(TESE) - EFÊMERO E O NADA - ENSAIO POIÉTICO DOS CAMINHOS DA LUZ - Manoel Ferreira
IV CAPÍTULO - O NADA E A ARTE LITERÁRIA
4.6
- KATHARSIS ENTRE O POETA E O EU
POÉTICO
"Na busca pelo
Belo poético tem de haver, então, a Katarse entre o poeta e o “Eu
poético”:" (Rita Helena Neves)
A existência humana, lugar da
existência poética, é essencialmente trágIca porque está em tensão entre um
dado irredutível e uma exigência de superação nunca satisfeita, dividida entre
o apelo da terra e o do mundo. O homem "humaniza" a terra antes de a
dominar e o horizonte que ele des-vela para a penetrar é o mundo. A re-flexão
filosófica é precisamente o pôr em diálogo estes dois polos complementares da
existência que, numa experiência única, se des-cobre ao mesmo tempo enraizada
na terra e que se supera para o mundo. Chama-se "trans-cendência"
este processo original. Levar a terra à eclosão de um mundo, tal é o gesto
fundamental da existência, Tarefa eminentemente poética, não só porque se
efetua por meio de imagens e de mitos que constituem os traços dessa
re-conquista incessante da terra pelo mundo, mas sobretudo porque é obra do
homem que por todo o seu ser, pela sua inteligência, pela sua ação, numa
palavra, pela sua presença, faz surgir (poiein) o mundo. Tarefa necessariamente
trágica porque não chega a preencher a separação ontológica que afeta a
estrutura do homem, ese "ser da distância".
Quando Aristóteles escreveu sua
Poética, a tragédia já acontecia há muito tempo e os poetas já haviam realizado
seus espetáculos agindo com eles sobre a polis e influenciando-a através de
inúmeros e variados "efeitos poéticos"
Tomemos a tragédia como um método
paradoxal de se construir o saber filosófico, porque o faz atraves da
exploração de recursos questionáveis para o que, hoje, chamamos
científicos(sentimentos, provocação de emoções e utilização da ilusão).
Da parte do poeta, a exploraçao de
recursos filosóficos, políticos e poéticos fazem-se experimentar a Kátarsis
criativa. A obra de arte criada há-de se erigir a partir do conflito e da busca
do equilíbrio entre razão/pensamento e emoção/sentimento/experiência. O poeta,
segundo Aristóteles, deve colocar-se como espectador e passar por todas as
experiências produzidas em sua composição.
Aristóteles afirma que o
"pensamento" do poeta deverá suscitar emoções equiparando o discurso
político (analisado na Retórica) com o discurso poético. Contudo, Aristóteles
evidencia a diferença de um e de outro: na poesia não há explicação da
situação, cada espectador terá a sua liberdade de interpretação.
Da parte do espectador, que experimenta
a Kátarsis Contemplativa, cumpre aceitar que um outro lhe traga uma carga de
indefinição com a qual será preciso, pelo menos na circunstância do drama,
conviver. Ele deve se entregar aos raciocínios e paixões que o poeta propõe e,
a partir deles, lidar com o seu próprio imprevisível, com suas regiões mais
obscuras e misteriosas, que irão possuí-lo por completo no devir da cena para levá-lo
à Kátharsis, que, objetivamente entendemos aqui como resultado da vivência do
temor e da compaixão em todas as suas possibilidade, nada mais que isso.
No sentido que entendemos a Kátharsis
entre o poeta e o "eu poético"... O desafio do Pensamento é a
identifidade. O difícil não é pensar muitos pensamentos. O difícil é pensar
sempre a identidade do Pensamento em tudo que se pensa. A profundidade e
dinâmica desta identidade é o vigor de um pensamento. O nível de um pensador
não se avalia pela extensão de seus temas. A originalidade de um pensamento não
é a novidade. É a originariedade com que a-colhe e re-colhe o apelo de futuro
de uma tradição histórica. Neste sentido um pensamento original não dá
interpretações nem propõe teorias. O apelo do poeta impele o pensamento não a
sair mas a penetrar cada vez mais em sua causa, reconduzindo-se sempre ao
mistério de sua fecunda identidade. O
poeta procura recolocar o pensamento no elemento de sua essência.
O poeta é divino; na sua palavra, uma
lingua nasce para a sua própria possibilidade de dizer a verdade do ser. Este
impronunciado guia o pensador que ascende da significação vulgar e degradada
das palavras até às palavras privilegiadas pelas quais uma lingua determina a
sua experiência da verdade do ser.
O "eu poético", que habita o
poeta, ganha e traduz as coisas No silêncio, a vida do espírito é guardada, e
assim, o "eu poético" na sua viagem ao In-finito, con-templando a
paisagem do espaço poético, é plen-itude e presença, revestindo-o de espaço
interno, esse espaço que tem seu ser em si, criando, re-criando os verbos do
espírito à busca do Ser, da Verdade.
Então, neste sentido em que expomos a
Kátharsis, o poeta é o espectador do "eu poético", o "eu
poético" se re-vela na tragédia do nada, nascendo a busca do In-finito.
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