**DISSIMULADO EM TAÇAS DE CRISTAL** - Manoel Ferreira
"Toda consciência visa à morte de outra"
(Hegel)
O invólucro tênue, frágil de afeição por toda forma de beleza surge de
por trás da ternura frágil por todo conteúdo de perfeição. O Belo das atitudes
envolvem num ato de generosidade, num gesto de carinho e solidariedade,
elevando em nível de olhares fáceis, expressando e imprimindo em taças de
cristal. Observo-me e as palavras ditas são sentidas nos interstícios de ações
no mundo, no âmago de atitudes da ec-sistência. Procuro salvar o viver de seus
envolvimentos supérfluos com os falsos ideais: coloco-me acima da vida,
perscrutando as sensações evidentes e trilho as veredas dos pensamentos e
ideais.
A criação de um momento novo, até o mais íntimo da solicitude, que
referência alguma repita a mim o modo usual e demasiado retrógrado de viver o
quotidiano. Insinuo aqui e ali o realismo que o íntimo do mundo consegue
capturar da sinfonia dos sentimentos através das mais variadas experiências
vivas, da ópera das emoções e sonhos por inter-médio das mais inusitadas
vivências da busca do ser e do verbo.
A consciência das realidades vividas sustém a mim no quotidiano da
afetividade inteligível, uma doçura no olhar: a análise revela o modo autônomo
e estranho das explorações percucientes das irreferências. Digo de mim e os
sentidos revelam-me o outro lado de resistências: dentro da unidade do conjunto
para o qual contribuo, sou um instrumento artístico para o entendimento das
emoções, da alma: até diria a alma estar acima das emoções, pois a
re-presentação de mim advém dos interstícios da alma, mas sem as emoções tal
re-presentação seria defectiva, apenas o objetivo das coisas. entram as
emoções, assim a vida se pres-ent-ifica-se. Perpétua solidão de viver a alma
revela-se-me nas formas eternas do agir incólume em rumo à mais isolada delas,
a evidência do real. O sentimento sublime da alvorada em seu instante de brilho
e êxtase: o espírito manifesta os horizontes da plenitude.
A translucidez do eterno reflete-se de modo primordial no olhar as
manifestações de prazer representadas no ardente desejo de criação, a visão é
apenas uma ótica da inteligência. Fácil é a expressão das nuanças de viver a
inteireza: faz-se mister inserir as feridas abrem-se nos sentimentos. O segundo
é de perceber as revelações intrínsecas do isolamento: a mágoa interfere
essencialmente na ejaculação dos sentidos. O fosso da esterilidade faz gerar as
indefinições, nascer a atitude essencial, a dubiedade emotiva. Alço o olhar à
mais íngreme emotividade: sinto um misto de tristeza e alegria por viver as
sensações reais d´alma, o carinho e generosidade.
Sinto-me disperso: as emoções estão efusivas e latentes em mim, está
aquém das forças dominá-las. Universo estranho e magnífico de poder sentir o
fundo dos atos conscientes: sou uma leveza a deambular flácida nos braços
ternos do sensível. O riso descreve o título esquecido da elegância íntima,
fixando as testemunhas oculares, esse luxo secreto e enigmático do prazer. Sigo
na secessão e no retiro, buscando ampliar os horizontes particulares, segundo
um ângulo que compreenda haver conseguido a enorme taça de cristal de desejos.
Estou impedindo o afloramento de sensações, buscando não ultrapassar os
limites do minuto... não subsistem senão débeis vestígios de uma beleza
perdida: para reconstituí-la é preciso viver textualmente a incógnita formosura
da experiência. Palavras sinto - e sem deformar os sentimentos fluentes busco a
plenitude ária da sensibilidade.
A suntuosidade do esplêndido ápice do prazer a manifestar os espectros
eternos e perenes da ternura, tornando o viver um simples ato de credulidade. A
formosura cristalina do sentir a presença do clímax imortal a revelar as suas
plenas imagens de júbilo, os seus dons de perseverança. A pomposidade efêmera
do gozo de sensações da contingência a derramar os risos solenes da esperança,
os escárnios polidos da espera, a ironia nobre da intuição, o sarcasmo pomposo
da inspiração. Nobre desejo de sentir as profundezas do coração, em seu segundo
mais sublime, ascendendo ao mais longínquo cume da paz o sentimento nítido do
alvorecer para o viver.
Não me fora o doado o dom de entender a crítica literária. Crítico tece
as mais egrégias considerações à obra de um autor. Biélinsk, na Rússuia, tornou
Dostoiévski um escritor reconhecido, conhecido, com a sua leitura de Pobre
Gente, primeira obra de Dostoiévski, publicada, isto de um dia para outro.
Quando Dostoiévski publicou o Duplo, Biélinsk descascou os verbos, negligenciou
com todas as letras. Bielinsk lera a obra sobre a sua perspectiva social e
política, a miséria. O Duplo é obra psicólogica. Esta crítica gerou relações
difíceis entre Dostoiévski e Biellnsk. Lê-se a obra num ângulo de visão, o
autor apresenta oura depois. A vida do artista-escritor é sempre uma busca
eterna. Machado dera uma resposta categórica, quando lhe contaram que crítico
havia descido o malho em Memórias Póstumas de Brás Cubas: "O crítico vai.
O escritor fica." Este deve ser o posicionamento: e não é o real? Assim,
penso e sinto: reconheçam em primeira instância, depois negligencie, não tem
problema: "O crítico vai. O escritor fica".
Digna vontade essa de lançar-me nítido e consciente ao fundo de prazeres
reais. A fugacidade do olhar inscrita nas atitudes sérias e sinceras faz-me
recrudescer o sonho de futuro. Sinto permanecer num sítio de mim e, através de
sua percepção e veracidade, envio à superfície as sensações buriladas e
polidas.
O instante apresenta-me a impertinência para a longevidade nesta vida.
Ouço a nitidez de sons quase que ininteligíveis ao ouvido e sinto emanações
exóticas de um paladar subliminar. As ondas vivas de sentimentos sutis vêm
tocar as docas de caros pensamentos de ternura e generosidade. O silêncio
inaudível do sibilo na caminhada do vento rumo ao precipício do infinito
traz-me esta sutil alegria no olhar.
Vou deambular fácil e espontâneo nos recônditos sítios do sensível,
sentindo as nuanças nítidas do clímax.
Manoel Ferreira Neto.
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