#O MISTÉRIO NÃO SERÁ MAIS AS TREVAS DO SER# - GRAÇA FONTIS: PINTURA/Manoel Ferreira Neto: AFORISMO
Quero
uma para sarapalhar as melancolias e nostalgias defectivas e imperfeitas,
enquanto nos elísios olimpos das furtivas e fúteis contingências os orgulhos e
vaidades sarapateiam os sonhos e pós perdidos na mina funda do tempo, insistem,
persistem nas esperanças do vir-a-ser as luzes da ribalta
Ideologia!
Quero
uma para aforismar as maledicências e vicissitudes que infestam os ideais inda
que tardios da consciência da liberdade, da sapiência de o respeito preceder
quaisquer dimensões éticas e trans-cendentais, da sabedoria de a vida ser
construída com a argamassa das dores, tijolos dos sofrimentos, o destino é
elaborado e instituído com as mãos.
Ideologia!
Quero
uma para me perder nos interstícios da lareira, cujas chamas aquecem o
friozinho da noite que custa a passar, pensando no amor que enovela as
sorrelfas do verbo, morrer de amor, de amor me perder, fazer-me um sonhador,
saltitar nos canteiros das alamedas, cabeça vazia de idéias, peito isento de
quaisquer ilusões, os instintos em estado natural, o corpo livre das ardências
da carne, às vezes recitar um verso que nasce espontâneo na alma, vida que se
ilumina, coração que pulsa para continuamente alimentar sua essência que é
existir profundo, professando a lírica das palavras que aquecem a solidão.
Ideologia!
Quero
uma para negligenciar os credos irrisórios, cujos interesses primordiais são a
lavagem cerebral, incutir mentiras da redenção, ressurreição, a felicidade é
vivenciada e vivida com a obediência cega, cega de consciência, cega de
sensibilidade, cega de liberdade, cega de visões, intuições, percepções da
verdade.
Ideologia!
Quero
uma para ruminar no ouvido: "aí de todos os mestres vaidosos e aí do
paraíso estético, aquando um jovem tigre, de olhos e músculos frementes de
nervosa força, se puser à caça de sua presa", e convidar-lhes à
resistência do mundo obtuso.
Ideologia!
Quero
uma para lastimar as in-verdades que nalgum canto ou recanto do tempo ficaram,
não seriam pedras de toque para as imperfeições do absoluto, perfeições do
efêmero que des-embocam na mesmidade da etern-idade, agora posso dizer adeus às
quimeras e sorrelfas, pois tenho em mim, trago em mim dentro a querência,
desejância da ideologia livre do friozinho da solidão, a luz do sol no
amanhecer, não me sentirei mais na poeira da estrada andando sem destino,
sinto-me dormindo nos braços de outros desejos, podendo a ideologia esvaecer-se
nas sinuosidades do vento, mas sei que em mim viverá plenamente, o amor não
será mais sofrer, o mistério não será mais as trevas do ser, os enigmas da luz
serão a mística do eterno.
Ideologia!
Quero
uma para varrer dos saraus poéticos o pieguismo do amor, amor não correspondido
que é a origem da autovalorização, a melosidade dos sentimentos que criam e
instituem a espiritualidade, o nonsense dos sonhos que ilumina as trevas,
brumas e sombras. "Vem me amar", sobretudo eliminar qualquer
possibilidade de este verso figurar num poema, o cacófato "mia mar"
leva a um despautério sem limites, não há gatos no mar para miar.
Ideologia!
Quero
uma para exilar os poetas de plantão, sempre prontos para compor versos e
estrofes do momento, aqueles que todos querem ouvir e sentirem noutro planeta,
degustando favos de mel, chupando uvas deliciosas.
Ideologia!
Quero
uma para ser sátira das náuseas e forclusions do Verbo Ser que só declama
esperanças e sonhos, ser comédia da felicidade que se realiza no éden, ser
crônica dos valores eternos que preenchem os lapsos da memória, os nonsenses da
razão, as asnadas, solilóquios do silêncio da solidão.
Ideologia!
Quero
uma para ser a razão in-versa que começa no in-verso para atingir o re-verso do
verso in-finitivo da boêmia.
(**RIO
DE JANEIRO**, 16 DE JUNHO DE 2017)
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