**SEMANA //Blog **BO-TEKO DE POESIAS** - 18-24 DE NOVEMBRO DE 2016** - Manoel Ferreira
**TURBULÊNCIAS DA ALMA**
Título: Graça Fontis
Texto: Manoel Ferreira Neto
Cada nota de música desperta algo:
Rugidos embrulhados em vaga imensa enraivecem a presença morta – o olhar
avança nos trilhos, transcendendo idéias alucinadas. De quem sentimos o que é
imprevisto se supõe. Encaramos o bem e o mal com o mesmo rosto, a mesma
fisionomia, o mesmo semblante. O freio possesso abre dos rigores o sonho. Por
minúcias na distância, penetram na esperança faces túmidas do corpo oculto. O
dúplice machado corre sobre a singrada rocha, aspargindo nas duas fontes o
gesto amável e sensível.
Cai entre silêncio perto e rumores ao longe, distantes, a tarde em mim.
Vem uma voz como uma palavra menor, gota de água acabando de sair da mina. Logo
se mistura a outras, e um pequeno córrego se forma... Não mais que um instante,
as coisas vão tomando a feição de uma correnteza, para logo em seguida virar
uma violenta cachoeira. Já não são palavras miúdas, meus gritos; caem dentro de
mim. Forma um lago, quase não consigo ler em suas águas, turvas linhas, como se
por toda a vida tivesse chovido na cabeceira do rio...
Interfere num sentimento:
Ao julgo do vento, os olhos cerram-se-me adormecidos, cobrindo de
insultos a agonia dilatada. Campos de sangue rompem, na maldita conjuntura, as
dilações insondáveis. Mãos fixas revolvem os funerais gargânteos do fogo.
Sensações amargas volteiam desejos de sombras irrefletidas nos gestos incertos.
Não sei por que estou falando isto. É que foram tantas as vezes que fiz
silêncio, ao escutar o grito do mundo, e hoje você, meu amigo, calou o mundo e
eu pude, então, falar. Às vezes, tudo que precisamos é que alguém nos empreste
o coração e deixe nossas palavras tão guardadas irem como uma cabeça se abrigar
entre o peito e o ombro.. Suas palavras podem me levar para um lugar onde tudo
começou? Há alguma palavra que eu deveria ouvir, generoso amigo?
Intervém numa emoção:
Serpentes devoram mortais expulsos desta terra maculada de deuses. Por
limites, as águas apartam da morte olhos perspicazes não perturbados pela
embriaguez. Muitas vezes. Muitas vezes quando a luz se apaga sobre minha
insônia, pergunto-me – fazia-o mais assiduamente – com os ossos entre(dedos):
de onde vem esta indiferença? De onde me vem este mal-estar que não me permite
estar em lugar algum?
Quanto ao riso, o Filho de Deus ensinou-nos que há muito mais alegria em
dar do que em receber. Não há outro caminho. Não há outro estilo ou forma. O
passo é nessa direção...
Será que existe longe daqui uma outra humanidade vivendo histórias
melhores? Não sei por que estou falando tanto e fugindo sempre... A verdade é
que sofri a traição, e ela é o veneno que contaminou a água dos meus poços.
Confiança perdida é como um espinho caminhando corpo adentro, sempre lembrando
que está passando, não deixando olvidar o que se passou... Por que dói tanto
assim ser traído? Existe perda maior do que a perda da confiança?
In-audita no ritmo a melodia:
Filosofia apenas contida no ser exegético das próprias palavras. tudo o
mais é pura beleza, pura poesia, puro devaneio sobre palavras que deixaram
revigorados força, brilho, sentido, na fonética e métrica apuradas, discretamente,
entre linhas, numa abissal escultura de poiética!!
É do lirismo da alma humana que os sonhos emergem, num átimo sagrado do
instante. Sonho é a imagem-ser da força do querer que faz a fé da verdade na
realidade do sonho.
Sonhar é reconhecer-se o instante, o mágico, o etéreo, a particula
divina que se nos habita e premia...
O sonho é o poeta utópico e sonhador projetando o amor aos auspícios da
vida senhora da emoção do eterno e do que trans-cende o sentimento da
felicidade. O sonhar é a dádiva sublime da pureza onde habita a inocência
consciente do ser... Entre o sonho e a realidade há uma linha tênue que se nos
completa, dividindo-nos, ao mesmo tempo que divinizando-nos à busca de quem
somos. Divinizando-nos à busca de quem somos, sonhar é demonstrar pra a vida a
poesia da sinestesia do eu respondendo ao outro se nossas esperanças do belo e
da beleza:
Sonhar é estar em graça.
Interdiz no espírito e na alma:
Nas tardes de verão, continuava a ficar sentado à amurada do alpendre,
olhando o infinito – em que nada se encontrava nele, nem mesmo a minha imagem
no futuro: um vazio pleno e absoluto – vendo os pedestres. Às vezes, a máquina
de trem de ferro passava. Fixava os olhos no vagão cheio de bois. Era a alegria
da garotada. Não era a minha, com efeito. A minha alegria tinha a medida exata
de um novo livro. Terminada a leitura, acabava a alegria. O homem da casa em
frente só chegava em casa bêbado. As prostitutas pulavam a linha. Passando à
porta, indo ao Mercado Municipal fazer as suas pequenas compras. De vez em
quando, passava uma mulher muito bem vestida, um homem de terno e gravata.
Havia de por trás da criança um quintal, um passeio, onde, sentada, olhando
para o infinito, deparou-se com um enorme vazio. Mas estas nunca se confundiram
com ele, nunca o preencheu. Com os olhos erguidos, procurava nalgum lugar um
ponto não vazio. Todos sem exceção. No céu, somente nuvens. A noite, estrelas.
(*RIO DE JANEIRO*, 19 de novembro de 2016)
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