SONIA GONÇALVES ESCRITORA POETISA E CRÍTICA LITERÁRIA COMENTA O ENSAIO SATÍRICO #INTRODUÇÃO AO ESTILO ÁSNICO#
Boa tarde,
Manu... Não vou comentar sobre o asno de Zaratustra, porque de verdade conheço
nada sobre, seria encher linguiça.Vou me restringir apenas a dizer do belíssimo
texto cheio de ideias e muita filosofia como lhe é bem peculiar inclusive.
Quero agradecer por me anotar na postagem, realmente bela, contudo para
comentar essa obra eu teria que ler e relê-la pelo menos umas cinco vezes.
Grata querido. Bjos na alma, bjo para a talentosa Graça Fontis sempre. Parabéns
Manoel Ferreira Neto...Bjos.
Sonia Gonçalves
Incitatus, o
jegue de meu romance heptológico, sete volumes, UTOPIA DO ASNO NO SERTÃO
MINEIRO, está de volta após alguns anos. Convidei Benzinha para escrevermos
juntos as aventuras do jegue nas terras cariocas.
Beijos
nossos!
Manoel
Ferreira Neto.
INTRODUÇÃO
AO ESTILO ÁSNICO**
GRAÇA
FONTIS: PINTURA
Manoel
Ferreira Neto: ENSAIO SATÍRICO
Dedico este
ENSAIO SATÍRICO às críticas literárias Graça Fontis, Ana Júlia Machado, Sonia
Gonçalves, com apreço e gratidão. (Manoel Ferreira Neto)
“O seu
conhecimento ainda não aprendeu a sorrir e a não ter inveja: a onda da sua
paixão ainda não se acalmou na beleza”(Nietzsche)
Assim
relinchava Incitatus...
Triste, não?
Pode ser que haja alguém quem não o julgue assim, sendo complacente e
misericordioso comigo; não adiantaria ninguém interferir, interceder a favor
por estar mais do que convencido e persuadido de que é triste, mui triste.
Triste é haver começado, iniciado a refletir sobre novas experiências com
“assim relinchava Incitatus” – quem iria acreditar, se alguém pudesse perceber,
intuir as reflexões, pensamentos, idéias? – e não poder realizar-lhes a
contento, de modo que a obra desejada fora feita, está aí, tornou-se objeto de
uso. Não poderia fazê-lo com falar ou dizer, falta-me a língua, a expressão
verbal, só me é dado relinchar os pensamentos. Isto é o que chamo de tristeza
eterna, imortal. Embora condenado à miséria eterna, a falta de língua, arranco
deste silêncio o que trago em mim. O silêncio se torna fluxo de instintos
comungados às razões todas. O silêncio é o tempo da palavra verdadeira, aquela
que retumba no íntimo e nos instintos e tudo o mais é desejo e vontade de mais
vida ainda.
Assim, como
o viajante sabe que algo vela nele, conta as horas, e o acordará, nós também
sabemos que o instante decisivo nos encontra despertos, que alguma coisa
saltará e surpreenderá o espírito em flagrante delito, ou seja, em via de
fraquejar, recuar, de se render, se endurecer, de agravar, ou de sucumbir a
outra doença qualquer que em dias saudáveis tem contra si o orgulho (pois
continua verdadeiro o velho ditado: o espírito orgulhoso, o pavão e o asno são
os três animais mais orgulhosos da terra).
Por que o
espírito orgulhoso não pode ser animal? É sob a sua efígie, dele, que se trata
dos interesses de por baixo das incompetências, inutilidades, incapacidades,
sentimentos de inferioridade e perseguição. É sob a sua efígie que as nações se
armam contra os autoritarismos de alguns.
Com o
fantástico desenvolvimento do intelecto e da penetração espiritual cresce a
distância e, certamente, o espaço que me circunda. Meu mundo tornou-se mais
profundo, avistam-se continuamente estrelas novas, imagens novas e novos
enigmas. Um dia os conceitos mais solenes, aqueles que provocaram maiores lutas
e maiores sofrimentos, os conceitos do instinto, Deus e do pecado, não
signifiquem, para nós, as criaturas de Deus, mais do que um brinquedo e um
esporte de criança significam para um velho.
Uma dor
muito grande ter o que dizer e não poder fazê-lo em nível de palavras, e
ninguém poder saber o que penso, não há contacto entre os homens e os equus
asinus.
Houve um
asno que nascera imortal, eterno – a imortalidade e eternidade se fundamentam
na tristeza de ser intelectual e não revelar a sabedoria, o idioma faltou-lhe.
Feliz e saltitante, estou por ser o primeiro da humanidade, espero que outros
nasçam nos séculos e milênios vindouros. A vida ser-lhes-á menos difícil, não
irão ter de conviver com as insatisfações, frustrações e fracassos da raça,
pois fora eu quem lhes proporcionara nova vida, oportunidades. Muitos
questionamentos que poderia ter eu durante a caminhada, os fretes, respondi,
embora necessitando de serem desenvolvidos ao longo da vida deles, pois não
tenho a mínima capacidade de dizer a verdade absoluta, e se tivesse sentiria
enfastiado com a coisa, não posso investigar, contemplar por estar no fim a
minha jornada no mundo.
Assim
relinchava Incitatus...
Mas não tem
revolta não, há as milhares e esplendorosas compensações – uma delas por
exemplo é que asno e homem algum vão entrar em contacto com as idéias e
pensamentos, adulterando-lhes em benefício próprio, fazendo certas cositas
serem esquecidas ao longo da história da raça, e só no futuro bem distante
alguém iria despertar para o fato de que seria necessário resgatar as idéias
por mim professadas, foram adulteradas pelos interesses e ideologias de muitos
séculos. Humano jamais poderia mergulhar tanto nelas, são idéias para todos e
para ninguém, não haveria modo de adulterá-las.
Quimeras,
quimeras, quimeras... Nada pode ser deixado desde que revele quem sou a partir
da expressão verbal, claro, na teia de contradições e contra-sensos. Tudo é
simplesmente inútil. Sem as palavras, até mesmo a engenhosidade e perspicácia
do instinto por elaborá-las, como este instinto funciona, como é o caminho que
sigo para ir elaborando as idéias, nada é possível. Desgasto-me por nada. Tenho
disto consciência, é dizer o que me perpassa os instintos.
Antes mesmo
de haver nascido, estava escrito nas estrelas que a tristeza eterna, imortal
que me acompanharia por toda a existência neste bendito mundo – bendito por
haver sido escolhido por Deus, seria o habitat de suas criaturas; quanto ao
resto, tenho algumas dúvidas, sendo necessário in-vestigar com apreço e carinho
- seria devido a tornar-me intelectual, reflexões que ninguém na humanidade
havia se atinado com elas, os filósofos e cientistas sabiam que havia coisas
que só o tempo iria mostrar e revelar com transparência, no tempo de cada um
deles não era possível saber. Só ninguém esperava que o vazio seria preenchido
por asno intelectual, o grande Incitatus.
Há-de se
relinchar, nestes termos, que acabo de atingir o topo do Olimpo, olhando a cidade
e os homens de cima. Embófia, poder, orgulho, convencimento... Pode-se
acreditar que omito alguns outros substantivos com intenção efetiva de não
iniciar a ver-me um deus, deus dos asnos. Não sou eu que julgo, pois não? Não
seria possível olhar de cima ou de baixo por habitar numa região plana, ninguém
me levaria de elevador para conhecer o estábulo de cobertura reservado para
mim, a grande experiência de olhar os homens de cima.
O instinto
de conservação é que ensina os homens a serem volúveis, ligeiros e falsos. O
meu instinto de entrega, doação me ensinou a ser ousado, cínico e insolente, e
por isto tornei-me autêntico, verdadeiro com o que sou. Ninguém pode duvidar
que quem tem necessidade do culto da superfície não tenha feito alguma vez uma
incursão para debaixo dela.
Sinto
necessidade de olhares que se dirigem a mim. Quisera dar e repartir até que os
sábios voltassem a gozar da estultícia e os pobres da riqueza.
Há quando
fico imaginando tudo isso que vivi pelas estradas, coxias e pastos, dentro de
mim, o acúmulo de todas as situações e circunstâncias; que seria de mim, se não
me houvesse sido dados a inteligência, o dom da intelectualidade?; creio que
instintivamente em resposta ao acúmulo viveria dando coices até na sombra,
desde que os nossos reflexos não fossem imagens de nós, algo como se relincho,
a sombra coaxa a plenos pulmões. Difícil seria olhar a sombra e vê-la coaxando,
não apenas ouvindo, enquanto relincho. Por mais diferentes sejam as
características da natureza humana, se é que assim possa expressar-me com
categoria, nisto somos iguais: nenhum de nós aceitaria este paradoxo dos
infernos: enquanto o homem próprio ri a bandeiras soltas, a sombra chora,
esgoela-se de tanta angústia e desespero de estar só, separada do homem, e não
podendo atinar com tão difícil problema.
O que pensei
neste tempo em que tudo isso me perpassava os instintos? Nada pensei – tanto
que fiquei tentando, digamos, em silêncio, tecer a meada de assunto e outro,
não tenho consciência de assim poder relinchar – Foram imagens que se me
revelaram aos instintos e tive dificuldades de as colher e contemplar. Imagens
perpassaram-me as entranhas, não sei o que podem ter colhido e recolhido dos
instintos inúmeros que me habitam. Tornaram-se idéias e o que necessitava fazer
está sendo feito nestes relinchos, a bem da verdade, hein, são poucos para que
possam ser compreendidos em tudo que tenho vontade e desejo de revelar, e não
posso. Não apresento mais a digníssima justificativa.
Imagino este
colóquio com a sombra:
- Ah,
coitada de mim!... Mereço lágrimas de toda a humanidade, lágrimas ardentes e
conscientes do que é isto a minha sombra que sou eu. Rio de você, caríssima
sombra, porque você está aí no chão, refletida pela luz em cima do meu corpo,
estou aqui, sentado no trono, sem luz alguma a refletir-me neste espaço, eu, um
ser só e solitário, longe de tudo e de todos, representando a dor de toda a
humanidade, como o deus grego, Zeus, o mais poderoso, quem usa das sombras dos
deuses menores para satisfazer os sonhos supérfluos, fétidos. Aeiou....
Aeiou... Aeiou... Féretros, fétidos. Preciso de carinho, amor, felicidade...
- Oh,
pedaços de mim, por que vos entristecestes tão rápido, o que na sua imagem, a
sombra que sou eu, vos entristeceis tanto? Seria que não realizo o seu sonho
maior, o de harmonizar-se consigo mesmo, o de sentir que vós sois a imagem da
vida refletida realmente, alegrias e tristezas bem representadas neste espelho
que são você e a representação de mim? Se tristes estais vós assim, por que não
me abraçais novamente? Aconchega-me no vosso útero de criação, no vosso útero à
palavra, pois que o Filho de Deus ensinou a todos os homens que a palavra é a
salvação de toda a solidão, incompreensão do que acontece e do que existe,
sombras que se projetam a partir de meu único corpo. Basta que vós quereis,
desejais com todo ímpeto do coração e alma, se possível unir a eles o espírito,
este que purifica a vida. Não vos negarei a minha própria sombra, embora vós
não podeis ver esta minha sombra, sombra esta que vos guardais, vos iluminais,
vos santificais... Aliás, meu amigo, a vocação dos asnos é ser justamente
santos, como Jesus o dissera...
- Sombra,
prestai bem atenção nestas minhas palavras, aliás, resposta às suas!... Olho a
pata. Com efeito, olhando-a, prestando-lhe atenção aos traços, passos que foram
dados na existência, registrados nela, observo e lhe digo, sombra, que vos
negarei serdes vós o sacrário de mim, pois que sou este sacrário de minha vida,
“eu “, de minha redenção e ressurreição. Digo-lhe ainda mais: “Aqui, sombra, é
o fim de tudo, onde começa o reflexo do mundo, o lugar de repouso de todas as
sombras sem sacrários que sonham os raios solares do Éden, as felicidades que
todos nós somos merecedores, somos vocacionados para a Felicidade Eterna, o
Reino de Deus...
- Incitatus,
mesmo que vós não aceitais ser eu a vossa sombra, ser eu quem de algum modo o
identifica com o mundo e a vida, ainda assim serei eu como a exemplo do palhaço
que usa objeto no nariz, de preferência vermelho, para mostrar hilaridade,
serei eu quem diz as verdades por caminhos tortos, como se é costume dizer
sobre Deus que Ele resolve os problemas dos homens por caminhos sinuosos, mas
Ele é a Redenção, a Ressurreição, a Sombra que cobre todo universo. Serei,
Incitatus, mesmo que não aceitais, quem lhe dirá os caminhos do campo!...
Viver com
uma calma orgulhosa e impassível, sempre para além. Ter e não ter,
arbitrariamente, os seus afetos, o seu pró e contra, condescender com eles por
umas horas; montar sobre eles como em cavalos, freqüentemente como em burros.
Pois que se deve saber aproveitar a sua estupidez assim como a sua fogosidade.
Conservar os primeiros planos. Igualmente os óculos escuros, pois há casos em
que ninguém nos deve olhar nos olhos e muito menos ainda nas nossas “razões”. E
escolher, para companhia, aquele vício matreiro e sereno, a cortesia. E ficar
senhor das suas quatro virtudes: a coragem, perspicácia, simpatia, solidão. A
solidão é entre os humanos e os equus asinus uma virtude, como tendência e
impulso sublimes de asseio que adivinha como, no contato de homem para homem
“em sociedade”, tudo é inevitavelmente sujo.
A sabedoria
para mim é o desejo de harmonia e coerência tanto do homem como de mim em
respeito à sombra, vontade desta comunhão haver sido realizada, mas, em verdade,
pouca importância tem, mas se a dôo aos homens, aí sim tem importância divina,
é para os outros, os outros através de mim possam descobrir os desejos e
vontades habitam-lhes a alma, vendo tudo se transformando a olhos nus. A
sagrada face são os outros.
#RIODEJANEIRO#,
11 DE ABRIL DE 2019#
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