ALIAMBAS DE VENENOS E CÂNTICOS SOLENES - Manoel Ferreira
Quando me disseram de suas idéias esdrúxulas e
pensamentos de viés a meu respeito, estive por dizer a quem mos comunicava que
mandara eu lhe sugerir encontrasse de imediato uma porta de igreja aberta,
entrasse até no fundo, e lá encontraria o de que carecia desde tempos
imemoriais, estaria lá no fundo da igreja os ossos em estado já avançado de
transformação em cinzas, o que lhe saciaria as suas fomes seculares e
milenares.
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Não o fiz, contudo, por saber que tais
palavras lhe seriam difíceis de compreensão e entendimento, a sua inteligência
não iria poder abarcar o sentido profundo existente nelas, que, aliás,
definiam-lhe com toda a empáfia e nonsense, se assim poderia me expressar de
modo que indicasse desde já o que estão nelas inscrito de tão medíocre e
mesquinho, o que esta imagem suscita de imbecil e idiota que um homem se
manifesta, um homem vive nas entranhas de sua alma e espírito.
Dissera a quem me informava que estava
o seu amigo muitíssimo equivocado, acreditava sim ser mais fácil e inteligível
para ele as idéias esdrúxulas e pensamentos de viés, mais fácil por assim
justificar o de que tanto carece, e estava muito alegre e saltitante por assim
o ser, realmente não é fácil para ninguém se reconhecer diante do espelho,
sendo mais fácil a transferência. Olhou-me de soslaio e viés: além do que já
compreendia por si mesmo – caso contrário, não é ócio de meus ofícios -, o que
mais estaria sido dito com aquelas palavras, aliás, destituídas de quaisquer
sentidos por o ponto de vista dele não me diz qualquer respeito.
Quem sabe estivesse eu a dizer que a
alguém destituído do que é fundamental para a vivência e experiência do mundo e
das coisas, estas que entram pela carne e vão se instalar nos ossos, e não
havendo quaisquer outras alternativas de se desvencilhar delas. Não estaria
dizendo a respeito não só de seu amigo, mas dele mesmo que ousa comunicar-me o que
me é – o cacófato é inevitável, mesmo porque dá a ponto e natureza o que
significo bem -, comunicar-me o que é óbvio só pode ser uma arbitrariedade sem
limites, se lá eu não tinha a mínima inteligência para entender tratar-se de
uma conversa sem qualquer tempero, o que...
Não apreendera ainda a se calar diante
de mim, com esta comunicação das idéias esdrúxulas e pensamentos de viés que o
seu amigo nutre mui profundamente, os íntimos sentimentos de repulsa e náusea
que lhe habitam as entranhas da alma, não teria de modo algum recebido uma
resposta direta, não era o amigo um esdrúxulo de idéias e de pensamentos
enviesados, e sim ele que me comunicara, informara de sentimentos e emoções
alimentados por mim, da nata do leite ao ácido crítico.
E, com certeza, estaria eu no íntimo
caindo na gargalhada, e não suportando interromper vou perdendo o controle até
me deitar no chão e abanar as pernas e os braços, da resposta direta que
recebera. Não se deve fazer certos comentários comigo que a resposta é de viés,
e a única carapuça só pode estar servindo em com quem estou a falar, com quem
dialogo.
A sua vontade é de pedir licença,
inventar que tem um compromisso a que não pode estar ausente, é de extrema
responsabilidade, em outra ocasião conversariam outros assuntos, e saindo não
de mansinho para não entregar nas mãos de alguém quem me está observando a
conversar e sabendo que algo estava acontecendo de esquisito e estranho. Um
está pálido e quase que não respirando por haver aberto a boca com alguém
indevido, indevido por causa das respostas, destas que se estivesse lendo iria
com certeza ficar sempre observando a página, à procura de algo a dizer, mas
sem ser possível ao menos cogitar uma justificativa viável e o veneno fosse
letal, e há algum veneno que não seja letal?
O outro permanecia tranqüilo, calmo, o
que precisava dizer quanto a quem saía pelas ruas a dizer coisas sobre mim
completamente descabidas. Haveria algum cabimento em dizer que as insatisfações
com ele só tinham um sentido de grande inteligência e perspicácia, enfim alguém
quem tem uma habilidade sem limites de penetrar na alma humana? Não é nada
difícil entender por a sua linguagem ao conversar com as pessoas é
completamente desprovida de empolações de todas as qualidades e gostos, e que
todos se sentem muito agradáveis em companhia dele; ao contrário de mim que só
tenho empolações e, em verdade, não tem consciência ou finge não a ter para
sustentar esta ou aquela viga dos escombros psíquicos e emocionais.
Bem, caríssimo amigo, está aqui
existindo alguma empolação de minha parte, quando estou a dizer-lhe sobre o que
acontecera numa situação em que estivera envolvido os pontos de vista de alguém
a meu respeito? Não está.
De repente, alguém intui algo de muito
profundo numa simples fala, o que a opinião de tão insigne indivíduo e cidadão
vem a contribuir com um crescimento em minha vida, e passa a se sentir
desconcertado a nível de um ressentimento muito profundo, algo que dissera não
sendo o lugar e com quem, ademais em se tratando de mim que numa linguagem
assim como estamos a conversar é capaz de um pontapé daqueles.
Em verdade, dissera algo assim mais profundo e
num tom mais ameno no meio do que havia dito, a única coisa que me poderia
causar uma inveja muito grande seria do asno, e ele não saberia dizer o por
que, era como um enigma a ser decifrado, e conforme a resposta leva o oponente
a ajoelhar sem qualquer possibilidade de se furtar a fazê-lo. Não soubera
responder e eu lhe respondi por o asno saber mui bién dar um coice e eu ainda
nem aprendi as primeiras lições.
Aí sim é que ele começou a ficar
muitíssimo pálido com a responde de o ponto de vista de seu amigo não me dizer
qualquer respeito, estava nas tintas para ele. Só poderia haver sido esta
resposta: não havia outra, jamais senti inveja de qualquer coisa em minha vida,
a minha inteligência é capaz de criar, recriar, buscar o encontro e o
desencontro de todas as idéias e pensamentos, de todas as intuições e
percepções, de todo a luta corpo a corpo com o mundo e as coisas. Só poderia
ser algo absurdo para responder: pensei e senti que não sabia dar um coice bem
dado, a única inveja que teria seria do asno, evidentemente.
Não estava ironizando, longe de mim tal
atitude, estava unicamente dizendo a única coisa que justificava a inveja
minha, outra não poderia ser o coice. O coice fora dado nele que começou a se
empalidecer, desejar pedir licença, inventando uma desculpa deslavada e
esfarrapada de um compromisso, noutra ocasião conversaríamos, colocaríamos o
diário em dia, e não saindo todo de cabeça erguida, um leve sorriso no rosto
para não despertar as atenções dos outros que porventura estivesse passando ou
à porta de casas comerciais e residenciais, os famosos quem ficam debruçadas à
janela de casa e dão notícias de tudo o que ocorre.
Quem estava conosco até o momento em
silêncio, só ouvindo o que estávamos a conversar de imediato disse que havia
coisas ali muito íntimas que não valiam a pena ser tocadas. Não teria ele a
pachorra de as tocar por saber que o coice agora não iria deixar só pálido,
iria mesmo fazer prostrar-se ao chão e sair se arrastando pelas pedras, e isso
não lhe seria nada agradável.
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