**ESTIRPES, LAIAS E RAÇAS** - GRAÇA FONTIS: PINTURA/Manoel Ferreira: AFORISMO
Fecho em torno de mim, não são necessárias sete chaves, única é o
suficiente, círculos e sagradas fronteiras. Poucos são aqueles que sobem a
montes, serras, montanhas, picos, cada vez mais altos, cada vez mais difíceis
de fazê-lo; construo cordilheiras de montes cada vez mais sublimes, suntuosos,
sagrados.
Por vezes, quando se fazem presentes o tempo e a hora, circunstâncias e
situações, digo a todos, para onde quer que vá, se desejam, tem vontade de
subir comigo, mesmo se for subir num pau de sebo, tratarem de não levar
consigo, não subirem com eles os capachos, os parasitas, os sanguessugas. Nada
de outras intenções e interesses desta raça, estirpe, laia, bicho rastejante,
senão engordarem à custa de nossas chagas inter-ditas; no pesar e desânimo, na
lástima e insegurança, na ruminação e indecisão, no delicado e acuidado pudor,
no sublime pejo, na divina vergonha, tais homens constroem o seu insustentável,
repelente covil: os capachos são servis exatamente no ponto de o outro
necessitar de reconhecimentos e louvores, aplausos para se justificarem de suas
mentes vazias, corações secos, ele reside nas carências, falhas, faltas, nos
complexos de toda ordem, o parasita mora onde o grande tem suas pequenas
cicatrizes, feridas.
Diante dessas afirmações diretas, radicais, dizeres insolentes,
irreverentes, acredito não haja quem não esteja indagando quem é, para mim, a
espécie mais alta e qual a mais baixa? Na sua indagação, revira os olhos, o
coração pulsa comedido, a pressão sobe pois intui qual será a res-posta irá
ad-quirir, faz um esgar no rosto como anunciação do coelho atrás deste mato,
percebe o hilário, o risível da questão.
Não há como outra coisa res-ponder senão que o capacho é a espécie mais
alta, serve a todos os desejos, projetos, objetivos do outro com interesse de
se lançar, de receber os seus louros, os seus quinhões, os seus réis, mas
também o parasita é baixo; quem é da raça, espécie, laia e estirpe mais alta
sacia a fome e a sede, alimenta a maioria dos capachos e parasitas.
Quem possui a escada com trezentos e sessenta e cinco degraus, como a do
Cristo Redentor no Rio de Janeiro, um degrau para cada dia do ano, e pode
mergulhar mais fundo, está aí a grande questão: como não haveriam de pousar
nela os capachos e parasitas. A alma que tem mais pernas para correr perder-se
nas sinuosidades das veredas e vaguear, devanear incerta; a alma que mais ama a
si próprio, nutre por si uma paixão ilimitada, sem eiras nem beiras, paradoxal.
Capachos e parasitas: ambos servem com propósitos diferentes. Para os grandes
adular os parasitas e capachos tem uma vantagem incólume: viram aos olhos
alheios perfeitos bons samaritanos.
(**RIO DE JANEIRO**, 16 DE ABRIL DE 2017)
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