Maria Isabel Cunha ESCRITORA E POETISA COMENTA O AFORISMO 116 /**AFORISMO 116/O QUE É ISTO - SEM INSPIRAÇÃO?**/
Fenomenal texto! É isso mesmo que me aconteceu e talvez aconteça a todos
os escritores. Momentos mortos sem inspiração, porque sofremos um desgosto, uma
perda, terminámos um trabalho, percorremos um espaço da caminhada. Como o
viajante, o escritor tem de descansar à sombra de um ulmeiro, pousar seu
cajado( a caneta) para recuperar forças( inspiração) e , quando recomposto
prosseguir sua caminhada, já plena de novas paisagens e riachos que iluminarão
suas ideias com novos brilhos. Parabéns, escritor amigo. Um grande abraço.
Maria Isabel Cunha
#AFORISMO 116/O QUE É ISTO - SEM INSPIRAÇÃO?#
GRAÇA FONTIS: ESCULTURA
Manoel Ferreira Neto: AFORISMO
Não importa a dimensão contingencial de um momento; importa sim o que se
é possível realizar com ela. Momento assim revolucionou as ciências, as artes;
momento assim deu origem a obras-primas na Literatura, na Poesia; momento assim
espiritualizou alguns homens. Assim, esse momento, qual seja, de medo,
angústia, tristeza, depressão, desconsolo, solidão, é necessário, faz a
diferença, são pedras de toque do novo, da re-novação, da in-ovação. Todos os
homens vivemos à busca da felicidade, entregamo-nos plenos e inteiros a este
desejo, vontade, e a felicidade não concebe fruto algum, não dá origem à
revolução nas ciências, nas artes, obras primas não vem à luz... Viver as
contingências é a luz, é o arco-íris, são os raios numinosos do sol.
Quão difíceis são estes estados de alma, medo, angústia, tristeza,
depressão, desconsolo, solidão. Há quem não consiga conviver com eles,
suportá-los, aproveitá-los como húmus de outros tempos, entregam-se, sucumbem.
E todos estamos sujeitos a este momento contingencial. Jamais pensara
fosse acontecer comigo, nó górdio na garganta, o coração pulsando
descompassado, o olhar perdido na distância, irritação, nervosismo.
Mais do que acostumado com a inspiração presente sempre, até a
iluminação pres-ent-ificada, criando, criando, criando, compulsivamente, por
vezes acordando com textos ou poemas na cabeça por serem realizados... Vem o
momento inesperado de nada estar produzindo, criando. Antes, se projetava algo
a ser escrito, não era possível única letra, era sentar e escrever,
improvisadamente. E, neste momento, para amenizar as dores e sofrências,
experimentando projetar algum poema ou texto, mas o que surge de idéia, de
inspiração é acompanhado: "Não vou dar conta do recado. Prefiro a pena sob
a mesa do que porcaria numa ou algumas páginas".
Talvez o momento tenha origem: não estar satisfeito com as criações,
desejando outros voos, outras luzes - mas nenhum indício de re-novação se
revela, o resultado sendo "empacar", e no lugar do que não agradava,
não satisfazia, dava náusea, a presença de um vazio sem limites e fronteiras.
Outras explicações, outras razões para não estar produzindo coisa alguma. Num
momento assim nada adianta ficar escarafunchando as coisas à busca de motivos,
razões. Não se lhes encontra, o criar torna-se ainda mais complicado.
Notoriamente situação de Sísifo: jamais resposta será encontrada, a fertilidade
da imaginação criando coisas. Só uma solução: deixar as pedras rolarem montanha
a baixo. Nalgum instante o retorno à produção, à criação, e até de modo
diferente, satisfazendo e felicitando mais. Aquelas razões desejadas para
superar o momento não importam mais, não possuem mais qualquer validades.
Infantilidade procurar razões para as coisas que acontecem, no movimento das
contingências é que são superadas suprassumidas.
Sentei-me à mesinha de trabalho determinado a escrever, mesmo que
tivesse de queimar todos os neurônios, espremer os miolos, arrancar tufos de
cabelos na calvície, mas um texto escrito. Engraçado, muito engraçado: não
parei um segundo para pensar, refletir, meditar, à mercê do fluxo de idéias,
pensamentos, sentimentos e emoções.
Agora pouco me importa se este texto seja renovação, inovação, aprofunda
as minhas coisinhas, é novo tempo que começa, é obra-prima, está revolucionando
tudo o que antes fora escrito. Isto é ninharia para mim.
O importante é que o texto está escrito.
(**RIO DE JANEIRO**, 22 DE AGOSTO DE 2017)
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