Ao Caríssimo Escritor, Manoel Ferreira Neto
Vós não tendes noção com que satisfação, alegria recebo a vossa
correspondência, acompanhada a missiva com a crônica **REFUTAM-SE SAUDAÇÕES
HIPOTETICAMENTE CÍNICAS E HIPÓCRITAS**! Se não me falha a memória faz três anos
que perdemos o contacto, vós que me escrevíeis assiduamente. Explicais-me com
sinceridade as razões que vos levaram a interromper as nossas relações, bem as
compreendi e entendi, mas a amizade por mim nutrida em instante sequer deixou
de ser revelada através de lembranças, recordações.
Bem, tomei da pena para vos responder com intenção exclusivíssima de
comentar a respeito da sátira. Aliás, não me era dado saber enchafurdades na
sátira, com todas as pompas e méritos; a sátira simplesmente desapareceu das
estantes de livros nas livrarias, os sátiros não os há mais. Reverencio-vos com
toda a honra e dignidade, dizendo-vos que continueis nesta estrada das
crônicas, das sátiras, frutos polposos e pomposos ireis recolher.
Em primeira instância, refiro-me à caricatura de pintura da
artista-plástica Graça Fontis que tão de excelência ornamenta a vossa
"crônica", traços perfeitos, o cantor sentado com o violão em mãos,
reflete a imagem de um "sonhador", aquela viola representa o seu
sonho de liberdade e consciência, a sua voz, a sua arte de tocar violão são os
instrumentos de busca, e quer compartilhar esta busca com os homens e
indivíduos, e com que garra, com que entrega, com que determinação, o olhar
mostra os olhos, com que impeto vislumbra e con-templa. Perfeita a
"caricatura" para a vossa crônica. Mande-lhe, a artista-plástica,
Graça Fontis, os meus sinceros cumprimentos pela sua sensibilidade artística.
Embora o violão esteja presente na obra, mas a vossa escritura revela
muito mais. Fiquei intrigado da realidade do encontro com a pessoa, o seu cumprimento
falso, fingido, simulado, dissimulado, e vós começais aí os questionamentos
mais profundos sobre a futilidade da vida quotidiana, muito real. Foi inspirado
em algum escritor, cantor, compositor. Mas quem?
Digo-vos honradamente que levaram-me três dias de muitas ansiedades,
angústias, aquela sensação voluptuosa por uma expectativa tornar-se realidade.
Lembrou-me, então, que, naqueles velhos tempos em que acompanhados de alguns
amigos frequentávamos o Restaurante Sem mão, na Alameda Santos, próxima à
avenida Paulista, São Paulo. Vós amavas de paixão a música de Bob Dylan
Positively Fourth Street, em cuja lírica alguém cumprimenta alguém, e este
alguém passa a questionar mentalmente a hipocrisia daquelas pessoas e
indíviduos da 4 Rua de Nova York, a hipocrisia mais deslavada. Ouvindo a
leitura através dos sons das palavras, o ritmo da linguagem e estilo se revela.
Vós pedias ao garçon que colocasse esta música primeiro, antes das conversas
com os amigos, daí qualquer música seria bem-vinda. Sempre vós foreis
apaixonado pela música, e através delas amava as intrigas, os deboches,
mangofas, micos, inteligentes e venenosos, inclusive pedia-vos encarecidamente
que fizesse menos nas críticas interditas, nos deboches, as pessoas não estão
preparadas para estas relações tão abertas, que me ouvíeis com todo respeito e
carinho; nas letras, poderíeis fazer as pessoas dançarem em chama quente,
dormir na Antártida a céu livre, pintar e bordar, mas não no quotidiano das
relações.
Contudo, caríssimo amigo, apesar disto que acabei de dizer, isto é de
sua vivência pessoal, não sabendo eu de quem se trata, ficando a seu critério
não mo dizer. Acredito que não o dirá a ninguém, um segredo de "alcova
eterna".
"Quem me dera estivesse aí em San Petersburgo, curtindo as noitadas
nos restaurantes, na vossa Coluna de Jornal, no quotidiano da vida. O sonho do
intelectual, alfim, se realizou", como me disséreis na vossa missiva.
"Teríamos tantos assuntos para conversar. Embrenharmo-nos nas sátiras e
crônicas na vossa coluna, mas fico feliz por vós." E, no entanto, estou
aqui pelas terras do Rio de Janeiro, como crítico literário, escrevendo em
alguns jornais de comunidades, on line, as minhas sátiras e crônicas. E tenho o
prazer de vos informar que acabo de fazer um Prefácio no estrangeiro, desta vez
na Inglaterra, antes foram dois em Portugal. Envio-vos autografado um exemplar.
Quanto à crônica em si, só tenho a vos parabenizardes pela excelência de
crônica, num simples "Bom dia", revelar a arte da hipocrisia entre os
mortais e imortais. "Meus sinceros parabéns pela crônica, e mande abraços
à sua companheira pela excelência de caricatura, pelo título tão sarcástico e
irônico, o cinismo é de vosso texto."
Abraços, caríssimo escritor.
Fomá Fomitch
(**RIO DE JANEIRO**, 16 DE JANEIRO DE 2017)
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