//**O NADA E A ARTE LITERÁRIA - I PARTE - LUZ DO VERBO DO SER POÉTICO**// - Manoel Ferreira
Os poetas nos levam com frequência entrar no mundo das algazarras,
barulheira dos impossíveis, de uma impossibilidade tal que bem os podemos
rotular de quimera sem interesse. Sorrimos e passamos, olhamos de esguelha. E,
entretanto, muitas vezes, o poeta não tomou seu poema como um jogo, pois que
há-de existir ternura, singeleza, carícias nas imagens.
Tais imagens devem, ao menos, ser tomadas em seu ser de realidade de
expressão. É da expressão poética que é tirado todo o seu ser, a expressão
poética habita no In-finito sob a luz do verbo do ser poético, a realidade de
expressão se revela no espaço poético do In-finito. Diminuiríamos seu ser se
quiséssemos relacioná-las com uma realidade, mesmo uma realidade psicológica ou
mesmo uma realidade que o nada trans-literaliza na sua contingência
intencionando a trans-cendência. Elas dominam a psicologia. Não correspondem a
nenhum impulso psicológico, afora a pura necessidade de exprimir, num lazer do
ser, quando se escuta na natureza, tudo o que não pode falar, assim o inaudito
se revela.
É supérfluo que tais imagens sejam verdadeiras. Elas são. Têm o absoluto
da imagem. Ultrapassaram, trans-cenderam o limite que separa a sublimação
condicionada da sublimação absoluta.
Mas, mesmo tomando em consideração a psicologia, tendo-a como pedra de
toque, uma trans-ferência das impressões psicológicas à expressão poética é,
por vezes, tão sutil que somos levados, tentados a dar uma realidade
psicológica de base ao que é pura expressão.
Como os grandes valores do ser e do não-ser são difíceis de situar!
Estivéssemos situados na con-ting-ência, no nada, talvez pudéssemos situá-los
através do efêmero, mas a poesia é trans-cendência. O silêncio, onde está sua
raiz - o silêncio é dimensão do In-finito, é parte integrante nele, habita-lhe
-, é uma glória do não-ser ou uma dominação do ser? Ele é "profundo",
profundidade abissal. Mas onde está a raiz de sua profundeza? No uni-verso onde
rezam suas preces as fontes que vão nascer, ou no coração de um homem que
sofreu, sentiu dores inestimáveis assistindo os efêmeros desembocarem no nada,
esvaecerem-se nele? Em que altura do ser devem aguçar-se os ouvidos que
escutam?
Quanto a nós, estamos na posição incômoda da dialética do profundo e do
grande; do in-finitamente reduzido que aprofunda - redução decorrente do vazio
que se revela no esvaecimento do efêmero no nada, ou do grande que se estende
sem limite, o grande estende-se intencionando re-colher e a-colher no espaço
poético do In-finito o Verbo do Ser poético.
Todo sonhador solitário sabe que ouve de outro modo quando fecha os
olhos. Para re-fletir, para escutar a voz interior, para escrever a frase
central, condensada, que vai ao "fundo" do pensamento, quem não põe a
mão na fronte e aperta as pálpebras com pressão forte? Então o ouvido sabe que
os olhos estão fechados, sabe que a responsabilidade, o compromisso do ser que
pensa, que escreve, está nele. A calma virá quando a pessoa reabrir as
pálpebras.
Colhendo todos os documentos da fantasia e dos devaneios que gostam de
jogar com as palavras, com as impressões mais efêmeras, confessamos uma vez
mais uma vontade de permanecer superficiais. Exploramos apenas a camada mais
fina das imagens nascentes. Não há duvidar, a imagem mais frágil, mais
inconsistente pode revelar vibrações profundas. Mas seriam mister indagações em
outro estilo para separar a metafísica de todos os "além" de nossa
vida sensível. Para dizer como o silêncio trabalha simultaneamente o tempo do
homem, a palavra do homem, o ser do homem, necessitaríamos de mergulhar no mundo
do silêncio.
Manoel Ferreira Neto
(15 de outubro de 2016)
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