TODA FORMA NÃO ASSUME NO MESMO ÁTIMO DE SEGUNDO O MESMO SER# GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: AFORISMO
O amor espera-me a cada instante. Quisera-me
difuso, poucochito mais.
====
Por vezes, não sinto limites no meu corpo. E o que
tenho, oh, meu subjetivo horizonte, íntimo uni-verso; oh, meu sol, meu momento;
oh, parte fora de mim perdida em labirintos, em abismos, em grutas
ensombrecidas. Meu coração à margem de entre montanhas insustentavelmente
altas, o limite entre o que posso sentir de suas pulsações, sentimentos e
emoções que nele perpassam, sinto e não posso verbalizar. Sinto-me tão real
como uma metáfora - torno-me uma linguagem nítida e nula em que me posso
mergulhar profundo, enchendo-me, alfim, de um brilho imenso no olhar, olho-o
sensivelmente e posso visualizar imagens, outras movendo-lhes em outros sítios,
lugares. Eu, enfim, literalmente eu? E eu metaforicamente?
====
As letras, re-versas no tempo, vão redijindo no espaço
imaginário da página de agenda, o saber que há vida amanhã, a pena oscila
vagamente sem que a mão haja influenciado, influído neste gesto. Seja de que
maneira for, é preciso continuar a vida, e esta só refulge suas luzes e cores,
se redigida, se tira o mundo ao mundo com a redação vinda diretamente do
invisível, do incognoscível, da alma além de suas con-tingências. Tudo ou sobra
ou fica pouco demais, e eu olho de esguelha para as coisas que me cercam, o
cinzeiro cheio, o maço de cigarros sobre a escrivaninha ou uma taça de vinho,
um copo de cerveja geladinha por vezes abro-lhe a gaveta, fixo as coisas sem
nada fixar, nada procuro, nada quero de dentro delas, molduras de pinturas
suspensas na parede, a luz acesa, as sombras e a claridade em torno da lâmpada.
====
Ai de mim!... Ai de mim!... Não sei ser quotidiano,
nítido, não sei ser prático, a prática única está nisto de redigir no espaço
imaginário da página, com todo o esmero com artificiar letras góticas.
Levanto-me da mesa, ando à toa pela casa, de cômodo em cômodo, uma razão para
descansar, necessidade de me distrair, a inspiração é delicada, qualquer
deslize ou ausência de atenção esvaece-se, é preciso, então, resgatá-la, e como
é vaidosa em demasia pede afecto, carinho, afago.
====
Toda forma não assume por ínfimos instantes o mesmo
ser. A lucidez das imagens traz-me um silêncio cheio de vernáculos, e, curioso
por saber onde habita este silêncio, em que sítio se encontram os vernáculos,
são ausências de essências, de habitat, tão unicamente vida, e esta transcende
o silêncio, os vernáculos. O sentimento de uma plen-itude de vida lega-me o
ensejo de vislumbrar, e torna a voltar. O menor momento de vida é mais longo
que os sentidos, os significados que em si trazem, redijo surpreso, encantado
pelos verbos, pelas regências que banham suas bordas de tempos inestimáveis,
longínquos, de conjugações de sensações e imaginações. Por onde o espírito, a
alma passeiam, as ondas sensíveis voluteiam imensas e suaves.
====
A utopia vive a esperança de seu culto, de seu
ritual. Crio a mim para envelar a minha ausência. Trago-me ao mais longínquo de
mim, onde só a intuição é capaz de revelar-me.
#riodejaneiro, 15 de dezembro de 2019#
Comentários
Postar um comentário