INCONSCIENTE DE MÉRITOS INFINITOS Manoel
O meu
inconsciente é mais observador, perspicaz, arguto, características essenciais
de seu conhecimento, que o meu consciente – cuido ser devido ao fato inconteste
de não dar muita atenção ao que consciente há em mim, pouco me interessa,
apesar de que não figure escarafunchando o inconsciente à cata do incognoscível;
no consciente não há qualquer segurança das coisas nele existentes serem quem
sou, é o meu “eu”, é o meu “ser”, talvez no inconsciente haja esta segurança,
no incognoscível dele, mas prefiro eu quem não sou, ser consciente de não ser
eu, corromper os desejos e vontades de todos os homens que desejam suas
identidades, autenticidades, originalidades, baterem no peito com empáfia e
orgulho, dizendo serem quem são, não terem quaisquer dúvidas da felicidade,
alegria, contentamento do que isto significa, não mais precisam re-fletir e
medita sobre as atitudes de não, enganos, erros, desconfianças, o mais
importante que tudo isto, no paraíso celestial receberão as dádivas de seus
méritos infinitos no mundo, “enchafurdaram-se” no “eu” absoluto e sublime,
atingiram o ser. O que farei desta
façanha toda? Creio que sentirei haver terminado a minha vida, nem vivo, nem
morto vou arrastar-me pelo mundo a fora. Continuo inconsciente de quem sou, mas
se me aprouver posso empreender viagem, desejando encontrar-me, sonhando com o
homem que tenho em mente ser quem sou.
Se
falo a primeira vez com alguém, continuando a dizer ser o meu inconsciente mais
observador, não saberei depois (ou desenhar na mente as imagens dele, o que dá
no mesmo) lembrar o formato de seu nariz, se adunco, se aquilino, se há uma boa
na ponta que toma a metade da cara, a disposição de suas sobrancelhas, se os
olhos são esbugalhados, se lá no fundo das órbitas, se brilham, se são
apagados, se há alguma sombra de tristeza em conseqüência dos despautérios da
vida, o jeito da boca, se pequena de lábios grossos, se grande de lábios finos,
nem mesmo se tinha bigode fino ou à Nietzsche, se tinha costeletas grandes, se
era barbudo de todo, barba espessa. Difícil num primeiro encontro assimilar
tudo isso conscientemente. Basta encontrar de novo a pessoa e logo a reconheço
– embora não lhe recorde a graça... A graça, às vezes, é in totum diferente das
características do rosto, a graça é linda, interessante, soa bem aos ouvidos, a
cara uma desgraça, disparate, levando-me a ter consciência de a natureza ser
caprichosa. É Carlos Alberto com cara de Joaquim Moita, é Sérvulo Nascimento
com cara de Josefino Pontes, é Manoel Augusto com cara de Zeferino Mata; nunca
se encontra graça e cara em perfeita harmonia, uma se perdendo na outra,
vice-versa, encontrando-se no “eu” dos méritos infinitos.
Bem!
isso de não guardar as graça dos homens, guardo-lhes os risos silenciosos que
me provocam, não sei se acontecem a todos, comigo é a todo momento... Para
alguns, é a graça que importa, para outros a importância está na cara sem graça
ou com todas elas á superfície das pupilas e retinas, para outros o que pensam
e sentem, o que dizem e omitem, o que escondem e revelam com as palavras em
riste, o que sonham e pretendem alcançar na vida, cara, graça nada significam,
o ser que se encontra aneles é que se re-velará aos olhos deles, com este ser
re-velado de modo autentico e verdadeiro é que se fará possível reconhecer-lhes
a graça e a cara.
Há
casos em que uma característica serve para nomear a pessoa com perfeição.
Conheci uma pessoa, Deus o tenha em Seu perfeito amparo, vivia sorrindo,
via-se-lhe os dentes desde as seis horas da manhã, quando abria a porta de seu
botequim para servir café as pessoas que iam para o trabalho, até às onze da
noite, quando o último cachaceiro saía trocando as pernas, caindo aqui,
levantando ali. E sorria sozinho, sentado no banquinho ao balcão, olhando de
soslaio para os transeuntes. Diziam até que o sorriso que lhe habitava a cara
só sairia dela, quando o caixão dele já estivesse todo coberto de terra,
amigos, conhecidos, íntimos haverem saído do cemitério. Chamava-se Roberto, mas
alguns o chamavam de Bertinho, Berto, Roberto, Beto, de qualquer maneira
colocaram-lhe o sorriso na graça: Bertinho Sorriso, Berto Sorriso, Roberto
Sorriso, Beto Sorriso. O sobrenome mesmo ninguém sabe, também não é de
interesse de ninguém. Outro: de dez em dez passos dava uma puxada na perna
esquerda de sua calça; devido a este sestro, colocaram-lhe a puxada da perna
esquerda da calça na graça, ficando conhecido como Haroldo Puxa as Calças.
Ainda outro: o circo apresentava seus artistas, animais num desfile pela
cidade. Alfredo enfiou o braço na grade do urso, este comeu-lhe o braço.
Colocaram-lhe o urso na graça, ficou conhecido com “Fredo urso”.
Só
posso dar testemunho de mim próprio. Há quando a minha cara mostra que sou
diretor de um jornal de crônicas as mais ácidas, por ser um homem que perdeu
todas as esperanças de um mundo que merece consideração dos homens, homens que
merecem aplausos por seus valores e virtudes. Por vezes, a minha cara mostra
que sou um indivíduo cujo maior esperança é haver no mundo a paz, no coração
dos homens amor e solidariedade, a vida sejam conquistas e realizações,
sofrimentos e dores sejam sementes de outros horizontes e uni-versos, a morte
seja a concretização de meus ideais e utopias.
Sei
que a cara e a minha graça – mesmo que me entregue inteiro às anedotas mais
picantes, às mentiras deslavadas, cujo fim único seria arrancar risos e
gargalhadas, fazer as pessoas sentirem a graça delas – nunca serão única coisa,
jamais se unirão. E por quê? Qual a explicação real que elucidará isto,
mostrando a verdade minha inconteste? Deram-me uma graça de profunda
espiritualidade, de abismáticos princípios eternos, que os homens e a
humanidade in totum esperam sejam concretizados, seja eu no espírito deles,
oriente-lhes por sempre nos caminhos da Terra Prometida.
Desculpe-me
o leitor por toda a digressão, enveredando-me até pelo nome, que é bíblico, não
chegando a um termo, deixo para mais tarde, quando souber colocar em palavras
claras e nítidas o que faço para realizar esta missão que está re-presentada na
minha graça, os homens possam mirar nelas e espiritualizarem-se, mas o assunto
desta crônica era sobre o esquecimento. Na verdade nunca ame esqueço de nenhuma
graça nem de nenhuma cara. O que acontece mesmo é não saber eu distribuir os
nomes pelas caras.
Há
espíritos simplistas que acham que deve haver uma explicação para tudo. E que,
explicada a coisa, foi-se o mistério! Principalmente esses que insistem em
esclarecer o inconsciente, consciente, o primeiro o não-saber, o segundo o
saber, mas quando se trata de mostrar os mistérios que no inconsciente há aí a
coisa se complica. Eis aí o resultado: vejo-me num beco sem saída com isto do
inconsciente consciente. Infelizmente, terei de interromper por aqui, sabendo
que o leitor vai rir de mim a bandeiras soltas: quis brincar com coisa séria e
difícil cai no ridículo por minha inteligência não conseguir abarcar a coisa,
ter habilidade com as palavras não significa que os objetivos serão alcançados,
atingidos, quando muito pode despertar ad-miração no leitor, e é só.
Comentários
Postar um comentário