologias e
interesses di-versos de poder e bens materiais. Sem o conhecimento da História,
a consciência do homem de seus caminhos, direitos vitais de conhecimento, nada
haverá de mudanças e transformações sociais, individuais, políticas, econômicas
e artísticas, não haverá nem história, o homem apenas está no mundo.
Entregando-se por inteiro em busca de transformações sociais, políticas,
ao caráter in-vestigativo dos processos históricos, a mostrar a continuidade
histórica nas manifestações artísticas, culturais, ao conhecimento delas em sua
integridade, indiretamente a produção intelectual volta-se exclusivamente para
o homem mesmo, isto é, o resgate da consciência de produtor de vida, artífice
da dignidade histórica, construtor de responsabilidade e compromisso com o
destino dos homens. A consciência, estabelecida e instituída com a consciência
dos valores humanos e humanitários advém do conhecimento, este se insere nos
processos sociais, políticos, artísticos, gerando lutas, gerando buscas de
novos horizontes, gerando justiça.
A atividade intelectual de Toninho Fernandes se coloca para o seu povo,
para nós, os homens, como objeto para sua determinação consciente. Isto é,
Toninho Fernandes tomou a atividade produtiva como objeto de pro-jeção e
reflexão espiritual – daí, o específico interesse pela História da Igreja,
caminhos da vida eclesial diamantinense -, consciente e ativo, que se liberta
dos estreitos limites da reprodução cega das formas biológicas, intervindo e
transformando o meio, as condições materiais e espirituais da existência.
O grande mérito intelectual de Toninho Fernandes na jornada de
consciência histórica, interagindo história política, social, espiritual,
religiosa, é precisamente o fato de ter vislumbrado a legalidade essencial do
processo autoconstitutivo de seu povo, dos homens, da humanidade, através da
consciência, que gera a busca de justiça social. Este grande mérito
experienciado, não apenas em elucubrações teóricas, solipsismos, mas através de
lutas e trabalho verdadeiros, consiste em que o povo compreenda a autocriação do
homem como processo historiológico, onto-histórico, historicidade e
historialidade, a objetivação como perda do objeto, alienação e superação dessa
alienação; nós, os homens, compreendamos a essência do trabalho e concebamos o
homem objetivo – verdadeiro, pois é o homem real – como o resultado de nosso
próprio trabalho.
Ainda no que tange ao mérito intelectual é o comportamento real e ativo
de homem para consigo mesmo como ser genérico, ou manifestação como ser
genérico real (isto é, como ser humano), somente possível porque efetivamente
exterioriza todas as forças genéricas – o que só é possível através da ação
cooperativa de toda a humanidade, somente como resultado da história. Toninho
Fernandes tomou a própria atividade intelectual como objeto de construção de
uma consciência histórica e espiritual, como bem explicitou Lukács num capitulo
de Ontologia do Ser Social, a prévia ideação do objeto da ação e a escolha
adequada de meios. A efetivação do trabalho requer a apropriação consciente da
realidade, tanto da natureza externa quanto da própria natureza dos indivíduos humanos;
além disso, sempre impulsiona à crítica prática, que pode modificar todo o
processo por inter-médio de novas aquisições a respeito da realidade objetiva
ad-vindas da própria realização do trabalho.
Nestas páginas, deixou Toninho Fernandes registrado o seu pensamento,
idéias de intelectual para os novos tempos, em tempos de “mudança de época,
mais que em época de mudanças”, em tempos em que a intelectualidade não é
objeto de ad-mirações, de orgulhos e lisonjas individuais – ele que jamais fora
intelectual de plantão -, mas de compromisso e responsabilidade com os destinos
históricos e espirituais dos homens.
Uma carreira tão exemplar, tão profunda, tão consciente de seus
objetivos, ser tão precocemente interrompida, é de derramar lágrimas pujantes,
como dissera nosso amigo em comum, Juscelino Brasiliano Roque, em nosso
encontro no velório de Toninho Fernandes, “a história diamantinense pára com a
morte deste grande intelectual, deste homem exemplar em todos os níveis; nós
que convivemos com ele, que estivemos com ele em sua caminhada, sabemos disso”,
o que lhe respondi eu, “nem daqui a quinhentos anos haverá outro Toninho
Fernandes em Diamantina, talvez jamais haja outro”. Mas as obras que deixou, a
luta por toda a vida em prol da verdade histórica, da justiça social,
continuarão vivas por todos os séculos e milênios, até a consumação dos tempos.
Manoel Ferreira Neto
(11 DE SETEMBRO DE 2010)
(#RIODEJANEIRO#, 11 DE SETEMBRO DE 2018)
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