#AFORISMO 876/ LIVRE, SOU SÓ; SÓ, SOU LIVRE"# - GRAÇA FONTIS: PINTURA/Manoel Ferreira Neto: AFORISMO
Palavras não existem por existir, à toa. Têm o seu sentido, servem aos
instantes, situações da vida. Algumas são bem difíceis de pronunciar com a
verdade no riste da língua. São postergadas, por vezes. A vida fá-la ser
pronunciada, o seu sentido seja vivido, embora a dor esteja presente, e mesmo
que o tempo a amenize, jamais se é possível esquecer o momento da pronúncia, os
sentimentos que perpassavam a alma.
Cinco letras apenas. Pronunciei. Mesmo que não tenham sido ditas,
faladas - numa mensagem registrei-as. Olhei-as, con-templei-as escritas. O
peito insuflou-se com a dor. Para não senti-la ainda mais forte, para não vê-la
sozinha na mensagem, ainda registrei "Um grande abraço". Sabia este
momento iria acontecer, teria de estar diante da verdade, da situação, cara a
cara, frente a frente. Intuí e imaginei os sentimentos, as emoções que me
pervagariam. Não foram tão diferentes do intuído, imaginado, o que não intuí e
imaginei direito foi a dor. A dor é imensa... O tempo amenizará, mas os
sentimentos jamais serão olvidados. Estarão guardados num cofrezinho da
memória, especial. Lembranças, recordações estarão presentes.
Dizer: "A vida é assim" parece-me ridículo, vulgar demais,
além disso negligencia os sentimentos, que são verdadeiros e reais. Direi:
"Estava escrito nas estrelas que iria acontecer. Era necessário assim
fosse". Assim terei oportunidade de projetar os tantos sonhos que se
a-nunciaram, re-velaram, o desejo de vê-los real-izados, vê-los no quotidiano
das alegrias e felicidade da conquista. Sê-lo-ão como se houvesse sido no
outrora deste instante ou instante de daqui a algum tempo. Sentirei em mim
felicidade dupla, a do passado como se houvesse sido lá, a do presente por não
haver esquecido, haver-lhes guardado com carinho e amor para o tempo do
acontecimento, tudo tem o seu tempo devido.
Não me faço promessas, ao longo da vida a realidade se mostra outra, o
real é diferente, não há mais sentido real-izá-las. Determino que vou fazê-lo.
Não vou deixar que o homem em mim morra, não vou con-sentir que a busca da vida
e dos sonhos acabem aqui e agora, siga com a dor em mim, o sofrimento envele o
que me habita, o que há em mim, o que há-de vir. Prometi isso, determino a mim.
Palavrinha difícil... Difícil é simples para defini-la no instante de
sua realidade inevitável e indevassável. "A d e u s". Separo-a para
con-templá-la, senti-la presente não na sua realidade de palavra, mas no
sentimento que ela faz ec-sistir. Dizem que o sentido dela não existe -
acredito nisso, faço-o por saber os sentimentos e emoções estarão presentes por
sempre. Mostrando a realidade em todas as situações, circunstâncias é para
sempre, o "adeus eterno", aí não há como não ter o sentido que tem,
que traz em si mesma, significa que não haverá condições de viver o vivido,
mesmo com as suas diferenças.
Vivi as alegrias, vivi a felicidade, conheci outros sonhos, con-templei
outros horizontes, vislumbrei outros uni-versos, ainda mais profundo que isso
vi a vida sendo modificada, transformada, fui a cada passo dos caminhos me
tornando outro, o outro de mim que estou vivendo agora, transformasse-á,
modificar-se-á nas trilhas de veredas e sendas do que há-de vir. Aconteceu para
ser "outro", o "eu" já não significava nada, estaria apenas
no prolongar dos dias, ao redor o abismo, à frente o nada. Outro vou
pro-jetando a vida, buscando-a, vou construindo as conquistas, vou sentindo a
alegria e a felicidade delas, em mim não o agradecimento formal, mas a emoção
sublime e sensata de "Sou feliz hoje, tenho a vida nas mãos feitas conchas;
não pude com-partilhar, mas realizei, está compartilhado no espírito".
Noutros momentos da vida, tomei da pena, diante de dores e sofrimentos,
e registrei a alma, deixe-a dizer-me, deixei-a expressar, ser ela não eu,
escrevesse-me, escrevesse-a, senti-me melhor, continuei a seguir as trilhas,
jamais os esqueci. Escritos, ficaram inscritos na memória. Digo à minh´alma com
toda a sensatez de caráter e personalidade, sensibilidade: "Não fosse você
haver-me escrito, o que seria de mim hoje?". Não há resposta, tudo o que
disser neste sentido serão apenas meras fantasias ou elucubrações ridículas e
medíocres. Mas há uma realidade a ser considerada na sua essência, haver sido
escrito mostrou-me o vazio não haver sido instituído vez por todas, esvaziei-me
nas letras, preenchi-me de outras experiências e vivências, amadureci-me.
Disse "adeus"... Sinto a tinta sendo registrada na folha
branca de papel, sendo o movimento da mão desenhando a letra, letra cursiva, em
verdade GÓTICA pelos seus traços. Nada seria esquecido. Não esqueço o eco que a
palavra deixou em mim, a caneta e a tinta não esquecerão também por haverem ...
o movimento contido da mão como se elas é que houvessem sido as dores e os
sofrimentos.
Às cavalitas do tempo as sendas e veredas mostram os horizontes e
uni-versos à frente, chegar lá é mister e imprescindível.
Ser feliz con-sente a solidão do ser e a solidão do ser con-sente a
liberdade. Só, sou livre; e livre, sou só.
(**RIO DE JANEIRO**, 18 DE JUNHO DE 2017)
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