FONTE LUMINOSA DO TEMPLO DE FESMONE XX PARTE ==== ONDE A FRALDA DA MONTANHA SE BANHA NAS ONDAS GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: AFORISMO
Sim, que é o para sempre senão a última imagem,
nítida, metálica, vem do lado de cá das arribas, vem do lado de lá da vida, não
exclusivamente deste mundo, mas de qualquer mundo que se enovele numa
arquitetura de sonho e de permanência.
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O advérbio vem entre vírgulas e, mesmo assim,
sentido algum possui, pois não se realiza. A vivacidade destas vírgulas é de
tal forma persuasiva que num primeiro instante nada se distingue, a não ser um
efeito de ofuscamento difuso.
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Quando, porém, me aproximo do advérbio, os olhos
brilham intensamente, as estrelas velam o ossuário da terra onde a fralda da
montanha se banha nas ondas, enfim surgiu-me o de que tanto necessito para me
locomover nas pedras, rumo a onde a fralda da montanha se banha nas ondas;
sempre, se faz necessário esperar o momento propício, não de imediato, e também
de soslaio, porque, caso não o seja, uma assembléia de sombras negras e brancas
somem dentro da noite.
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Sonâmbulas circunspecções e introspecções. Grito e
rio-me, rio o meu sábio silêncio, nascido nas montanhas e montes, nos morros –
selvagem sapiência -, o grande anseio reside-me nas entranhas, num ruflar de
asas ruidoso. Onde tanto oculto o canto, e aqui des-acalentado? Nada se me
a-nuncia de ausências e faltas de ser, nada se insinua de fugaz e eterno, no
tempo imagem perdida de mim mesmo.
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Sim, que é o jamais senão a primeva imagem,
transparente, translúcida, revela-se ao ocaso dos espíritos, mostra-se à face
do vento, distribui seus mistérios e milagres às mãos vazias no momento
presente.
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Aproximando-me de ambos, advérbio e vírgulas, já
com a atenção bem desperta, verifico que estas pedras, antes de me aproximar de
onde a fralda da montanha se banha nas ondas, têm um sentido: a graciosa figura
dos direitos à eternidade, o espírito tira proveito desses antemãos de sonhos e
desejos; Que tentação mais voluptuosa esta a de identificar-me com as pedras,
realizar os liames de mim e dela intimamente a esse universo frio e suave onde
as águas escorrem de volta às águas, universo que desafia a história da
misericórdia e compaixão – Cristo anda por sobre as águas, salva Pedro de se
afogar, porque ele não teve fé – e suas agitações.
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Tamanha solidão e grandeza de Cristo dão a estes
lugares, onde a fralda da montanha se banha nas ondas, quem sabe até seja
possível relacionar este lugar com o Reino de Deus, assim definir o Reino de
Deus como o lugar onde a fralda da montanha se banha nas ondas, tais imagens
dão a estes lugares um rosto inesquecível. Ao nascer da madrugada frágil e singela,
passadas as primeiras vagas ainda negras e amargas, é um novo ser o que fende a
água da noite, tão exultante de a seguir – Ainda Cristo chamava aos seus
discípulos, dizendo-lhes que tudo abandonassem e o seguisse –; e, retornando, o
mesmo céu continuaria derramando sobre mim sua carga de suspiros e estrelas.
Sim, o garbo faz parte da finesse das grandes
almas, presas às contingências e esforçando-se por superá-la pela abertura do
próprio Ser.
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Como homem no mundo, por se satisfazer, serei o significado
e sentido, serei o presente. Se recebo aplausos e elogios, sonho um pouco,
sinto que não me resta muito para assistir aos sonhos na tela resplandecida da
eternidade; se descobrem nas entrelinhas a vivacidade do sempre, o jogo de
terços de antemão que unem e resumem as orações, sinto-me exultante, uma
alegria deslumbrante perpassa o corpo inteiro como mãos que a acariciam e amam
de paixão, sou homem quem acredita de corpo, alma, espírito, nos sonhos onde a
fralda da montanha se banha nas ondas, onde as ondas esparram-se na areia da
praia, ah, sou quase um deus por criar esperanças; se me não compreendem,
espanto-me menos ainda. Esqueço e sorrio a quem me ultraja ou então cumprimento
com excessiva cortesia a quem estimo, olhando de soslaio para quem me ofendeu,
dizendo-lhe que poderia estar também sendo cumprimentado com extrema cortesia.
Tal perseverança em tecer os liames do advérbio e
vírgulas, estabelecendo a harmonia de ambos com o para sempre e o jamais, tem
algo de emocionante e traz consigo uma lição: a de todos os momentos da
criação, do sentimento, da emoção, do sonho do verbo e a da busca do desejo
mais divino para a origem e gênese da alegria e felicidade.
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Apanho em flagrante a linha que é o verdadeiro nome
para o frontispício de uma rocha sólida. O sentimento de plenitude de vida,
provável, mas inda não atingido, deixa-se, por vezes, entrever, lega-me o
ensejo de vislumbrar, e torna a voltar em meio a essas eternas represálias,
esforços ansiosos por murmurar uma nitidez delicada. Poder sentir-me seguro.
Sobretudo servem de testemunhos para representar de forma talvez mais
significativa.
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A figuração de jogos e prazer, de achaques e medos,
de amores e de traições – força enfim que modela não esse que sou
quotidianamente, mas o possível, o constantemente inatingido, que persigo como
se acompanha o rastro de um amor que se não persegue, o féretro de um íntimo
que não deixou só lembranças e saudades, que se deixou no mundo.
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Domingo, à tarde, passeava pela Rua São Paulo,
esquina de tupis, ligo para o amigo-irmão, aquando tomei consciência de que a
mamãe havia morrido; ligo para minha residência, desejando saber o horário do
enterro, tomei conhecimento de que havia já sido enterrada. Não deixou
lembranças e saudades, deixou –se no mundo. Deus sabe o que faz!... Com
certeza!...
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A lembrança dessas tristezas não é uma saudade
triste; por isto sei que não sofri por não haver visto a mamãe morta. Tantos
anos depois, seis anos e cinco meses, ainda persistem em algum lugar de meu
coração, cujas fidelidades costumam ser difíceis, sempre, é com a mamãe, a
lembrança viva de ela dizendo a todo momento que saía de casa: “Maria
Santíssima ilumine seus caminhos!...”
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Conquanto , não é possível desconhecer a pedra.
Mudo-a de lugar, mudando os passos. Seja como for, existirá enquanto houver
homens que a sentem de por baixo dos pés. No momento, a pedra apóia o desejo de
compreensão e entendimento; sempre, faz-se necessário olhar para as pedras e os
passos, passos em falso resultam em queda, posso cuidar disso, com destreza e
perspicácia, evito as quedas. Mudar os passos é a função e responsabilidade,
merecimento e dom, dos homens; é necessário escolher entre realiza-los ou nada
fazer, sentar-me a pedra e observar as águas batendo nas pedras; o sol, o vento
leve, a inclemente tonalidade azul do céu, tudo já me permite imaginar a doçura
do anoitecer.
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Às vezes, sinto-me perdido no meio de um sorriso.
Não faço sucumbir a palavra ao fosso onde a fralda da montanha se banha nas
ondas, onde enterraram a carne. O fio de luz plenificou-se no barítono da
morte. O medo de persistir atiçou impressões da arte, trazendo o riso da
coincidência. No outono, antes de primavera outra, o olhar não intimidava nem
retorcia no tempo conjugado do verbo, preenchendo o vazio das respostas às
perguntas que perpassam o espelhar os projetos superpostos na indagação.
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Os raios solares não me atingem; a poeira ainda não
se levanta da estrada, após a chuvinha desta madrugada, chuvinha fininha, quase
que uma simples garoa, chuvinha de início de primavera; eis a fralda da
montanha onde a contemplação do para sempre e o jamais resgata a mão fresca da
noite sobre um coração sedento da beleza e do belo; o espírito se une aos
apóstolos adormecidos e os sancionam; e o refúgio coberto de erva convém melhor
a um rapaz do que um leito de penas. A nascente murmura lânguida a meu lado.
Estaria realmente equivocado? Seja como for, tive sua revelação.
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As estrelas velam o ossuário da terra onde a fralda
da montanha se banha nas ondas...
#riodejaneiro#, 23 de outubro de 2019#
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