**A VERDADE SEJA DITA** - Manoel Ferreira
Dizem-me "corajoso", "implacável". Há coisas que
digo, relato, narro não deveria fazê-lo, inda mais em se tratando do uni-verso
virtual, onde as interpretações, análises, censuras, discriminações são à larga
do coração, dos sensos. Única palavra é a consumação da sepultura. As minhas
verdades são as minhas verdades, só a mim sou responsável em/por respondê-las,
as responsabilidades são minhas. Respondo-lhes com categoria.
Caríssimo leitor, um questionamento radical em todos os níveis faço-lhe:
"Você escreveria a sua autobiografia, omitindo alguns anos de sua
vida?" Se é autobiografia, o próprio sentido do vernáculo indica ser a sua
vida em todos os níveis, portanto tudo devendo ser dito às claras. A menos que
você queira com a sua autobiografia apenas mostrar-se, fazer as estrelas todas
brilharem para você, o grande, o santo, o símbolo, o signo, o deus.
Faz alguns anos que leitores e amigos reais questionam-me sobre isto de
escrever a minha autobiografia. Aí está a grande questão: não o farei, por
haver três anos e meio de minha vida que não pretendo, em hipótese alguma,
revelá-los. Não por desejar mostrar-me grande, santo, deus. Simplesmente porque
não quero sujar, imundar, enlamaçar a minha vida com estas narrações,
descrições. Mais uma pergunta, caríssimo leitor: "Você teria coragem de
narrar, descrever que em três anos de sua vida conviveu com um homem,
estuprador de adolescente de treze anos, espancador de prostitutas, da própria
mulher, de mendigos, bêbados, desonesto profissionalmente, um ladrão, e o que
você sofreu na pele, nos ossos, na carne com este homem?" Mesmo que você
me prove por a + b a sua coragem, não acreditaria em única palavra sua. Os seus
sonhos de consciência moral e ética não permitiriam tais descrições. Não os
colocaria em xeque-maque.
Pois bem... São três anos e meio de minha vida convividos com VASCO
FERREIRA DA SILVA, açougueiro, residente em Paracatu, Minas Gerais, meu
progenitor, canalha em todos os termos que se possa imaginar, estuprador,
estuprou adolescente de treze anos, espancador da própria mulher - espancou-a a
vida inteira e no féretro dela chorava à cântaros -, de prostitutas, mendigos,
pessoas idosas, doente mental, psicopata. Não escreverei tal autobiografia. Por
que colocar um traste na minha obra? De modo algum. Tendo sido criado pelas
irmãs de minha mãe biológica, quem conhecia e bem este homem, desde tenra
infância fui educado para tomar outros rumos na vida, não ter nada deste homem
nas minhas posições morais e éticas. E felizmente trouxe comigo a herança maior
que Tuca, minha mãe biológica, doou-me, a Arte, seus pais eram circenses.
Inda que um breve relato, não voltarei mais a ele, mas é um instante
crucial da minha vida, o que me importa daqui para a frente é a felicidade com
a minha esposa Graça Fontis, estou acenando à família o "adeus"
perpétuo, sem irmãos, sobrinhos, a minha vida daqui para frente são minhas mães
que me educaram, a Tuca que me deixou a herança da Arte - todas já falecidas -,
estarão presentes na memória. Sozinho com a minha Graça.
Manoel Ferreira Neto.
(*RIO DE JANEIRO*, 23 de outubro de 2016)
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