#ALDEIA DE LÁGRIMA DOS INSANOS# - III TOMO #UTOPIA DO ASNO NO SERTÃO MINEIRO#- GRAÇA FONTIS: PINTURA/Manoel Ferreira Neto: ROMANCE
CAPÍTULO VI - PARTE I
Senti dó de Fomá Fomitch. A curiosidade sempre prejudicou as pessoas.
Encontrara próximo à porteira pedaço grande de cigarro de palha. Colocou no
bolso da blusa, olhando de lado e outro se alguém não havia por perto, visse-o
apanhando.
Saíra assobiando música qualquer, atitude muito própria de quem está
fazendo alguma coisa errada, medo de ser repreendido, surrado. Distanciou-se.
Veio sentar-se debaixo de pé de pequi, próximo de onde estava eu pastando,
calangos correndo daqui para ali, nas pedras, com a cabeça levantada, naquela
empáfia só digna dos grandes homens da humanidade.
Dera tragos muito fortes. Passando a mão nos olhos devido à fumaça,
tossindo. Sentira o efeito de imediato. Ficou tonto. Levantara e sentara de
novo. Foi a maior dificuldade conservar-se em pé, indo para casa. Há uma bica
dágua feita por Ratto Neves, vinda do Rio das Pulgas, onde a mulher todas as
manhãs colhe quatro, cinco baldes grandes para servir-se com ela o dia inteiro.
Agachou-se, colocando a cabeça debaixo da bica. Pode não ser isto
compreensível, mas, em verdade, dormira longo sono com a água caindo sobre a
cabeça. Digo isto porque as pernas podem sentir cãibra. Se a sentiram, não pôde
perceber. Acordara. Sentira-se melhor.
Dirigira-se para o quarto, deitando, dormindo o resto da tarde e a noite
inteira. No outro dia, levantou com gosto horrível na boca, completamente
perdido, confuso. Não era de cigarro de palha. Seu irmão convidara alguns
amigos para uma tarde na fazenda, e eles aproveitaram para dar uns “tapas” num
baseado, feito da Canabis Sativa – se assim é que se fala, ouvi muito sobre
isto nalguns bairros de Atenas Atéia, bairro de traficante, favelas. Por vezes,
passando olhava aquelas pessoas, pensando comigo por mais sem caráter, violentos,
desumanos, a reles, ainda assim seriam as relações com eles mais humanas do que
com os nobres e esplendorosos. Têm sentimentos e emoções, mas desconhecidos
devido aos sofrimentos. Nunca vi foi a palavra escrita. Alguém talvez tenha
posto no bolso da calça, fumaria o resto, andando pelas ruas da cidade, antes
de ir dormir.
Por vários dias, ficara com aquelas sensações estranhas e esquisitas.
Não poderia perguntar a alguém sobre isto. Se o pai soubesse que apanhou pedaço
de cigarro no chão, fumado com a idade de nove anos com certeza seria
repreendido. Ademais, sendo o pai fumante, tendo algum dia começado e sentido o
efeito, não iria acreditar nos efeitos que ele sentira. Havia qualquer coisa de
estranha acontecendo. A coisa seria descoberta e Guido seria o responsável,
estava envolvido com drogas, um advogado... O que os lacrimenses não iriam
dizer disso? Não mais conseguiria um cliente sequer.
Na época da faculdade, escrevera artigo no jornalzinho do diretório
acadêmico, fazendo apologia à Canabis Sativa:
“Se a maconha desaparecesse de todos os jardins e plantações, da
produção humana, creio que faria na espiritualidade e intuição um vazio, falta,
falha, enfim, um vazio, ausência no intelecto da humanidade, uma imperfeição
muito mais indescritível que todos os excessos e erros pelos quais nós, os
homens do final do Segundo Milênio, somos os responsáveis e culpados...”.
Manoel Ferreira Neto
(OUTUBRO DE 2005)
(#RIODEJANEIRO#, 12 DE SETEMBRO DE 2018)
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