#AFORISMO 883/ TAMBÉM DEUS TEM O SEU INFERNO# - GRAÇA FONTIS: PINTURA/Manoel Ferreira Neto: AFORISMO
Preencher as frestas, frinchas, buraquitos do inferno faz-se com
verdades selecionadas. Por que o inferno dos proscritos, hereges, nômades,
peregrinos, vagabundos não necessita de verdades selecionadas a preencher-lhes?
Quiçá por se sentirem completos, perfeitos. No inferno, as verdades perdem o
sentido, significado.
Completar as lacunas, falhas, vazios do paraíso celestial faz-se com
in-verdades, dogmas, preceitos estabelecidos em leis.
Por que o paraíso celestial dos hipócritas, dissimulados, viperinos,
falsos é apregoado solenemente com as mentiras do caráter, personalidade, e
seguido por rebanhos? Quiçá por a transgressão dos valores e virtudes ser-lhes
o alimento dos instintos, e são eles que garantem a vida. No paraíso celestial,
os instintos tornam-se espírito, e o Poderoso Chefão vangloria-se de sua
misericórdia.
Construir, instituir os princípios éticos, morais, virtudinosos que
estipulam a grandiosidade do ser humano, que endossam a imperfeição ser
susceptível à perfeição, requerem a liberdade, reivindicam a consciência de
existir ser fazer o homem à luz do eterno. Por que a nata fina dos homens,
juízes, advogados, professores, políticos decantam os seus interesses e
ideologias de tudo ser permissível, as leis e o saber assinam com distinção. Quiçá
por lhes faltar sensibilidade, por lhes ausentarem emoções e sentimentos. Na
morte, tudo é olvidado, todos são santos.
Acumular conhecimentos, distinguir alhos e bugalhos, separar as massas
das maçãs, que revelam a inteligência humana, pedem entrega, dedicação, e são
sujeitos à continuidade do tempo, fazerem-se, desfazerem-se. Por que as
tradições subestimam tais sementes da espiritualidade, tais húmus da
racionalidade? Quiçá por serem frutos insofismáveis de outras visões-de-mundo
que mostram toda tradição é venenosa, toda tradição é perniciosa, toda tradição
é alienante.
Amar o outro como a si mesmo, solidariedade, compaixão re-velam a
sublime face da humanidade do ser, manifestam o ser "humano". Por que
amar é tantas coisas, de "amar é..." o lotação do inferno está
esgotado, a tinta da caneta dos poetas acaba em segundos, mister outra, outra,
consecutivamente, e são infelizes no amor, o outro é o re-verso da moeda da
honra, sensatez, dignidade, o outro é a pedra no sapato? Quiçá por os tempos serem
outros, tudo isso seja válvula de escape da realidade, do real, e se insistem
com a farsa é para adquirirem a redenção, a ressurreição, depois da morte para
onde irem, em que freguesia vão cantar?
Também Deus tem o seu inferno, e o seu inferno é a estultície dos
homens. Como um Ser Perfeito pode ser Pai Eterno de um rebanho de
"maledetos"?
(#RIODEJANEIRO#, 19 DE JUNHO DE 2018)
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