#DIREITOS RESERVADOS AOS EQUÍVOCOS# GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: SÁTIRA $$$
Então, o
que isto quer dizer sem quaisquer perquirições abstratas, metafísicas ou
concretas, é que há direitos que a-colhem, re-colhem, defendem e amparam os
equívocos, nestas instâncias nada há que lhes possa censurar ou condenar,
atribuir-lhe pena capital ou mesmo minúscula, o pagamento em moeda do que é
pertencido, seus valores e virtudes, seus dons e talentos, podem com total
leveza cometer outros até mais sérios que serão absolvidos com louvor e glória.
Os direitos dos despautérios, nonsenses, insanidades estão reservados. Os
equívocos são necessários, fazem parte do quotidiano das coisas do mundo,
sobretudo dos humanos que apreciam, aprazeram-se com os resultados que obtém
por realizá-los com supremacia. Seria que devesse eu entender e compreender isto
como sendo uma atitude de misericórdia e solidariedade das mais elevadas? Os
homens não nasceram para serem solidários e misericordiosos, dizem os doutos e
os intelectuais de plantão. Estavam equivocados. Seria que foram garantidos
alguns direitos a estes equívocos?
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Há lendas
e mentiras por quaisquer sítios onde se ande no mundo, a História está
entupigaitada delas, nenhum pente fino é capaz de discernir as diferenças de
ambas, mesmo que não forem para servir aos propósitos e interesses, sim para
estabelecer outro prisma de visão. Dizem haver origem inconteste dos direitos
reservados aos equívocos.
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Numa
choupana morava um casal, a choupana era num bosque não muito distante do
centro da cidade. Não havia única noite que ambas não se sentavam à beira da
lagoa frente à choupana, fazendo juras de amor dos mais lindos e apaixonantes,
Neófo ia à caça todas as manhãs, saciar a fome com um assado, enquanto ela
atirava pedrinhas na lagoa. Casal que degustava e desfrutava da felicidade em
todos os seus níveis. A esposa já se sentia em demasia exausta de ser tão
feliz, e com os seus botões conversava sobre o que era a desgraça, o que era a
infelicidade. Não tinha a mínima idéia do que seriam estas cositas. Mas como
ser infeliz, desgraçada ao lado de um homem que satisfazia todas as suas
picuinhas e pitis? Seria feliz por sempre.
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Numa
destas conversas com os botões, estes lhe aconselharam a procurar o Oráculo de
Imelda. Só ela sabe o que pode impedir esta felicidade de ser eterna. Néofo era
imortal, mas Imelda sabia o que rompia com a imortalidade dele, só assim iria
patentear o seu desejo de conhecer a infelicidade, a desgraça. Isis não pensara
nem meia vez na sugestão de seus botões. Dirigiu-se à cabana de Imelda no Vale
das Inquisições, levada numa caravana conduzida por quatro cavalos de raça, um
velhote de capa cinza, chapéu de abas largas. Por mais procurasse imaginar o
que Imelda iria sugerir, não lhe era possível, muito além de seus dons e
talentos. A morte de Neófo não lhe passou pelas venetas da fissura pela
infelicidade, desgraça. Não sabia ser ele imortal, soube através de seus
botões.
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Chegando
à cabana de Imelda, surpreendeu-se com tanta simplicidade, só havia um colchão
de palha, um pote de água fresca. Sentada com as pernas cruzadas frente a Imelda,
não tinha um fio de cabelo na cabeça, olhos profundos, testa larga, orelhas
pequenas, trajava um vestido de saco de aninhagem, magérrima, disse-lhe:
"Imelda, estou cansada de ser feliz. Meus botões disseram que meu esposo é
imortal, só você sabe o que acaba com esta imortalidade..."
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- Dê um
relógio de presente para o seu homem, minha fia! Compre na relojoaria do Afonso
Sem Braço. Só lá irá encontrar. O relógio contará o seu tempo restante de vida
através dos minutos...
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- Quanto
tempo vai levar para ele morrer, depois de meu presente, Imelda?
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- Pode
demorar três meses, como pode demorar um ano. A pilha do relógio tem prazo de
validade longo. Os meus direitos aos equívocos estão devidamente reservados. A
pilha pode acabar e ele não morrer, algum problema no relógio.
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- Se é
para fazer, então eu faço. Só não quero é ser feliz para sempre. Tenho meus
direitos à infelicidade. Ora essa!....
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Dizem
alguns pesquisadores que Ismelda havia revelado o Oráculo do Relógio de Neófo,
mas ela própria não acreditava fosse de fato acontecer, a pilha do relógio
venceu o prazo, ele morreu de Imediato. E fora por esta razão que Ismelda se
refugiou numa gruta, e todos os habitantes daquele vale na homenagem ao exílio
que a ela prestam enchem um balde de equívocos e riem pelas costas dela,
olhando fixo para a parede da gruta. Ninguém tem a mínima idéia, noção, notícia
da infelicidade, desgraça de Isis após a morte de seu amado. Ninguém comenta o
que quer que seja a respeito, silêncio completo sobre a vida desgraçada,
infeliz de Isis.
#RIO DE
MJANEIRO(RJ), 08 DE JULHO DE 2020, 09:20 a.m.#
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