**SUSCEPTIBILIDADE SUI GENERIS DISSERTANDO MAZELAS DA SOCIEDADE** - TÍTULO E PINTURA: Graça Fontis/ SÁTIRA: Manoel Ferreira Neto
Tudo
isto borrifado de uma inveja, um despeitozinho acre, o doce só se revelará nos
há-de vir dos pitis e barracos armados, mesas viradas.
Bem-aventurados
os jegues que zurram da estirpe em grande estilo e depois dão coices na
própria, de gorjeta na sombra da carroça, porque no Reino de Deus receberão as
graças da laia, estirpe e raça.
Bem-aventurados
aqueles que ostentam suas vaidades falsas, egrégios orgulhos chinfrins, rebolam
pelas ruas e avenidas da cidade, olham de esguelha para os de condutas idôneas,
de baixo para cima para os pobres de espírito e miseráveis de alma, porque
serão esquecidos por sempre, poderão curtir o além sem interferências dos
comentários dos vivos, sem orações e velas aos pés da sepultura de apenas a
cruz com as inscrições tumulares já apagadas.
Bem-aventurados
os medíocres e mesquinhos, porque, no além, cairão na gargalhada altissonante
de suas empáfias de dignos e sérios; verão com primor que foram objetos de
chacota de todos, inclusive dos entes mais que queridos e amados, serviram de
palhaços para as risadas e risos.
Bem-aventurados
os limpos de algibeiras, porque, além de andarem mais leves no paraíso, não as
sujou na terra com as merdas do poder, do orgulho, das finesses dos interesses
e ideologias.
Bem-aventurados
os que nascem finos, prolongam-se finíssimos e morrem de uma finura sem
precedentes, recebendo epitáfio na lápide de mármore mais do que digno dos
amigos, inimigos, íntimos e conhecidos “Nasceu fino, prolongou-se finíssimo,
morreu de finura sem precedentes, um exemplo de dignidade e honra”, porque
gozarão no jardim do éden dos mais finos prazeres e felicidades.
Bem-aventurados
os de finesse pura e inocente, porque além do bem e do mal irão derramar
lágrimas pujantes por haverem engolido
tanto sapo seco, beijando e abraçando a todos com agradecimentos os mais reais
e verdadeiros, presenteando-lhes em todas as ocasiões de sua vida, aniversário,
conquistas, realizações, natal.
Bem-aventurados
os que nascem grossos, porque morrerão finos, criança lhes carregarão o esquife
na cabeça.
Bem-aventurados
os canalhas que palitam os dentes sempre que comem o moral alheio com azeite e
sal, sakura e pimenta malagueta, pingos de limão capeta, porque no inferno vão
conhecer outros pratos mais deliciosos.
Bem-aventurados
os vencedores, porque receberão dos contemporâneos e conterrâneos as
digníssimas batatas com que se alimentarão por sempre, e ainda no paraíso
celestial conhecerão outros cardápios com as mesmas, inclusive sem serem
descascadas.
Bem-aventurados
os vencidos, porque serão objetos de felicidades dos inimigos, pena e dó dos
amigos e íntimos, orações dos homens pedindo a Deus graças para se libertarem,
porque na terra despertou todos para os ensinamentos de Jesus.
Bem-aventurados
os analfas de mãe e betos, porque no Juízo Final não saberão usar única
palavra, e São Pedro irá abrir-lhes as portas, porque não foram maculados com o
sentido e poder das palavras, nasceram
puros, morreram puríssimos.
Bem-aventurados
os súcias que viveram de prazer e felicidades numa sociedade de dúvidas e
angústias, porque na morte degustarão a angústia e desesperos por só o inferno
lhes ser o destino inevitável.
Bem-aventurados
os pobres de espírito, porque no céu serão conscientes da riqueza da alma.
Bem-aventurados
os imbecis de alma e espírito, porque nas algibeiras do além saberão os
efeitos, resultados da imbecilidade sem precedentes em toda a história do mundo
e da humanidade.
Bem-aventurados
os bêbados de cachaça e outras bebidas, porque na paz indevassável dos túmulos
se sentirão sóbrios e lúcidos com o odor fétido do cadáver.
Bem-aventurados
os mentirosos, porque de por baixo da árvore do conhecimento, no paraíso
celestial, curtindo a sabedoria da verdade, a verdade da sabedoria, saberão que
a verdade no mundo era só farsa e interesses escusos múltiplos.
Bem-aventurados
os políticos corruptos, os militares cafajestes, autoridades escusas, porque no
Reino do Céu receberão o troco dos espíritos que foram lesados por eles.
Bem-aventurados
os juízes safados e caguinchos que condenaram e enjaularam os inocentes,
libertaram os criminosos e culpados, porque receberão de Ferlucci sursis por
que os inocentes teriam de conhecer a animalidade da raça humana para serem
merecedores do inferno.
Bem-aventurados
os fracassados, porque na outra vida conhecerão o sentido da vitória máxima do
fracasso da vida na terra.
Bem-aventurados
os “oportunistas da imortalidade”, porque a ausência de suas letras verdadeiras
e dignas não corrompeu os leitores que tinham sede e fome de conhecimento e
verdade, de quem lhes indicassem caminhos outros que não os que sempre
trilharam na vida, e muito os deixaram perdidos, confusos, os desvirtuaram das
esperanças de ressurreição, redenção, da fé na vida, no mundo, na existência,
em Deus.
Bem-aventurados
os cínicos, porque não serão vítimas de contos-do-vigário da verdade absoluta e
perene; ela será objeto de mofa e quem nela crê impiamente será considerado por
eles bobos da corte.
Bem-aventurados
os irônicos, porque duvidarão das boas intenções de que o inferno está cheio,
das más intenções de que o céu está entupigaitado, e quem acredita na redenção
será por eles olhados através do pincenez e com a ajuda de lupa.
Bem-aventurados
os sarcásticos, porque rirão a bandeiras soltas de todas as morais sociais e
religiosas, de salão e relações íntimas; de todos os princípios que edificam,
glorificam o ser humano.
Bem-aventurados
os sátiros, porque em suas penas não passarão batidas as hipocrisias das
crenças e esperanças na conversão das mazelas e pitis dos homens e gerações
desde agora até a consumação dos tempos.
Bem-aventurados
os hipócritas, porque descansarão em leitos de flores no regaço suave e terno
dos túmulos de mármore branco com direito a um epitáfio retirado do Evangelho
de Judas.
Bem-aventurado
o povo que erguer em praça pública bustos de bronze de todos os que desonraram
seus princípios e dignidades, pois que em breve, brevissimamente, conhecerá os
prazeres que viveram os homens de Sodoma e Gomorra.
Bem-aventurados
os secretários de cultura que mostrarem às comunidades o caminho irreversível
para a insanidade ou para a perda do senso de vida e relação entre os homens é
assimilá-la a critério, e também que a cultura é prejudicial aos interesses de
uma comunidade digna de reconhecimento.
Bem-aventurados
os escritores que defendem a unhas e dentes as ideologias dos poderosos, e
condenam as esperanças de conhecimento e verdade, porque suas letras serão
húmus da mesmidade ideológica em todos os tempos.
Bem-aventurados
os tablóides sensacionalistas, porque eles não deixam as merdas da sociedade
sejam esquecidas, os leitores precisam saber das sensacionalidades para
cantarem no poleiro de conhecedores da história de seu tempo.
Bem-aventurados
os traficantes de drogas, porque contribuem para a concretização do
Apocalipse.
Bem-aventurados
sois todos estes, quando vos injuriarem e disserem todo o mal que re-presentam
no mundo, são na vida e existência, por meu respeito, por minha consideração e
reconhecimento.
Folgai
e exultai todos vós identificados nestas páginas de sabor clássico (?) com amor
e carinho sem limites e precedências, não por ser humano e compreensivo,
entendo e bem a natureza e condição dos homens de todos os séculos e milênios,
desde os primórdios até a presente data, não sei o dia de amanhã, peço a Deus
que não mo re-vele, compreendo os instintos, mas porque sei a vida mesma, em
sua plenitude terrena e contingente, é deles, é o bom senso da modernidade;
além disso, porque o vosso galardão é engenhoso e copioso na terra; não haverá
único homem que conteste, duvide, desconfie, fique em cima do muro sem saber se
desça ou permaneça nele, todos em uníssono e em vozes altissonantes irão
endossar com caligrafia nunca dantes vista ou imaginada.
Não
julgueis que venho acabar com raça da ralé da humanidade, mostrar-lhe o que lhe
espera no além, no inferno ou no céu, no espaço sideral ou no buraco negro,
venho para lhe glorificar, enfiar-lhe na cabeça a tiara de que são merecedores,
enfim “a posteridade é a vingança dos que sofrem os desdéns do seu tempo”,
porque o que seria do mundo sem eles, enfim precisamos todos de diversão e
entretenimento, precisamos de matéria viva para as fofocas e censuras, para nos
justificar de nossas condutas espúrias, sentirmo-nos os supra-sumos das criaturas
de Deus.
Não
acrediteis em comunidades depravadas. Em verdades vos digo que todas têm
condições de remendo, e se não for com remendo com o mesmo tecido, será com outro que se lhe
assemelhe.
Jesus
pediu a todos os homens que amassem uns aos outros como Deus os ama a todos.
Pois eu vos digo com empáfia: Comei-vos uns aos outros; mais interessante e
esplendoroso é comer do que ser comido; o fígado alheio é muito mais apetitoso
que o próprio; o rabo alheio é muito delicioso que o rabo mesmo; o bofe alheio
é mais nutritivo que o próprio bofe.
Também
foi dito aos homens: Não matareis a vosso irmão, nem a vosso maior inimigo,
capital ou congênito, para que não sejais castigados nem sejais encontrados
mortos nalgum terreno baldio da periferia da cidade pelo seu maior amigo ou
ente mais que querido. Digo-vos que não é preciso matar a vosso irmão para
ganhardes o reino da terra; basta tirar-lhe o último tostão que lhe permitiria
um “prato feito” num botequim copo-sujo.
Nunca
jureis a verdade plena e absoluta, porque esta verdade, além de imoral e
indecente, é carne de pescoço ou músculo, duras de mastigar e serem digeridas
com facilidade; jurai sempre e a propósito de todas as coisas, porque os homens
foram criados para crer antes nos que juram falso, do que nos que nada juram.
Políticos,
se vós estiverdes fazendo as contas do que conseguistes tirar dos vossos
leitores em toda a vossa gestão, e vos lembrardes que o povo anda meio
desconfiado de vossas altas finanças, interrompei vossas contas, saís de casa,
ides ao encontro de vossos eleitores na rua, restitui-lhes a confiança, e
tirai-lhes o que eles ainda levarem consigo para construirdes a vossa
mansãozinha na Soares do Santos, de preferência bem próximo do Hospital
Imaculada Conceição.
Não
roubeis na cara da comunidade porque ela pode ir contar à polícia, e aí as
conseqüências serão funestas, além de não mais poderdes no próximo pleito serem
eleitos, sereis sempre lembrados como ladrão cara-de-pau. Se tiverdes de roubar
para ostentar a tradição dos políticos, roubai às escondidas, e muito, para que
não passeis para a história como ladrãozinho barato, ladrãozinho de pratinho de
mendigo esfomeado.
Quando
quiserdes tapar um buraco, entendei-vos com um sujeito engenhoso, um verdadeiro
artista, que faça dez de três e quatro.
Não
quereis jamais guardar vossos bens materiais na terra, onde a ferrugem e as
traças, baratas, ratos os consomem, e donde os ladrões os tiram e levam.
Levai-os dentro do caixão, enfim ninguém nunca os levou para a sepultura, só o
caixão os levou para lá.
Jamais
fieis em ninguém. Em verdade vos digo, que cada um de vós é capaz de comer o
seu vizinho num prato de louça bem chic, de garfo e faca de prata, com todas as
etiquetas, e boa cara não quer dizer necessariamente bom negócio.
Vendei
sempre gatos por lebres, as lebres estão em extinção, os gatos soltos pelas
ruas, e ações ordinárias por excelentes, a fim de que a terra se não despovoe
das lebres, nem as péssimas ações pereçam nas vossas mãos.
Não
julgais para não serdes julgados; não examineis as finanças dos outros para que
as vossas não sejais examinadas com maior perspicácia e acuidade, e não resulte
os dois irem ver o sol nascer quadrado, quando é melhor ninguém o ver assim, o
esplendoroso é que ele seja bem redondinho e emita os seus raios com
transparência e nitidez.
Podeis
excepcionalmente amar a um homem que vos tirastes da sarjeta e vos destes uma
cadeira giratória nalguma repartição pública, uma mesa cheia de deveres,
responsabilidades, compromissos os mais diversos; não até o ponto de o não
deixar com as cartas na mão, se jogardes juntos o pôquer dos poderosos.
Todos
aqueles que ouvem e lêem estas minhas palavras, nestas páginas de sabor
clássico (?), e as observam com perspicácia, vêem-lhes as entrelinhas com
transparência e inteligência jamais imaginadas em todos os livros da
humanidade, serão comparados e reconhecidos, considerados e respeitados como
homens sábios, que edificaram sobre a rocha e resistiu aos ventos e
tempestades, tsunamis; ao avesso do homem sem consideração, que edificou sobre
a areia, e fica a ver navios por toda a eternidade até a consumação dos
tempos...
Aqui
acaba a minha mensagem que inventei especialmente para declamar, discursar em
eventos públicos, recitar nalguma tribuna, antes de dormir o meu sono de homem
justo, de quem sempre se preocupou com o destino da ralé da humanidade. Apesar
de tudo, irmãos e irmãs em Cristo, não res-pondo pelo papel, nem pelas
doutrinas e teses que nas entre-linhas estão re-presentadas, nem pelos
equívocos de linguagem e estilo que porventura haja cometido, enfim nada pensei
e senti enquanto estive a elaborar esta mensagem para a salvação e ressurreição
da ralé da humanidade, não significando o meu desejo seja de se converterem,
mas que tenham certeza e convicção de que merecem consideração e respeito dos
homens idôneos de caráter e personalidade, em primeira instância manuscrito
numa mesa de botequim, depois em caráter oficial os dedos de ambas as mãos
deslizaram rápidos nos digitos do computador. Só agora é que vou ler, ver e
sentir o que está registrado nestas quase três páginas de sabor clássico
(?).
(**RIO
DE JANEIRO**, 08 DE JANEIRO DE 2017)
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