COMENTA O POEMA /*LIRISMO PUNGENTE/A PERFEIÇÃO É IMPERFEITA*/ JÚLIA Ana Júlia Machado, ESCRITORA E POETISA
Vou tentar “desmontar” o texto do grande Mestre e escritor Manoel
Ferreira Neto com a minha singela erudicção.
A mestria das conexões, sinais, verbos, execuções descobre-se na
naturalidade, impulsividade da fictícia incorrecção do der…
Então, que se procure o sentido da incorrecção do ser à claridade da
mestria que a escora e protege…
conheceri que a todo o instante habito, sofro, avisto, considero o
instante que careço… que é divino, exemplar, elementar… que me desloca, dispõe,
impulsiona na rédea do autenticação de quem sou e o que concebo aqui…
Que se conheça a assentar, resfolegar visceralmente…
Que se instrua a acalmar e hospedar este regularizado intelecto…
Que se instrua a acreditar…
Que se instrua a estacar…
Que se aprenda a observar…
Que se instrua a enlaçar…
Que se instrua a aguardar…
Que se instrua a narrar…
Que se instrua a venerar…
Que se aprenda a admirar a pulcritude do trilho…
Com toda a mágoa, angústia, tristeza, temor e anelo de se avistar livre,
ditoso…
São essas as energias que me impelem…
Tenho erudição para aceitar a luminosidade deveras se conheço a
escuridade…
Escuridade só é verídica na inexistência da claridade…
De nada antecipa pretender alumiar a escuridão com luzinhas de
materialismo ideado…
De nada apressa imaginar eu sou ditoso, eu sou querença, eu sou
pacificação, eu sou independente, surripiando a plangência penetrante que me
ocupa, ou a mágoa que somente são o resultado, instintivo do bem-querer que eu
sou…
Como poderei identificar uma realidade pretendendo a todo o instante
azular, surripiar, anular a distinta? Não tem sentido racional…
Preciso identificar a natureza elementar onde me abranjo e que se acha
além de físico, intelecto, sensações, sensibilidades…
Poderei transitar os dias da minha existência focalizado em
“aperfeiçoar” a minha notabilidade, paridade, corpo, sensações, sensibilidades,
ligações, enclausurado à alucinação de que isso será a entrada de investida
para a minha independência, sentido de quem sou… mas estaremos unicamente
representando vagamente...
Careço ir mais além… compreender que eu não sou a minha índole,
paridade, físico, comoções, sensibilidades, ligações… que isso somente é uma
minúscula constituição daquilo que sou…
Assim conseguirei admirar cada um dessas matérias, especuláveis em mim e
acarretá-las, orientá-las, sustê-las, enlaça -las, quere-las, independente da
iludida valia que lhes faculto comparativamente à dita que sou, aqui e hoje.
A execução será enriquecida de porte, naturalidade, autenticidade,
encargo…
Cada impedimento, estorvo no trilho, um rebo precioso que se cinzela…
A vida se fosse perfeita era uma apatia total….e a perfeição é pura
ilusão…ela não existe.
Apenas existe para quem não sabe o que é a vida.
E acabo com frase do mestre e grande escritor Manoel Ferreira….. Não
pretendo o tudo que é nentes: pretendo meramente o nentes que é nentes, o nada
genuíno, sem início e sem transcendência. Não pretendo lume para atear o
cigarro: tenciono o cigarro no recanto da boca extinto.
Ana Júlia Machado.
**LIRISMO PUNGENTE/A PERFEIÇÃO É IM-PERFEITA**
Não quero alcançar a perfeição: a perfeição é imperfeita de perfeições.
Não quero alcançar a verdade: a verdade não é verdadeira de/nas verdades. Não
quero alcançar o céu: no céu não há labirintos, cavernas de estalactites,
terrenos baldios, águas banhando a montanha. Não quero alcançar o inferno: não
vou penar nas chamar ardentes, lá não há fogo. Não quero alcançar o uni-verso:
o uni-verso é longínquo. Não quero alcançar o sublime: as sublim-itudes do
sublime nas suas sublim-idades não são sublimes.
Não quero compor um soneto de versos metrificados: não tenho fita
métrica para medi-los. Não quero sentar-me à soleira da porta, con-templar as
estrelas e a lua: estou deitado, olhando para o teto, só letrando o silêncio.
Não quero sentar-me nalguma cadeira do Olimpo dos Deuses, não tenho paciência e
nem "pedigree" para ostentações da verdade. Não quero cadeira numa
Academia, confradear Letras que só se jubilam, vangloriam, envaidecem-se,
orgulham-se; quero solitário andar entre elas, bebendo-lhes o néctar da eterna
busca da estética, tomando em mãos uma frase do escritor Lúcio Cardoso: "O
que é isto - a eternidade?"
Não quero um amor que alegre o meu viver: quero um amor que des-faça as
minhas alegrias, faça-me triste, angustiado. Não quero sentir o sabor do vazio:
quero beber o nada em pequenos goles para sentir-lhe preenchendo as minhas
ausências e forclusions. Não quero ouvir lírica de música: quero recitar o som
ritmando a melodia do silêncio. Não quero rosas e feras sintéticas, elétricas
guitarras, um solo triste, sinfonia louca, lirismo pungente, demente da gente:
quero ver o cruzeiro do sul. Não quero a vigília da insônia: quero a insônia
lucilando as estesias e ex-tases, as estéticas do prazer sem limites. Não quero
a morte genesis da vida: quero a morte morrida de tanto morrer.
Não quero rir de felicidade: quero a felicidade rindo de tanto sentir o
prazer de ser feliz. Não quero debulhar as contas do terço, rogando a redenção
e ressurreição: quero todos os pecados lucilando nos recônditos da alma. Não
quero alvorecer com os pássaros trinando no ipê amarelo: quero uma tempestade
daquelas anunciando o novo dia. Não quero o despetalar de "bem me quer/mal
me quer": quero a rosa no jardim, respingada de orvalho. Não quero a
poesia poetizando a poiésis do poema: quero simplesmente palavras sem
semânticas e linguísticas. Não quero cartas dizendo o meu destino: quero o
destino jogando as cartas aos naipes do eterno.
Não quero mergulhar com volúpia e êxtase no mundo para in-vestigar a sua
genesis: quero tropeçar em pedras, quero a pedra do tropeço. Não quero saber
quem pintou o urubu de preto: quero o resto da tinta para engraxar a minha
botinha, para pintar o "croqui" do nada absoluto que tracei. Não
quero o tudo que é nada: quero simplesmente o nada que é nada, o nada puro, sem
princípio e sem metafísica. Não quero fogo para acender o cigarro: quero o
cigarro no canto da boca apagado.
Manoel Ferreira Neto.
(*RIO DE JANEIRO*, 16 de outubro de 2016)
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