#O SOL É A TENSÃO MÍSTICA DO SILÊNCIO, MÍTICA DA SOLIDÃO# - GRAÇA FONTIS: PINTURA/Manoel Ferreira Neto: AFORISMO
"Não
tenho fome nem sede: sou!"
Os
cristais tilintam e faíscam. O trigo está maduro: o pão é repartido. Mas
repartido com doçura? Sempre cri que harmonizar-me, relacionar-me, é
entregar-me com carinho e desejos de encontro e conquista, o coração pleno de
amores e verbos, isto é eivar os verbos de espírito e “humusizar” o espírito da
carne. É re-partir isso com os homens. É importante isto saber. Não penso assim
como o diamante que risca o éter não pensa. Brilho todo límpido. Não tenho fome
nem sede: sou. Tenho dois olhos que estão abertos. Para o nada. Para as
paredes. Para o teto. Para as estrelas que velam, solícitas e solidárias, o
ossuário da terra. Para algum lugar atrás das constelações, onde encontrar a
seiva das inspirações.
Quero
um manto tecido com fios de ouro solar. O sol é a tensão mística do silêncio,
mítica da solidão. Nas minhas viagens aos mistérios, dúvidas, incertezas, ao
inaudito, inolvidável, ouço as vozes carnívoras, os sonhos verbais, que
lamentam tempos imemoriais: e tenho pesadelos indecentes, indecorosos, imorais sob
ventos doentios, que oscilam, tremem e tremelicam, sacolejam e estrebucham, que
elevam as folhas e pétalas secas, fazem-nas pairar no vazio, que fazem cair o
verde, o viscoso, a vida delas, ao longo do deserto seco. Sinto-me encantado,
seduzido, arrebatado por vozes furtivas, efêmeras, na realidade passageiras, o
eufemismo não está sendo chamado à vida, a verdade sonha o espiritual. As
letras quase ininteligíveis, caracteres góticos, os sentidos quase
indescritíveis, as significações – por que não digo os significantes também?,
não o sei, como não digo as mesóclises de inter-ditos, ser-me-ia não plausível
dizer, não criaria a curiosidade de sabê-lo, saboreá-lo – falam de como
conceber, inspirar e escrever sobre o elixir como se alimentasse as luzes de outras
querências. Atrás do ser – mais atrás ainda – está o teto que trans-cendia
através das idéias, pensamentos e sensações, e aí conquistei o desejo,
entregou-se ele a mim, que eu olhava com olhos de lince, com intenções de
serpente maligna, de cobra ferina. De repente, verto algumas lágrimas.
Aprofundei-me em mim e encontrei que eu quero a vida, e o sentido oculto,
resultado e conseqüência de minhas ausências e limites de escrever a vida, tem
uma intensidade que tem luz. É a luz secreta ou as trevas de passado remoto,
meu rito é purificador de imagens e de espírito, de forças sensíveis e
transcendentes.
Estou
tão amplo, tão pleno. Sou coerente: meu cântico de vida e verbos é profundo. Há
melodia de amor e eu nada posso senão nascer, descobrir o que é nascer e estar
dis-ponível para a Vida em todas as suas dimensões. Tudo atrás do ser, tudo
atrás do pensamento e idéias, tudo atrás das intuições, percepções,
inspirações.
Se
tudo isso existe, então, eu sou, sou-me.
(**RIO
DE JANEIRO**, 16 DE JUNHO DE 2017)
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