#ESPELHO À PROCURA DA IMAGEM# GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: PROSA $$$
Assunção.
Creio que
diante de tantas dimensões divinas e humanas, a Terra-Mãe está cheia do Amor de
Deus, e por isso mesmo deseja, tem vontade do Sublime e do Sagrado,
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Numinoso.
Luzes não
são suficientes para iluminar a longa área de mato e capim que se estende
adentro mistério entre árvores, galhos, esquecimentos, de alguém que, sentado
no meio-fio, a noite segue seu caminho, se há outra significação para o pouco
ou demais de olhos que desejam com que gestos ou modos de revelar o erro
abstrato da criação, e o silêncio perpassa momento difuso, profuso, completo de
viver tudo de todos os lados.
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Theos.
Experimentar
a intimidade, uma vez vivida e sentida não se apaga mesmo que os homens se
amesquinhem, ridicularizem-se, degenerem-se. A réstia de luz que perpassa o
tempo, o espaço, envolve um mistério de doação “escondido na beleza, na
volúpia, na quebra da solidão, no a-núncio da esperança, no afastamento do
medo, na presença e re-velação do silêncio”.
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Inner.
Instante
inesquecível em que torno a sentir! Escuto o riso da ampulheta, diante do tempo
– o vento invade-me a voz que é sonho, o desejo da mente que é imensidão, a
vontade da alma que é eternidade, o sonho do coração que é o sublime. O espelho
procura a imagem, buscando aprimorar com ousadia o registro de mim – desço pela
janela do que já se tornou inevitável, como a taça que se estiola no chão e eu
não quero, insisto e persisto em não “emendar” – diria ser eu um teimoso, um
burro empacado? A imagem constrói a matula de lacaios, busca a taberna de
difusos, desejando a transparência de cinismos e ironias.
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Nous.
E o
espírito paira sobre o abismo. Não há de ser por os olhos não se dignarem a
contemplar e vislumbrar neste momento em que o espírito paira sobre o abismo
que perderei a oportunidade de trazê-lo à superfície – talvez tenham eles
alguma vertigem, se olharem com muita atenção e entrega, são capazes de não
resistir à profundidade, respeito-lhes a vertigem, mas não posso deixar de me
furtar ao prazer deste instante de contemplação. Neste caso, não é o silêncio
que é diferente, não é o sublime que mostra suas nuanças, o sentimento é que é
outro. Tal explicação à luz de uma justificativa parece-me viável para a
compreensão: a alma volta à serenidade de antes, de outrora, naquele momento
mesmo em que intuí um sonho muito forte em mim, em princípio vaguei os olhos
pelos horizontes, um vazio sem medidas tomou-me por inteiro, não me pude
controlar, saí correndo, mas após descansar veio-me à mente que o desejo era de
trazer os abismos à superfície.
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Misericórdia.
Haverá
imagem de intimidade mais condensada, mais certa de seu centro que o sonho do
porvir de uma flor ainda fechada e encolhida em sua semente? Se não há imagem
desta intimidade, dizendo que a flor seca perfuma a gaveta em que murchou, quem
sabe fora eu em absoluto infeliz em dizendo assim, quando deveria dizer que o
sentimento ficara na semente, a flor fica sempre na semente aquando emurchece.
Como se há de querer que não a felicidade, mas a antefelicidade, permaneça
fechada na gaveta.
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Ágape.
Gravou-se-me
na memória a imaginação. Gravou-se nela a flor seca que perfumou a gaveta em
que murchou. As verdadeiras imagens aprofundam lembranças vividas, deslocam
recordações vivenciadas, para se tornarem lembranças da imaginação.
Interessante isto!... As palavras também são guardadas em gavetas, esperando de
lá serem reveladas ainda com mais sentimentos e emoções, pois que o tempo as
tornara mais reais, mais essenciais para a vida. Por que relaciono a flor com
as palavras?
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Iluminação.
Morrer no
inverno. À hora absoluta, delírio de luz. Não no outono, de monco caído. Ou no
verão, quando se está sem qualquer coberta ou cobertor, inteiro nu. Mesmo na
primavera em que tudo está ainda para ser. À hora máxima, os olhos em chamas,
mesmo fechados, a luz estrídula em todos os interstícios da vida. É para isso
que vim, não tenho interesses em ensinar, em aprender, o que isto pode
significar nesta derradeira hora? Vim para ser todo onde for. Até já me
disseram, e confesso haver ficado orgulhoso, que não vim para aprender, e sim
para ensinar. Passado o orgulho, perguntei-me o que teria para ensinar. Não
encontrei qualquer resposta, e isto foi o melhor, pois que se houvesse elencado
o que teria para ensinar não encontraria verdade alguma. Creio sim que atingi
um nível bem diferente do que era esperado. Descobri que devo continuar
exercendo a função – se não a exercer como estabeleci, nada terá sentido.
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Amor.
É preciso
perder o paraíso terrestre para vivê-lo verdadeiramente, para vivê-lo na
realidade de suas imagens, na sublimação absoluta que transcende qualquer
paixão. É preciso perder o odor frágil e ameno da flor que nasce logo ao
amanhecer de um novo dia para senti-lo verdadeiramente no íntimo, dando formas
e estilos a novas emoções, novos sentimentos e intuições, a verdade plena
vigiando no coração aberto do dia.
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Deus.
Com o
correr do tempo, quando a fé primitiva me modificasse pela experiência, os
sentimentos todos não sofreriam súbita revolução. Teria inda fé no destino
brilhante e, talvez, amasse mais a vida, ao reconhecer que pouco posso fazer em
benefício próprio. A altivez ceder-se-ia à humildade, quando conhecesse
distintamente os elevados ideais; talvez percebesse claro, por qualquer dos
sentidos, onde caem as sombras o terreno é sagrado; talvez apreciasse o
pensamento sábio e meditado; talvez distinguisse que nenhum escrúpulo me
impediria de sondar toda a profundeza da alma; talvez discriminasse o
verdadeiro valor estaria no reconhecimento da força interior que transforma as
vicissitudes; enfim, talvez discernisse os melhores esforços do homem são uma
espécie de sonho, enquanto Deus é o único construtor de realidades, o único
revérbero de outonos e memórias.
#RIO DE
JANEIRO(RJ), 01 DE JULHO DE 2020, 13:41 p.m.#
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