#LÚCIFER PERNÓSTICO - ROMANCE# - GRAÇA FONTIS: PINTURA/Manoel Ferreira Neto: ROMANCE
CAPÍTULO VII - PARTE I
Por que será?
Vendo-lhe indagar assim, nada mais faz que estar
indagando as razões e conseqüências lhe trouxeram até ao primevo instante, o
que estaria explicando as neuroses suas de cada momento em que se prolonga
neste mundo, perseguindo os sonhos e utopias, de que não se afasta mesmo que
lhe mostrem as Palavras de Cristo são mais importantes, ainda continuaria
defendendo e lutando por eles; aliás, assim daria um jeito de Jesus Cristo
confiar estar a dizer a verdade mais profunda em si traz dentro, dar-lhe-ia Ele
sentido e compaixão...
O que explicaria de modo e estilo simples qualquer
imbecil ou demente, se encontrasse nalgum tablóide jogado fora, serem as letras
de sua compreensão, e embora os preconceitos, devido ao fato da corja da
sarjeta soube entender e compreender, nada mais dizem senão dizerem coisa
alguma?
Não. Aliás, o que mesmo esteve a indagar, e
ansioso, buscando persuadir os imbecis, convencer os gênios, não o sabe mais, e
todo o esforço e verborréia serão o de tentar se aproximar da idéia e das
intuições lhe surgiram enquanto se anunciavam. Não se é preciso muita lábia
para persuadir os imbecis, por vezes com o silêncio está persuadido. Tente
convencer a um gênio, as lábias comungadas desde toda a eternidade até à
eternidade não serão suficientes.
Suponhamos que, a partir de agora, não se interesse
por responder o que antes era indagação que trazia dentro de si, necessitando
responder até para continuar a respirar. Nada diz qualquer conivência,
respeito, acerca de encontrar o que vem buscando até se revelar no espírito
necessitava responder os questionamentos desde o intróito era vital; no
entanto, esqueceram-lhe as idéias e utopias, e mesmo em que termos e estilo
estivera a indagar?
Por que será? Por que se esqueceu da essência ou
núcleo, isto depende do ponto de vista ou interesse a ser admitido e digerido
com prazer e deleite, vez por todas diz haver-se esquecido das palavras?
Saberia responder? Não crê porque aqui nada lhe interessa responder, estar à
procura de alguma coxia, em que possa se alimentar de primevos princípios, o
que, com certeza, é difícil visualizar ao nível da imaginação ou do imaginário,
imagine nalguma coxia à beira de uma estrada de terra cercada de árvores,
sugerindo-lhe um bosque. Impossível.
Nada estará ou esteve buscando fundamentar com
estas palavras, mesmo Credólio Cruzilis nada está entendendo do que diz, um
momento de completa falta de senso, de sensibilidade, erudição, intelecto,
cultura, um instante livre e vazio. Deveria encontrar uma imagem para comparar
com este instante; deixa o caminho livre para interpretações as mais esquisitas
e estranhas a qualquer asno que já caminha tropeçando os pés no chão de pedras,
cabeça baixa, rogando a Deus que morra, nada mais lhe sobre dos ossos, o dejeto
seja alimento do mais faminto dos abutres?
Se antes esteve eufórico, em estado de êxtase com a
sátira que havia começado a escrever, uma oportunidade das mais esplendorosas
de a tudo criticar, velada ou abertamente, mas não haveria a quem não servisse,
foram na medida exata, o que isto agora significa? Parece mais um monte de
palavras sem qualquer sentido, o leitor ri não é da história, das críticas, mas
de sua completa falta de dom e talento, não saberia escrever algo que fosse
lido por todo o sempre, sendo admirado pela eternidade, uma obra-prima
universal. Esforços e mais esforços por escrever a primeira obra-prima e jamais
se aproxima um poucochinho que seja. Talvez se não ficasse tão ansioso, dando
ao espírito e à alma a liberdade de esquecimento, de olvidamento, a inspiração
surja e no ato de escrever ela se revele por inteira, rechonchudinha. Mas não
se dispõe a fazê-lo – é o que lhe alimenta as chamas mais profundas de sua
alma. Tem medo de assim o fazer e haver conseqüências lastimáveis.
Quem sabe – isto deixando de ser uma exclamação,
sendo um pedido a Deus que lhe dê intuição e percepção para se aproximar da
obra-prima, que sonhara escrever, e a partir dela escrever outras que
justifiquem não a busca de sublimidade, mas seja a sublimidade ainda que em
nível da contingência, a passagem será ao logo dos séculos e milênios; isto só
lhe basta para sentir-se realizado – com a brincadeira de confessar, em tom
jocoso, sabe-o, mas é a verdade que lhe habita o íntimo da alma e o espírito,
não se aproxime. Próximo, não lhe será difícil atingi-la, sê-la.
Nada há a dizer, apenas que a imagem sugere o
encontro com o capim que era para se alimentar, restituindo-lhe a essência
deste mundo... Que mundo é este em que se encontra? Nada consegue mostrar-lhe
algo de substancioso, merecedor de gastar o tempo à procura de sua realização,
pois que se lhe revelara um sonho. Seria esta a primeira experiência de
depressão por se envolver com a história de Lúcifer Pernóstico – nem ele
próprio fora excluído das influências negativas do asno-da-carroça. Escrevendo,
então, as influências são ainda mais negativas, às vezes causando sérias
conseqüências.
Sensação estranha a que tivera, indo até à cozinha
tomar um gole de café. Há um relógio de pilha na parede. Por ele é que a esposa
tem noção do tempo que gasta para fazer almoço, antes de ir ao trabalho pela
manhã. São 11 e meia da manhã. Olhou bem para não confundir os ponteiros de
horas, minutos e segundos. Parecia estar marcando ainda nove horas. O ponteiro
de segundos se mexe duas vezes e retorna. Ficará assim até a pilha acabar por
inteiro. Não sabe como continuar a sua sátira. Relera o capítulo inúmeras vezes
e não intuiu qualquer modo de continuar. Trocara as pilhas, o ponteiro dos
segundos não deixaram de adiantar duas vezes, retornando.
Dizem as infernais línguas que um poeta, ainda
desconhecido, candidato à carreira, concorrendo com muitos, encontrara Gregório
de Matos, numa taberna, junto de amigos, perguntando-lhe com o que rimaria
“mim”. O Boca do Inferno, assim era chamado o poeta, devido às suas críticas
mais que deslavadas, respondera laconicamente: “com capim”.
Nestas palavras, até mesmo sem serem formadas por
fonemas, sílabas, a união delas, é que está interessado em registrar isto que
mais lhe sugere resposta ao in-verso de invernos, primaveras, outonos, de
acordo com as quimeras e fantasias os homens trazem à superfície de seus
corações que batem à mercê de fomes milenares, sedes seculares. Não diria o
verão, pois que fica eminentemente difícil refletir com os raios do sol incidindo
na calvície, cozinhando os pensamentos. Responde a isto quanto a si. Há quem
consiga pensar com as chamas eternas do inferno cobrindo-lhes o íntimo e
subjetivo.
Manoel Ferreira Neto
(MARÇO DE 2005)
(#RIODEJANEIRO#, 30 DE AGOSTO DE 2018)
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