AO À TOA DAS PALAVRAS GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: AFORISMO ****


AO À TOA DAS PALAVRAS
GRAÇA FONTIS: PINTURA
Manoel Ferreira Neto: AFORISMO
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A resposta é o riso, então. Resposta a que definiria sábia; no cerne do riso há sabedorias inestimáveis, dependendo de as intuir, perceber.
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O que dissera merecera o riso como resposta? Nada dissera; considerando ter dito, fora independente da vontade, não houvera qualquer intenção. Pronunciara palavras sem quaisquer sentidos, foram frias. Sabe o que significa dizer nada, dizendo? Palavras à toa, isto é o que significa. Rir-me da resposta haver sido o riso fosse o mais sábio. De que me riria? Da resposta ou de haver pronunciado palavras à toa? De haver sido à toa a pronúncia. Não do riso, porque não saberia dizer o que revela ou o que esconde, mesmo a sua intenção, o íntimo de alguém é terra de ninguém. Ter-se-ia sido inteligente o silêncio - até pensei nele no ínterim da primeira e segunda palavra, mas a língua não respeitou o pensamento, tinha de haver o desfecho.
Não tem graça alguma responder com riso o nada de palavras. Rir do nada deixa o nada insatisfeito. Ficar sério diante do riso não é selar a resposta, perfeitamente consentido. A aceitação fica em suspenso - aceito o riso como resposta; isto é inconcebível. Consentir não é diplomacia de que me sirvo para fechar uma situação, nada mais tendo a considerar. Aceito ou não aceito. Não digo que aceitei, não digo que não aceitei, estou apenas pensando o riso como resposta.
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As palavras à toa pronunciadas foram de indiferença, nada havia a ser cogitado sobre o assunto a ser tratado, e mesmo que houvesse não havia qualquer interesse de assuntar. Não houve interesse de não assuntar, tão somente de nada haver a ser cogitado. Se penso para falar e falo para continuar pensando, não teria pronunciado palavras à toa diante do que fora dito, haveria alguns segundos de cogitação, e não, não houve isto, as palavras saíram na "lata", vapt-vupt.
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Imagino que o rido fora da indiferença pelo assunto, e isto fora expresso com palavras à toa, não era de minha alçada. Nem sei dizer a razão da reação de soltar palavras à toa: o meu costume nestas instâncias é abaixar a cabeça. Compreendo e entendo a reação, não poderia ser outra - quem aprecia sentir-se mal na fita?
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Se permanecesse de boca fechada, riso algum haveria sido. Quem sabe houvesse um olhar enviesado, aquele de "Nossa!... Nem responde por educação que seja!" Não saberia afirmar. Sei que dissera palavras à toa, assuntar não era de meu interesse, a resposta ao à toa das palavras fora o riso.
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Falemos a sério, como se tem costume dizer, dito que está no máximo. Por que tenho de matracar a língua a todo instante, não lhe dar mínima trégua, que seja para salivá-la? Na minha terra-mãe, na minha cultura, não existe isto de ser obrigado a falar, podendo estar no meio de várias pessoas que trocam dedos de prosa, os lábios eminentemente cerrados. Falo, se quiser; não falo, se não quiser. Ninguém jamais me cobrou a tagarelice. O silêncio é meu, por ele sou o único responsável.
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Estranho isto a exigência de falar, se me encontro acompanhado de alguém ou de "alguéns", gastar palavras à revelia, mesmo que nada comuniquem, nada haja a ser aproveitado, queimar sentidos e significados, justificativas e explicações, como se queima neurônios no ato de pensar algo complexo. Difícil isto, não? Difícil de entender quem escolhe ficar de boca fechada. Seria que houvesse necessidade de entendimento? Não creio. É só desconhecer o silenciado, ele não existe, não está onde todos estão. É o que faço no silêncio: ninguém existe ao meu lado, nada sei do que está sendo tratado, podendo afirmar que só o corpo habita o lugar, retiro a alma e o espírito dele, voam por lugares bem distantes, onde se sentem à vontade.
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Eis o que tinha a cogitar no meu silêncio sobre o riso a mim dado como resposta ao à toa das palavras pronunciadas. Não se pode considerar prolongamento da conversa, havia algo a ser dito sobre o riso. Isso não!
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Atenciosamente, com toda a data vênia. O silêncio é o maior tesouro no ato de existir.
Rio de Janeiro(RJ), 23 de maio de 2021, 15:10 p.m.

 

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