#DURMA NA PEDRA O SONO DO NADA# - GRAÇA FONTIS: PINTURA/Manoel Ferreira Neto: AFORISMO
Quiçá o instante seja de visualização - não diria de consciência, pois
que as estradas muitas tem o que real-izar, o que efetivar para esta incólume
expressão - das coisas que por tempos, qual a natureza que ama ocultar-se e
re-velar-se, apresentaram-se e esvaeceram-se num átimo de segundo, deixando nos
olhos brilho intenso, o coração pulsando comedido, no íntimo a vontade de
verbalizar o que intuía, sentir profundo o prazer profundo dos raios de sol
incidirem-se na grama verde respingada do orvalho da madrugada, manhã de
esplendido panorama do vale e das colinas, passeando sereno.
Procriar e evolver eram os pro-jetos, as intenções, nada é possível de
presentificar-se sem esta dis-posíção, sem esta entrega, por vezes até
manifestação de inocência, ingenuidade, mas, se o é, significa dizer seja por
haver vontade de procriação, o conhecimento se faz de procriações e
evolvimentos.
Procriar não é re-fazer, re-construir, re-elaborar, re-ornamentar, para
isto suficiente inspirar no já feito, caído do galho qual as folhas secas no
outono, retrógrado, com toque de magia, a olhos de lince vislumbra-se com
perfeição o objeto que deu origem. Procriar é fazer, é dar a luz. Aquela máxima
"nada de novo há de por baixo do sol" inspira a virar as coisas de
cabeça para baixo, mudar posições, no lugar do céu colocar o mar, no lugar
deste colocar o céu, que coisa mais estranha e esquisita nadar, mergulhar nas
estrelas, no sol, na lua, aquele impeto de alcançar os astros, as constelações,
os planetas nas prefundas. E todos ruminam, uivam a plenos pulmões: "Quê originalidade!
Quê autenticidade! Só um gênio para esta façanha!" Em verdade, em verdade,
trata-se de desespero, de agonia, de angústia, alfim nada pode procriar, não se
pode evolver. E o mesmo com outras tonalidades, perspectivas, ângulos, cuja
reação dos olhos é fecharem-se.
O "Amor" pediu licença, para não ser indelicado, saindo à
francesa, participou sua mudança para fora do mundo, cansou-se de assistir a
tantos despautérios e disparates com os versos e estrofes sobre ele,
definindo-lhe, conceituando-lhe, ao menos se mostrassem com trans-parência
serem frutos de solidão, carência, abandono, tristeza, tão somente nada ser
capaz de procriar, nada ser capaz de sentir. A solidão sempre existirá.
É preciso criar o mundo. Razão, imagem, vontade, amor, eis o que o homem
deve tornar-se. E quem busca o conhecimento, para o sentimento da felicidade.
Se o criador deseja ser ele próprio a criatura, o recém-nascido, então deve
desejar, ansiar, também, ser a parturiente e a dor da parturiente.
Oh, poeta do amor, a criatura você em que céu, em que lua, em que
estrela se esconde; oh, poeta do amor, o recém-nascido você, em que seio suga o
leite que lhe sacia a fome, faz-lhe evolver? Que haverá para criar, procriar,
se ainda não conhece o que é isto - o mundo, se a pintura dele nem em croqui
está? Deixe os versos e estrofes por enquanto! - lembre-se que o amor partiu
para fora do mundo por sentir-se envergonhado, negligenciado, subestimado com o
que está sendo versejado, partiu triste e desconsolado. Crie o mundo, procrie
as contingências, facticidades, ipseidades. O querer liberta - eis a sublime
doutrina da vontade e liberdade. Criatura, mundo, contingência, então tome da
pena e garatuje sonetos, idílios, poemas livres, ao contrário durma na pedra o
sono do nada.
(**RIO DE JANEIRO**, 16 DE ABRIL DE 2017)🎺
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