#HOJE# FORÇA INQUIRIDORA DE EXPRESSÃO# - GRAÇA FONTIS: PINTURA/ARTE ILUSTRATIVA/Manoel Ferreira Neto: MINI-ENSAIO ENSAÍSTICO
Não sinto o medo próprio de meu
caráter meigo e reto, ao me encontrar em choque com a sociedade e em contato
com um acontecimento que transcende das regras ordinárias, nem estou, como ela,
pressuroso por me reintegrar na vida quotidiana, às trivialidades das situações
e circunstâncias.
Assim início, caríssima escritora,
poetisa, pintora e escultora, Graça Fontis, a minha resposta ao seu fantástico
poema #HOJE#, e me inspirei neste excerto para as minhas considerações
sensíveis, lendo-o com os linces do olhar: "... sim força inquiridora da
expressão/Solta retendo instantes/Entre consciência e o inconsciente/Na
elaboração/Da tela/Tridimensional/Do momento,/Do Ontem,/Hoje e amanhã/Ave recém
liberta./" Força inquiridora que, lidas em si mesmas as palavras, são os
desejos do conhecer a palavra, re-velar o que em si traz dentro, a inquirição,
mas o sentido a ser lido é o "eu poético e prosaico", as inquirições
ão as indagações da estética e ética da consciência.
Não sinto a melancolia que pro-jectei
criar para mostrar irreverência com as mesmidades dos valores culturais,
hábitos e costumes, liberdade e consciência estética, enveredando-me pelas
co-tangências mundanas.
Minha posição atual, de momentânea
felicidade, dá-me um prazer selvagem como se colhesse uma flor de estranha
beleza, des-abrochada em lugar desolado, ao sabor do vento. O segredo, enquanto
assim possa ser chamado, mantém-me numa espécie de encanto, numa solidão entre
os homens, num afastamento tão completo como o de um abismo no meio da serra, o
de um túmulo no centro da pracinha principal de uma cidade interiorana
qualquer.
O mundo me parece estranho, mau e
hostil. O meu passado, solitário e obscuro. O futuro, uma tristeza informe que
devia modelar em formas sombrias.
Transponho o limiar da porta,
trazendo esperança, calor e alegria. O momento amargo transforma-se, logo, num
momento ditoso.
O mundo deve todo o seu progresso a
homens infelizes. Os felizes confinam-se dentro de moldes antigos, retrógrados,
moral e ética perpétuas. No transcorrer de uma simples vida humana criar algo
absolutamente novo é motivo de indignação de todos que juraram pelo caráter
gradual de toda evolução: não são apenas lentos, mas exigem lentidão. Tenho o
pressentimento de que, daqui por diante, a minha missão será plantar sementes
de outras árvores, fazer cercas, e, talvez mesmo no tempo oportuno, construir
uma casa para outra geração, e, numa palavra, conformar-me às leis e aos
costumes tranquilos da sociedade. Meu equilíbrio será mais poderoso do que
qualquer tendência oscilatória da minha parte.
A força inquiridora da expressão, o
pensar e sentir as coisas, dar-lhes nascimento, sendo esta a trilha escolhida
nas letras, poesia e prosa. "Não serei página amarela/Na noite/Ou/Razão
abstrata das palavras..." "O agora/Na interpretação/Das
solidões/Apaziguando entendimentos"
Nesta hora tão cheia de medos e
dúvidas, opera-se o milagre sem o qual toda vida humana é um vácuo. A benção,
que torna tudo verdadeiro, sagrado e belo, desce sobre mim.
Tudo fala, nada se real-iza a
contento. Tudo cacareja, mas quem em sã consciência deseja ficar sereno no
ninho chocando ovos? Pode alguém repicar com sinos a sua sabedoria: os camelôs
lhe cobrirão o som com o tinir das moedas!
A face rígida e estranhamente branca
recusa-se a desaparecer nesse dissolvente universal, nesse solvente
con-tingencial. A luz torna-se cada vez mais desmaiada. É como se outro punhado
de escuridão tivesse sido espalhado pelo ar. Agora, o ambiente não é mais
cinzento, porém negro. Ainda há uma luminosidade demasiada na janela, que,
entretanto, não deverá ser tomada como uma incandescência, clarão ou vislumbre;
aliás, termo algum por que se denomina a luz servirá para o caso, senão essa
percepção duvidosa de que há uma janela.
Frente à janela, campos lavrados e
prados ondulantes; mais longe, as montanhas escuras e misteriosas, plantadas
nas florestas. Além dessas, sombrias, ainda, desenham-se outras e mais para
longe, bem no alto do horizonte, sempre bela e sempre mutável, sempre a jogar
com a luz como o diamante, ergue-se a serrania das neblinas eternas.
Devo, pois, constantemente traçar
caminhos novos, não importa em que direções. Mas é talvez por causa disso,
precisamente, que tenho por vezes desejo de escapar pela tangente, fugir pelos
senos e co-senos da lerdeza e da perspicácia, precisamente porque estou
condenado a traçar um caminho e também porque, por estúpido que seja eu, por
boçal que seja eu, adivinho por vezes que toda estrada leva sempre a alguma
parte, e que não é a direção que importa, mas o próprio fato de que a palavra
lhe con-duz para um lugar qualquer.
Receio a luz demasiado clara: por
isso me resguardo de meu tempo, e do “dia” desse tempo. Nisto é como uma
sombra: mais o sol se põe, maior eu fico. Quanto a minha “humildade”, assim
como suporto o escuro, suporto também uma certa dependência, um certo obscurecimento,
um certo acomodamento: mais ainda, temo ser incomodado pelo raio, recuo ante a
desproteção de uma árvore só e abandonada, na qual toda intempérie descarrega
seu mau humor.
Começo de perguntar se esta procura
desvairada da pureza, do sublime, da purificação, não vai dar, em verdade, em
alguma brancura sinistra e misteriosa, irrespirável. São agora as palavras que
parecem violar uma proibição. Nivelando esse passado ao presente num paradigma
que me remisse de todos os enganos, erros, de todos os pecados cometidos.
Apagando as desilusões, reparando preconceitos e injúrias, re-plantando
alegrias e plenas realizações. Descubro a imagem da sagração, sacralização, e
da renúncia. Sim, de certo modo, a arte sempre se serve a si; ignoro quando
servi verdadeiramente a uma Transcendência, e isto me cobriu de orgulho e
alegria. Propriamente recordo e não conto.
Ainda uma certa perspectiva de ironia
em que a intenção imediata se corrige, em que o espírito e intuição se erguem
desde o próprio sentir ao sentir de mim, uma certa bússola sarcástica em que a
inspiração da "humanidade do ser" se eiva dos ventos rebeldes e
irreverentes que vem do sul, ao derredor da colina. De novo os homens erguem
uma harmonia de sentimentos e emoções, coroada de eternidade; de novo uma
vereda sinuosa de águas subterrâneas lhes escapa a segurança.
Se ao seu poema respondo-lhe com as
minhas condutas e posturas, como que palmilho os instantes de criação e a vida
quotidiana, é que HOJE reflete uma inquirição excelsa: quais os caminhos a
serem trilhados para a comunhão da Arte e da Vida?, isto o tempo lhe dirá,
forças para isto trá-las no seu âmago.
Não se expõe ao que lhe achata. Todos
os segredos das almas deverão vir à luz, ao sol, à lua, às estrelas; e quando
estiver deitada ao sol, oh, homens, revolvidos e dilacerados, também a mentira
haverá deixado a verdade. "Aos vãos sombrios/Jamais voltando", às
orlas futurais do mar sentando-se e contemplando a imagem das águas e infinito.
(*RIO DE JANEIRO**, 28 DE ABRIL DE
2018)
#HOJE#
GRAÇA FONTIS: POEMA
Fala-se tanto,
de tantas
Falo não!
Não me exponho
Ao que me achata
Nem a oitavas
Ou mais
Minhas notas
São precisas
No tempo...
No relógio
Na madrugada
No vadiar d´alma
Sedenta no corpo fértil
Nas noites
Semeaduras
Manhãs floradas despertam.
Se digo algo?
Só o que me apraz
Dor, angústias, sofrer
A abóboda já vergou-se
Mais cabeça do vento
De norte, sul adjacentes
Botas de ferro
Nas curvas da forma física.
A mim...
Não atingireis
Não serei página amarela
Na noite
Ou
Razão abstrata das palavras,
Mas sim força inquiridora da
expressão
Solta retendo instantes
Entre consciência e o inconsciente
Na elaboração
Da tela
Tridimensional
Do momento,
Do ontem,
Hoje e amanhã
Ave recém liberta.
O agora
Na interpretação
Das solidões
Apaziguando entendimentos.
Aos vãos sombrios
Jamais voltando.
(**RIO DE JANEIRO**, 28 DE ABRIL DE
2018)
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