QUEM RI POR ÚLTIMO RI MELHOR, ATENAS ATÉIA!... GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: SÁTIRA ***
De que?
De que todos nós rimos? Haveria algo a ser rido? – desculpem-me este viperino
cacófato, reunindo numa única palavra “serrido”, mas podendo afiançar estar de
acordo com a gramática. Se houvesse, há muito todos já estariam rindo a
bandeiras soltas, até ao limite do choro, e daí o desespero por ser capaz de
retornar à seriedade, a agonia, a morte inevitável.
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E de que?
De que estariam todos rindo até a morte? Por não haver algo a ser rido, e rir
do que não há, do que não existe, é rir de nada, nada é plausível de riso. Que
idéias? Que sonhos? Esperanças, utopias, pensamentos são plausíveis de riso?
Nenhum no que tange ao bom senso e saúde mental.
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Mas rimos
todos nós do que não há, nunca existirá, não se sabendo se algum dia será
possível a existência do rir do que não há, jamais será conveniente a
existência deste riso.
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E ainda
não disse de que todos nós rimos. Estas palavras introdutórias anunciam a
contestação, rebeldia, revolta por serem estes os hábitos, o riso do que não
há, e de ambos, se nos for conveniente considerar a possibilidade de reunião do
que não há e há, se somos capazes de recolher algo de sublime e de ofuscante,
uma fornalha ardente de pensamentos e utopias, intuições e contemplações,
pode-se até imaginar a reunião do riso e do não-riso, que idéia mais absurda:
afinal, é digno rir disso, não rir daquilo é ainda mais essencial à
sobrevivência do homem e de sua condição de humano no mundo, no meio das
coisas, dos homens e dos objetos os mais variados possíveis.
***
Aí,
agora, é possível e convincente que já se sabe do que estamos todos rindo a
bandeiras soltas. Por estarmos rindo todos dessas palavras, mostra apenas uma
intimidade e arte com as palavras, muito bem construídas as idéias, os
pensamentos, mas não dizem coisa alguma, não têm senso algum, podendo-se
afirmar com categoria tratar-se de uma imbecilidade, um maravilhoso e
esplendoroso momento de inspiração da imbecilidade, futilidade, e todos as
outras “idades”, sem qualquer utilidade, nem com muita boa-vontade.
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Mas, fácil
é admitir que é razoável, objeto mesmo de inteligência e sabedoria, rir do que
é imbecil, idiota, mostrando o nível de conhecimento e razão chegamos os
homens. E é por essa razão que desde o início estamos todos rindo, não paramos
um instante de rir, já ultrapassamos há muito o limite do que é passível de
riso, começamos o nível do desespero por parar de rir, e quanto mais vamos
mergulhamos na leitura do que está sendo escrito, registrado por todo o sempre,
por toda a eternidade, não ser possível ser negado, pode-se não dar valor às
palavras, aos seus sentidos, significados, metáforas, o que mais quiser incluir
neste elenco.
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Se não há
o que “ser rido”, se não pode parar de rir mesmo não havendo o que, não podendo
mais retornar ao início, retornar ao fato de que não havia nada que
justificasse o riso, são apenas habilidades e engenhosidades, uma intimidade
com as palavras, podendo delas fazer o que quiser, mas no íntimo, no fundo da
alma, onde a fornalha está mais que ardente de tantas dores e sofrimentos,
culpas e responsabilidades, e não importa o que, quais os resultados e
conseqüências tende-se a negligenciar, fugir, escapar a passos largos, mesmo
não deixando nenhuma marca ou traço que os possa identificar, não sendo então
mais uma coisa que vá intensificar o riso, mesmo intensificando mais, tornando
a morte mais rápida, deixando ao menos que a morte chega não precisando
aumentar o sofrimento, as dores que habitam o íntimo.
***
Compreendo
que é doloroso estar rindo sem parar, mas havendo algo que impulsiona para
frente, para a continuidade, não desviando um só instante os olhos da folha de
papel, lendo sem parar, desejando a conclusão, se é que nisto possa haver um
“grand finale”, mas até onde se é possível continuar criando a imbecilidade,
idiotice, asneira, o que mais existe neste nível, a engenhosidade e arte, a
intimidade com as palavras, as idéias e intuições que fora eu reunindo para
esta criação.
***
O que
posso fazer? Não fora assim que ouvimos desde os nossos antepassados, de nossos
parentes e amigos, conhecidos e inimigos, não ouvimos “Pode rir... Pode rir...
Quero ver é no futuro o que será riso”. Se era de algo que sabíamos de prazeres
e alegrias, felicidades e paz, ríamos da infantilidade, ilusão, fantasia –
estavam “viajando na batatinha”, na “maionese”, ouvíramos de ambas as formas.
Se era de algo que sabíamos dos sofrimentos e dores, ríamos por que a nossa
vida não seria assim de modo algum, só tragédias e fatalidades, éramos
suficientes fortes e capazes de evitar os dramas. E hoje sabemos que esses
risos nos acompanham e vão acompanhar para sempre, mesmo que os negligenciemos,
e com isso justificamos as nossas responsabilidades e culpas que nos habitam
bem no fundo.
***
Creio
ainda ser risível se continuar aprofundando, mergulhando no riso que começara
desde o início e a cada passo, a cada palavra intensificando, tendo já
ultrapassado o limite do desespero, por desejar parar, não continuar mais, não
sendo possível, tendo de “abaixar a guarda” diante do limite da vontade e do
desejo, chegando agora à agonia, pois não se pôde interromper a nível do
desespero, nada houve que justificasse ou explicasse, ao contrário tudo
indicando para algum sentido inexplicável ou inteligível, mas sabendo a
existência dele, daqui para frente sendo dolorosa, sofrível e sofrida a
continuidade.
***
Quem sabe
é por haver nestas palavras algo que identifique a presença de dimensões da
vida, jamais paramos de esconder as nossas mazelas e pitis por toda a vida, o
que nos habita de estranho e esquisito, insano, e lendo vai se intuindo na
linguagem e no estilo estar a tratar disso de nos haver escondido os nossos
fantasmas, não havia o que ser rido delas, mas temido com todas as forças e
determinações além da condição humana de o fazer.
***
Então, é
risível haver rido desde o início até agora do que pensara não haver algo que
justificasse, que tivesse algum sentido sério, uma intenção intransigente, uma
intuição benéfica, se houvéssemos percebido que era viperino negligenciar o que
nos habita a alma, que dores e sofrimentos vivemos no íntimo, não iríamos ter a
necessidade de estar rindo, aí tendo sentido mesmo estar rindo por serem as
palavras sem qualquer senso, sem quaisquer inteligibilidades, uma perfeita
imbecilidade e idiotice, tendo direito à imortalidade por atingir o absoluto, a
sublimidade do asno, da “jeguice”, digamos desse modo, ou melhor tendo a coroa
do asno sobre a cabeça, e uma estátua em praça publica, cuja inscrição, cujo
epitáfio outro não poderia ser senão “Aqui jaz um homem que atingiu a perfeição
da imbecilidade e idiotice”, o que seria risível a todos que lessem, imaginando
as coisas mais esquisitas e estranhas que tenha dito, do modo e forma que tenha
vivido, de estilo e linguagem que tenham se expressado, isto sem contar as
ações quotidianas.
***
Risível
ainda é o fato de todos rirmos dessas palavras que nada dizem, não
compreendemos em verdade o que há nelas que despertem o riso, que nos tenha
trazido até a esse momento de agonia, e tudo o mais será a proximidade da
morte, até à morte.
***
E todos
nós rimos, Atenas Atéia!... Quem ri por último ri melhor!...
#RIO DE
JANEIRO(RJ), 27 DE MAIO DE 2020, 11:34 p.m.#
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