Maria Isabel Cunha ESCRITORA E POETISA COMENTA O AFORISMO #COM A CERTEZA PRÉVIA#
Por falta de coragem, muita gente deixou de se realizar, de sair da
estagnação, até mediocridade e de ser feliz. Não é o covarde quem vence, mas
sim o arrojado, aquele que enfrenta o antagonismo, até a derrota e a masmorra.
Na verdade, só o arrojado ficará na história, o outro morrerá incógnito e no
seu cantinho sossegado, mas inglório. A escultura excelente revela bem a imagem
da pessoa acomodada. Parabéns. Adorei. Beijinhos.
Maria Isabel Cunha
#COM A CERTEZA PRÉVIA**
Graça Fontis: PINTURA
Manoel Ferreira Neto: AFORISMO
O gosto do risco procura-o o herói real, de carne e osso, de força e
determinação, o jogador que pode perder – o pôquer, por exemplo, ec-siste para
jogadores desesperados por dinheiro, quem não o tem para perder, que importa
arriscar o que tem para a sobrevivência, a vida? Mas o espectador da sua luta,
degradado na sedução da ação, acentua a sua mediocridade no não poder aceitar a
derrota, no fingir que corre o risco mesmo em ficção, seja ele mais excitante
que o da verdade quotidiana incólume, insofismável, mas com a certeza prévia de
que o risco é vencido. O que ele procura é a pequena lisonja à sua átima
vaidade, ao seu orgulho minúsculo, a figuração da coragem para a sua covardia,
a re-presentação da força pára e só a vitória do herói a quem passou procuração
o pode lisonjear. E se o herói morre em grandeza, há o prazer ainda de o
espectador estar vivo para saborear a coragem do que morreu e a não pode já
saborear, saber-lhe o paladar suave e terno. A vida do herói estende-se assim para
além da sua morte, para bem distante, longínquo em verdade, da sua
imortalidade, da sua inesquecibilidade, onde a espera o espectador para se
in-vestir da glória que lhe coube e ele já não pôde gozar, no poder que se lhe
vestiu com estilo e bom gosto e ele já não pode saber a diferença entre a
virtude súcia e a lídima ética, o valor esplendente e estúpida moral dos
comportamentos, atitudes, gestos. É de dentro da vida e do conforto que o
espectador da coragem saboreia o prazer da coragem que não tem, que não sabe
nas pré-fundas de si a inveja estar presente, não sabendo ele de seu estado
latente, haverá quando se manifestará por inteira. Daí, por vezes, a ilusão de
que também ele poderia enfrentar os mesmos riscos, se os enfrentasse, se os
peitasse em ação direta e reta, sem comer o angu pelas bordas por estar mesmo
muito quente, fervendo, a fumaça a-nunciando-se plena e vigorosa, esvaecendo-se
– jamais o disse, mas isso de comer o angu quente pelas bordas revela quem
assim age lança seu rabo à escravidão e servidão, pensa nas necessidades
futuras. O que lhe fica à superfície de toda a ação é o gosto da ação e não a
dificuldade de realizá-la. Daí que na realidade ele pudesse quiçá atirar-se a
essa ação, se tudo fosse possível efetivar-se num momento – no momento em que
não teve tempo ainda de conhecer o que aí se esconde, no momento em que não
teve tempo de saber que não era corajoso.
(**RIO DE JANEIRO**, 14 DE ABRIL DE 2017)🎻
Comentários
Postar um comentário