ESCRITORA E POETISA SONIA Sonia Gonçalves COMENTA A SÁTIRA /**NEM QUE O BODE SOLTE CHAMAS DE FOGO PELAS FUÇAS*/
Nossa!!!
Boa noite Manu!!! Revoltando-se contra coisas clichês?Dizer que o destino é
irreversível é loucura sim, contudo creio que acontecimentos, pessoas cruzam
nossos destinos, mas cabe a nós conceder um lugar ou não para estas, e para
tantas coisas temos nosso livre arbítrio para escolher inclusive para nos
livrarmos dos carmas e dos infortúnios , temos sim o poder de escolha, graças a
Deus, mesmo não podendo escolher morrer ou não podemos escolher morrer
dignamente por ter sido do Bem, podemos reagir a mortes dos ente queridos com
aceitação sobre aquilo que não podemos mudar, e lutar contra as mortes
estúpidas que cruzam nossos destinos...Enfim, Manu, eu amei seu texto ainda que
demonstre um certo "chega tô de saco cheio" rsrs Bem no popular...
Bjos querido.Parabéns!
Sonia
Gonçalves
**NEM
QUE O BODE SOLTE CHAMAS DE FOGO PELAS FUÇAS**
PINTURA:
Graça Fontis
SÁTIRA:
Manoel Ferreira Neto
Não
matei cachorro a gritos nem pulgas a beliscões. Levar-me a isto faz-se mister
algo que ultrapasse todos os limites, não quaisquer uns, mas os inimagináveis,
inconcebíveis, irracionais. Corre em minhas veias sangue de barata? Nem tanto o
céu nem tanto o inferno.
Palavras
ao léu não me tocam, não me fazem cócegas no cógito, quando mais em se tratando
de quem as pronunciou: pela escassez de seu vocabulário, pela pequenez de sua
inteligência, gastou tempo inimaginável para encontrá-las em estado bruto, sem
arrebiques, de modo que me fizesse re-fletir, meditar, fizesse-me re-troceder
no tempo, analisando as coisas, vendo com clareza os olhos de sol que tem as
tardes, sentindo no mais profundo das pre-fundas medo de no futuro as
desgraças, in-fortúnios caíssem sobre mim, considerando aí o quanto arbitrário,
gratuito, o quão errado estive no passado.
Tais
palavras pronunciadas com o fervor da alma, qual um grito escondido há muito
saindo a plenos pulmões, ensurdecendo até os habitantes da Cochinchina,
mostraram-me apenas a pessoa não sabia nem a minha cara, muito menos
conhecer-me superficialmente, para ela não existia, não estava no mundo, não
era um fantasma. Não as diria, se me conhecesse, procuraria outras na sua
caverna sem fundo.
Dizer-me
que o meu destino estava marcado é um disparate, despautério. Estava ele
marcando-o, era um deus pre-determinando os meus caminhos, não haveria
quaisquer modos de re-vertê-los por mais fizesse, lutasse, estrebuchasse nas
bocas de lobo do mundo, tornar-me-ia cinzas e nada iria mudar, para o inferno
iria com o que escrevia na pedra de mármore para mim. Pronunciando: "Seu
destino está marcado. Sem retorno...", estive quase a dizer-lhe em
contra-partida: "Caríssimo, não existe isso de você marcar o meu destino,
visto ser eu quem o faz, constrói, elabora..." Não o fiz, contudo.
Fazê-lo, dariam panos para mangas, teria de me utilizar de todas as
verborréias, elencá-las com esplendor e excelência, horas e horas seriam
precisas, até que percebesse as coisas com lucidez. Palavras são muito difíceis
de encontrá-las, e gastá-las à toa não faz qualquer sentido, não possuía ele
condições de entender, compreender. Vive ele no tempo dos deuses, eles é que
condenavam os homens. Tudo nele mostra ser retrógrado, démodé, nada irá mudar
isto até o seu fim irreversível.
Alfim,
tive uma idéia salvadora... Ah, trapézio das concepções abstrusas! A idéia
salvadora trabalhou em mim. Era nada menos que fasciná-la, fasciná-la à
revelia. Não medi as consequências. Re-corri-me ao espelho, mostrar-lhe a
imagem de suas palavras re-fletida nele.
-
Meu digníssimo, dissera-me que o meu destino está marcado, não há retorno. Não
quer mais saber de quaisquer relações comigo. No futuro, desgraças e
infortúnios podem cair sobre mim, irei precisar procurar-lhe, e isto não irá
permitir nem que o bode solte chamas de fogo pelas fuças tal e qual Satanás.
Você está marcando o seu destino a meu respeito, predeterminando os seus
caminhos em relação a mim. Se refletir aí com os seus miolos, realizará com
toda a pompa que já lhe mostrei com todas as letras sou quem não interessa mais
a sua presença, e para ter mais ciência do que lhe estou a dizer: qualquer
a-nunciação de sua sombra a qualquer distância virarei as costas, seguirei por
outra alameda.
Ouvia-me,
passando a sola do sapato na grossa raiz
do ipê amarelo. Terminando, virou-me as costas: "Espero que nem no além
não nos encontremos."
-
Amém... Amém... Amém...
Abri
a porta do meu casebre, sentindo-me ter retirado uma tonelada de coisas nas
costas com que andei por longos e longos anos. Livre... Livre... Livre...
(**RIO
DE JANEIRO**, 23 DE MARÇO DE 2017)
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