**ILHA DO FOGO NO CREPÚSCULO PÁLIDO** - Graça Fontis: PINTURA/Manoel Ferreira Neto: AFORISMO
Aportar à ilha do fogo no crepúsculo pálido...
Não é fácil ficar sem metáforas, é ficar sem água no deserto real, aos
raios incandescentes do sol, é meter o rabo entre as pernas, emitir um
desconsolado au! au!, esgueirar para dentro do inferno, alfim elas cobrem e
en-velam as incapacidades de dizer de modo nítido e transparente o que habita
as dimensões con-tingentes da alma, o que perpassa a veia, quando o sangue nela
corre e segue o seu itinerário, o que na retina dos olhos observa as
perspectivas das buscas do belo por inter-médio de todas as mazelas da vida,
Julguem-me ilusionista, o que isto importa? - ilusório, um reflexo de
nada, até mesmo um reflexo baço de uma cericória, como desejam alguns que seja
assim, a realidade seja inconteste, a verdade seja divina, o sentido dela seja
ab-soluto, não suscite questionamentos, desconfianças, por mais absurda seja
esta idéia, por mais verdadeira, questionável, merecedora de pequena atenção,
sem fervores nem ardores, não merecedora de qualquer observação, mas, podendo
afiançar e asseverar que a ilusão, o nada consomem a ilusão e o nada, a
cericória consome o reflexo baço, por mais que o contra-senso se revele, de
imediato, diante de afirmação até sem sentido algum, “a ilusão e o nada
consomem a ilusão e o nada”, havendo sim sentido envelado, as palavras amam ocultar-se
e revelar-se, mas nas entrelinhas, deixe-me dizer logo, antes que efemerize no
tempo, há coelho atrás do mato, há outras perspectivas e ângulos a serem
intuídos e vislumbrados, des-lumbrados e a-lumbrados; isto querendo significar
o caminho sem margens continua sendo virgem, puro, inocente e ingênuo, sob os
pés, sob a imaginação das mãos, dos dedos performando os caminhos do ser, sob a
razão da cabeça, quanto mais o meu coração de pena e tintas deseja abrir os
uni-versos de palavras e ritmos, mais notas se a-nunciam dentro em si, quanto
mais ando, tenho de andar mais ainda, sem andar sou é nada, ser alguma cosita
quantas léguas se fazem mister pisar? Para chegar a essas letras aqui
registradas nesse início de Semana Santa e de outros olhares às sementes da
vida e de suas luzes de amor, andei por cinqüenta anos, engatinhando,
tropeçando, arrastando, seguindo em frente, caindo, levantando, acreditando,
desacreditando, perdido e confuso diante das discriminações, pré-conceitos,
invejas e despeitos dos que nada são e ostentam valores insofismáveis, sendo,
aliás, agora o que entendo e compreendo o que são gorgolejos, escarros e
cólicas viscerais, merecedor de ser comemorado, com vinho francês, deliciosa
bacalhoada, com outros sorrisos na face trazidos da sombra milenar.
(**RIO DE JANEIRO**, 13 DE ABRIL DE 2017)
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