#ANTROPOFAGIA ANTERIOR A QUAISQUER PSICODÉLICAS IMAGENS# GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: SÁTIRA ***
Bem,
deixe-me estar sobremaneira livre e descontraído, deixo as letras sublimes
deslizarem nas pontas dos dedos, nestes dedos que trocam palavras, brincam com
os movimentos da digitação ao inscrever idéias, pensamentos, sarcasmos,
ironias, cinismos nos sarrabiscos das linhas, às vezes amenas, às vezes duras,
em tons simples, por vezes agressivos, esquecendo-me destas antigas
dissipações, dissipações responsáveis por, num estilo coevo e póstero,
linguagem antropofágica e anterior a quaisquer psicodélicas imagens, estes
sentimentos e emoções que sinto, perpassando o íntimo do espírito e alma, serem
capazes de exercer o ministério de nova aliança de responsabilidade e apreço.
Felizmente, as mãos são destras em tecer linhas; são responsáveis por me
haverem feito amadurecer, crescer, sabendo de antemão e revezes que a
consolidação do “verbo satirizar” ainda se encontra muito distante.
****
Enfim,
era de intenção dizer coisa sem coisa, a preocupação de um sentido, de uma
imagem, deixei-a descansar-se por momentos na outra cadeira de poltrona,
confortável, tranquila, na inerência de templos e origens, olho-a e comovo-me.
Reclina-se, então, na cadeira, desembainha um olhar afiado e controverso, e
deixa-se estar. Ao tempo em que olhava só, ora fixa, ora móbil, levando a
astúcia a ponto de olhar às vezes para dentro de si, o meu olhar continuava o
seu ofício de tentar entendê-la e compreendê-la, remexendo de dentro a alma e a
vida.
***
Interessantíssimo
o olhar da preocupação em articular, delinear as idéias, não deixando nesgas
inúteis em seus lábios. Acredito até haver uma compaixão um pouco disfarçada:
deseja amparar-me, não me identificar, posto à parte dos acontecimentos e
situações, por não saber por que caminhos trilho; muita generosidade, não
esperava tanta; pode, sim, contribuir na construção das imagens,
intensificá-las, aumentá-las, sem limites e fronteiras, identificar-me os
vestígios da beleza, visto ser ela o de que mais careço.
***
Acrescendo
que, talvez, haja nela muita dissimulação, e que o melhor modo e estilo de
fechar as pestanas aos sustos e às dissensões é aceitar a ideia concebida antes
de iniciar, dizer coisa sem coisa, entregar-me ao absoluto nada, embora nesta
ideia que já vai longa não haja a mínima crença de que esteja dizendo coisa sem
coisa, há muitas dimensões desconhecidas no interior de cada palavra, de cada
pensamento.
***
Parece-me
a vida indistinta quer atardar-se no sono autêntico, intenciona adiar-se no
adormecimento autêntico. De não permito palavras lançadas. Dizer o que sinto,
nem mesmo a terra, os restos mortais, irá separar: a individualidade está
consumada. Rumo ao mundo, à humanidade, uma felicidade incomensurável, a
estética imenso feliz por haver abraçado a plenitude.
***
Há uma
certa sensualidade num amplexo estético. Os olhos sentem os instantes de
tristeza: servem-lhe profundamente na atitude de vislumbramento e entrevisão. A
sensualidade greta-se com o suave como para dar mais bem acolhida à nobreza de
sentimentos. Encontro o sentido do amor e da amizade. Nenhuma forma de vida
detém a totalidade mais tempo do que lhe é necessário para se dizer.
***
Digo isto
com o tom inocente, ingênuo e, por que não, sobremodo preguiçoso de quem não
cuida em mal, e o sorriso que me derreia os cantos da boca traz aquela
expressão de candidez da juventude, não de toda ela, manifestou-se tão poucas
vezes que necessito espremer os miolos para uma imagem simples destas
manifestações havidas outrora.
***
E,
palavra!... A letra dá vida, o espírito é que é objeto de ambigüidades e
controversas, de interpretação, de pedidos de desculpas e, conseguintemente, de
amor e esperança. Há-de se pensar que muitas são as vezes em que a interrogação
de que amor é este, de que esperança é esta se manifestem contundentes, podem
ser tantas as respostas que o universo inteiro se sinta completo e pleno, não
havendo única nesga de vazio, de abismo nele.
****
Excito-me.
Perdoe-me também, o que continuo a rogar, para mim isto é uma situação nova de
nossas relações íntimas, alguma coisa que me faz adormecer a consciência, não
me esquecendo, contudo, de resguardar o pundonor. Eu mesmo, até então, tinha-a
em má conta, zangava-me quando me fatigava, quando não podia ir além de certo
ponto, e me deixava com o desejo a avoaçar as nesgas das colinas, à semelhança
da criança encolhida para dormir – daí é que me sobrevinha a sensação, quem
sabe até um sentimento presente e real, de que o tamanho de minha inteligência
não conseguia senão palavras de raiva, de ódio, e para não as assumir era mesmo
conveniente pedir-me desculpas por ato tão vil e ignorante. Agora, não a tenho
em boa ou má conta, não me importa de estar descansando na poltrona, não me
fatigo, posso ir muito além das “fronteiras da lembrança e do esquecimento”.
***
Prometi-me
que teria engenhosidade e perspicácia para descrever a preocupação fora de mim,
no sentido de degustar um deleite, descobrindo a sublimidade, se a houver de
por baixo destas palavras obscuras. Se o fiz, o mínimo que posso cumprir é
conseguir chegar ao momento em que me disser que estará terminada esta longa
viagem através de sensações, intuições, percepções, que, em mim, trago adentro,
sem a preocupação.
***
Tão cheia
de si!,,, Descobrindo entre as minhas sobrancelhas, a ruga interrogativa e
ameaçadora, não tenho nenhum sobressalto de quem esteve apenas a sonhar de
olhos abertos, o sonho de inerência de templos e origens, nem fico assustado
como alguém que descobre ter estado mais do que enganado, fora um imbecil a
todos os planícies e bugres dos chapadões, algazarras deles de entre as serras e
montanhas. E, palavra!, em nenhuma ocasião a acho bela, talvez porque nunca me
senti tão orgulhoso e lisonjeado de deixar a preocupação com o sentido das
coisas refestelar-se após tão longos anos de luta e desejos os mais esquisitos
e estranhos a perpassarem-me o íntimo, orgulhoso e lisonjeado de ser capaz de
pedir desculpas não apenas às palavras, coitadas sofrem horrores e desatinos
com as asnices de minha loucura insofismável, tem de refazer suas erudições e
classicismos para se encaixarem aos meus propósitos, mas ao sentido que possam
expressar e, sem dúvida, não conheço, o tamanho da inteligência é pouco, talvez
apenas uns dez centímetros de comprimento, não fazendo cócegas nas orelhas que
são disputadas, no inverno, pelos russos, a saber de quem são, de quem delas é
a propriedade.
#RIO DE
JANEIRO(RJ), 25 DE MAIO DE 2020, 19:12 p.m.#
Comentários
Postar um comentário