DOMUS DA RECLUSÃO AO ESPÍRITO GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: SÁTIRA
POST-SCRIPTUM:
Eis o
nosso PRONUNCIAMENTO, de Graça Fontis e meu, aos brasileiros e ao Mundo neste
"Instante-já" de medos, temores, angústias, inseguranças da
humanidade com o CORONAVÍRUS. Somos representantes responsáveis das Artes e da
Vida, nossos compromissos são imensos, inestimáveis com a Humanidade. A ESPERANÇA
EM VERDADE SENTIDA PROFUNDAMENTE é a única Salvação do Ser Humano. ESPERANÇA E
ATITUDE, CONSCIÊNCIA ÉTICA DE CADA UM.
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EPÍGRAFE:
A
cericória da própria busca é determinada pelas condições de uma dada
temporalidade, a qual, é claro, implica investigações, contemplações,
inventários, vislumbração e avaliações de tendências futuras de
desenvolvimentos e crescimentos.Manoel Ferreira Neto
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Tanto
melhor assim!
Homens
irresponsáveis em épocas determinadas produzem ações que corroem o sentido da
vida, escondem-se de por trás de expressões, sendo até melhor dizer simples
comparações, “reflexo baço e ilusório de uma cericória”, significando
“cericória” “um dos satélites do diamante”, para não virem retratadas as
próprias imagens no espelho da escória. Não entendi porque tanto esforço,
espremer dos miolos, para construir esta simples comparação – que inteligência
primorosa, em átimos de segundo, estava registrada no artigo de tablóide. A
metáfora fora evitada por o autor não haver sido capaz de construí-la, não
perdendo uma única palavra, também para não se sentir identificado com ela, o
que causaria angústias ilimitadas, não sabendo reconhecê-las, quem sabe por um
simples resfriado!...
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Em
princípio, sugere, para alguns, endossa para outros, que resposta neste estilo
e linguagem mostra com evidência um ressentimento, mágoa, “estar puto” por
receber nas orelhas e nas faces palavras agressivas, o orgulho está realmente
ferido – não fosse assim, resposta não teria sido dada. Não estou na Rússia,
não fui nascido lá – quem dera, teria convivido com Dostoiévski, Tolstoi,
Turgueniev, Gogol, Gorki -, onde, no inverno, os homens disputam a propriedade
de suas próprias orelhas.
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Por
vezes, sim, é verdade, desde que não seja possível aproveitar a imagem para uma
incursão, um mergulho mais profundo, desejando a imagem refletida. Por vezes,
não é verdade, contanto que me não seja possível adentrar-me na imagem,
recriá-la no nível de uma compreensão do que ela realmente quer significar, as
atitudes e ações que ela imputa a quem a criara. Em suma, noutra linguagem,
mostra que a mim não fora dirigida, não me vejo refletido nela.
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É preciso
cuidar de algumas falas por elas mostrarem o íntimo, as mazelas e orgulhos
feridos. Fácil isto desde que se conheça certas circunstâncias e situações;
deseja-se por toda a lei escondê-las em nome de preservar princípios – quem
sabe Deus saiba quais, se é que Ele vá se preocupar com estas “cositas” da alma
humana.
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Em nome
de que tenho de revelar-me? Em nome de uma modificação dos homens, de seu
caminho mais fácil? Em nome de uma transformação do destino do homem, de sua
exposição no mundo? Em nome de uma responsabilidade com as colocações dos
homens, uma tentativa de construção de um mundo mais humano, mais sensível? Em
nome de uma ilusão de existência mais digna, mais confortável? Em nome de não
ficar inerte, numa inépcia total e absoluta, ocioso, de uma ociosidade leve e
tênue?
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São todos
estes questionamentos que se me revelam, às vezes, instantes estes em que o
desejo é permanecer pensando e sentindo deste ou daquele modo - isto, em
verdade, não importa; momentos em que a vontade é de ficar inerte e numa
inépcia absoluta acerca dos problemas que se me assolam a alma, e mais
contundente o espírito, não desejo de modo algum buscar superações,
ultrapassagem, transcendência.
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Noutra
linguagem, quem sabe até mais acessível, há quando não tenho qualquer interesse
ou objetivos em crescer, amadurecer, coincidir-me com quem sou e com quem
represento neste mundo. Torna-se mais simples seguir o rio que não tem pressa,
o rio sem margens, as águas seguindo suas trilhas.
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Quem sabe
não tenha a sorte de encontrar uma cericória na ribeira?! Tudo é possível.
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Aliás,
posso sentir-me confortável no mundo, apesar dos questionamentos e buscas.
Deixe-me fazer entendido e compreendido desde então. Pergunto-me como é
possível isto de causar náuseas, nojos, em quem, mesmo com a ilusão de estar
dizendo vez por todas uma opinião e visão das coisas insofismáveis e
indubitáveis, em verdade não pôde de modo algum contemplar e vislumbrar o
sentido desta própria náusea, isto é, este fenômeno se lhe apresentou por saber
que lhe é impossível saber de suas manifestações psíquicas, emocionais,
espirituais.
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Ouvindo
que um dia ou uma semana foi o mais difícil, exigiu uma investigação,
averiguação de todas as atitudes e comportamentos no mundo, de imediato, mesmo
que não apresente com os olhos, de modo algum, percebo em que lugar se
fundamenta esta afirmação: no sentimento de vítima, de injustiça, de falta de
humanidade, rogando e implorando piedade e compaixão dos homens todos: “Por
amor a Deus, afastem de mim este cálice!”
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A
linguagem erudita e clássica não tem outro sentido senão este, de abrir
possibilidades para outras interpretações em épocas mais propícias, em que os
homens possuem uma riqueza de linguagem e vocabulário, épocas em que os homens
responsáveis criam e estabelecem ações e atitudes que dignificam o sentido da
vida. Não me escondo de por trás de palavras e de erudições, nelas esclareço e
deixo transparente que revelo coisas do espírito que homens de concepções
antiquadas acerca do mundo, da vida, não são capazes de perceber, a preservação
do velho serve a princípios bem nítidos, o da alienação e vazio dos horizontes.
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Poderia
sim citar um exemplo bem peculiar. Machado de Assis ficara sabendo por um amigo
de suas relações íntimas que havia uma crítica ferina acerca de Memórias
Póstumas de Brás Cubas em um jornal, não era tablóide. Não titubeou um só
momento em dar uma resposta que ficara nos anais do tempo: “Os críticos vão. Os
escritores ficam”. Resposta lúcida de quem sabe que não exprime suas idéias
para o momento presente, sim para depois. Aliás, o próprio Machado de Assis
adverte neste obra, Ao Leitor, “O que não admira, nem provavelmente consternará
é se este outro livro não tiver os cem leitores de Stendhal, nem cinqüenta, nem
vinte, e quando muito, dez...”
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Num outro
aspecto, pensa-se que esteja denegrindo a imagem, mas, em verdade, está
enobrecendo. A obra tornou-se universal. Até para denegrir a imagem é preciso
conhecer como a empreender. Pode estar servindo a um enaltecimento.
O homem
se modifica, muda-se, transforma-se, burila-se, aperfeiçoa-se, delineia-se,
purifica-se, mas o mundo continua da mesma forma, seguindo o seu ritmo cada vez
mais acentuado de desgraças, destruições, arbitrariedades, gratuidades,
alienações, falsas modéstias... O mundo será o mesmo seja aqui no século XXI,
seja lá no século XXX.
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Alguns
homens não nasceram irresponsáveis, tornaram-se, e nada irá modificar esta
realidade, seja aqui do lado de cá das arribas, seja lá nalgum rincão do tempo.
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Se
incomodo, se provoco náuseas aos espíritos bem comportados, não há outra
alternativa senão me alegrar, felicitar, contentar com estas opiniões. Digo,
com empáfia, que a carreira segue os seus rumos, o seu itinerário, respondendo
às intenções.
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Lembrou-me
que os burgueses franceses recorreram ao Presidente da República francesa,
pedindo-lhe que prendesse Sartre, estava incomodando bastante. Com efeito,
Sartre dera uma risada primordial, não sei é se ele embaçou as cericórias, sei
que reconheceu as escórias. Sartre ficaria exultante se lhe dissesse que a sua
risada embaçava as cericórias. A risada deve ter-se intensificado, aquando
Sartre soube que o Presidente se recusara a atender os burgueses, dizendo que
não podia prender um Voltaire, com certeza no outro dia estaria fora da
Presidência.
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Seria até
mais conveniente dizer que as intenções outras não são senão de me esconder de
por trás da erudição para envelar as arbitrariedades, gratuidades, podridões
interiores, estaria mais em nível da linguagem usada. Se houvesse esta
intenção, não lançaria mão de erudições, ao contrário, lançaria mão da
vulgaridade e baixaria, e assim superaria os monstros que se julgam sagrados,
transcenderia com perspicácia e destreza. Dizem que um homem consciente de suas
arbitrariedades vale por dois que as escondem. Sou consciente delas. Mas para
se atingir este nível de consciência depende muito de experiências verdadeiras.
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Quem sabe
pudesse dizer, risco haveria de ser uma interferência que prejudica o
encadeamento das idéias, a rede de pensamentos e intuições surgidas ao longo de
instantes em que não se tem mesmo qualquer vontade ou necessidade de questionar
as situações e circunstâncias em que estou envolvido, dizendo que o solo tem
certas características, isto olhando uma casa que está sendo construída do
outro lado da rua, antes de se construir a casa sobre o solo, ele tem certas
características (das quais a casa é, ela também, parte integrante), as trincas
nas paredes revelam, de maneira desagradável, que tais características eram de
aluimento. O futuro não inventa, nem cria, as características do passado, mas
as sistematiza na medida em que ele próprio se realiza.
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Nascimento
significa o genuíno, o ingênuo, a pureza, o desunir do todo, aniquilação da
doída e con-doída individualidade, afastamento de Deus, re-tornar ao Todo,
chegar a ser Deus; quero dizer: ter buscado cristianizar a com-preensão e
entendimento de Deus, ter ampliado a dimensão do espírito de tal modo que se
mostre possível voltar a conter de novo o Todo.
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O que me
importa a mim é o que o rio me comunicou, às vezes não só difícil e complicado
entender, mas impossível de sentir realizado, o fato de que o tempo não existe.
E, pensando nisto, interrompo-me e percebo de imediato estar a cofiar o bigode
com o dedo indicador e polegar, com as pernas inda cruzadas sobre a cadeira e
com o braço direito estirado sobre a perna direita.
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Para quem
todo o passado não é estrada de um diminuir, mas, ao invés, um prado enorme que
nenhum inverno nunca toca, possuo a arte e engenhosidade de ouvir os sons que
se me apresentam ao espírito, aos ouvidos; reclino-me, então, na cadeira,
desembainho um olhar afiado e comprido ao longo do quarto em que me encontro
ora, dando continuidade ao trabalho.
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Os
homens, não sabendo quem sou, e o que lhes importa saber quem sou, não lhes
interessa um poucochinho que seja, falam, olham, gesticulam às vezes de modo
áspero, às vezes num estilo sereno e comedido, ao tempo que olho só, ora fixo,
ora móbil, levando a astúcia a ponto de olhar para dentro de mim, porque deixo
cair as pálpebras; mas como as pestanas são destinadas a permitir seus
deslocamentos angulares relativos, o olhar continua a sua trajetória da
percepção e da intuição ao longo do quarto em que me encontro nele.
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Digo que
o sentimento íntimo é movimento, circulação. Ai, no subir de mim, nesse criar
do nada, perfeitamente absurdo, porque do nada nada se cria – e eu criei -, sou
uma vida que se volve sobre si mesma para atingir a realização do humano na sua
singularidade. Mas esse mesmo subir é ininteligível como subir uma montanha
descalço, porque eu não subo além do que faço para me ver fazer, porque o meu
agir é apenas simultânea consciência desse agir que dele se não desprende.
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Sei-me
como homem que atua ou pensa, mas não vejo o “eu” a atuar ou a pensar. Sei-me
como homem quem fala, constrói sua vida com palavras, termos, metáforas, mas
não sou capaz, em hipótese alguma, de perceber as palavras sendo pronunciadas,
os seus inúmeros significados e sentidos, não me é possível agarrar as
palavras, tocá-las como se toca uma cericória.
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Consegui,
não sem alguns sofrimentos que não eram necessários passar, romper a solidão,
aquela de sair e perambular pelas ruas sem rumo nem destino, porque a arranquei
das mesmas portas do inferno e consegui despertar-me, re-nascer.
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Bocejos
inscrevem a mesma atitude de afeto... Palavras algemadas, sem margem de
possível sublimação, tecem, na oponibilidade de um dedo aos outros, a falha de
gestos; cerram da súbita idéia de evidência o emudecer que me violenta,
reduz-me a qualquer manifestação. Se retorno a uma idéia, a um pensamento de
outrora, à jorna da astúcia e perspicácia, lembra-me de não me afastar do
sentido e significado, isto é, que, aquando se sente as algemas doerem, é
momento e instante de a liberdade estar muito próxima. Aquando se sente a
náusea, sem compreender e entender o seu objeto, significa que a ignorância
está preste a ser superada, mas isto também depende de se poder investigar o
que realmente acontece.
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Parvo
crocitar tateia do mundo a realidade da língua. O som existe no coaxar absurdo,
no gralhar descoordenado e informe. Toda a gralhada alheia passa por mim – a
claridade turba-se, certa impotência atinge a pronúncia, o labirinto de um
caminho imprevisível.
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Talvez
não devesse, em hipótese alguma, ceifar a idéia com questões, quem sabe,
alheias e inúteis no contexto, mas me não posso deixar de furtar-me a dizer que
nada justifica ou explica isto de exprimir o que os homens entendem e
compreendem agora, mas despertar neles a busca de entendimento e compreensão é
que identifica a continuidade da vida, e o que é expresso ser uma semente de
questionamentos ao longo dos séculos, milênios, sem limites e fronteiras. João
Ubaldo Ribeiro fora sim feliz, dizendo que o escritor que não causa polêmica é
um imbecil de todo. Isto é que torna a vida sobremodo interessante de ser
vivida, de ser experienciada.
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O que
“reflexo baço e ilusório de uma cericória” revela de uma imagem profunda, algo
que fosse necessário espremer os miolos para uma compreensão e entendimento? É
muito nítida e límpida, não deixa qualquer questionamento a não ser que o
estilo de morte dá lugar a um estilo vulgar. Se esta imagem é uma preocupação
com o insólito, digamos que o autor se preocupa para se apropriar de sua
preocupação e nela encontrar algum sentido de vida e de morte.
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As
futilidades ficam para amanhã, se houver algum tempo.
Desgraça
pouca é miséria, e miséria muita é “tiquinho”, e assim cada indivíduo traz a
sua porção de sublime e arbitrário, de divino e analfabeto, de sagrado e
pecador, nesta comédia dos contrários e contradições, dos paradoxos, a sombra e
a luz, simpatia e apatia, verdade e erro, ao passo que a vida tem assim uma
regularidade de relógio, e a melancolia do desamparo. Despido de quaisquer
outras circunstâncias, o ato de ter consciência de que, ao tragar a fumaça do
cigarro, a nicotina vai direto para o pulmão, estou cavando a sepultura lenta e
paulatinamente, tudo isto é bonito, porque exprime um justo escrúpulo, de que
sei os prejuízos que sofro, dos quais sou uma vítima em potencial, um
sentimento de alma delicada.
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Um todo
imenso, as vistas vagueiam ao longo do horizonte, sem se fixarem em ponto
algum, apenas buscando inteirar-se da imensidão, do que ela pode significar na
vida, e como que envolvido por uma neblina, estende-se de imediato frente à
minh´alma. O ouvido entrega-se por completo ao som da música, modificando os
sentimentos e emoções, levando-me para um campo aberto e, com o fechar dos
olhos, levo-me nas asas de uma águia, que, por aventura, decidiu voar ao nível
do solo, perde-se, da mesma forma que os olhos, e ardentemente aspiro a
abandonar-me por completo, deixando-me impregnar de um sentimento único,
sublime, aconchegante, um vento tranqüilo e sereno a perpassar a medula.
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O dia,
cortado de silêncios, tem a melancolia de uma grossa e densa poeira de luz. A
luz, de forma branca, movendo-se, por vezes, de leve, torna-se pálida, cheia de
mortificação, esmagando a terra, tocada pelo sol oblíquo, que se afunda
sinistramente nas sombras vaporosas. O sol, cor de fogo, amarelado no infinito,
de um amareliçado de silêncio negro, de um som leve, ruído tênue, de uma
esponja jogada e arremessada na lagoa de uma água parada, em que há uma crosta
de sujeira em sua superfície, mosquitos e moscas sobrevoando a ínfimos metros
dela; o amareliçado, de um silêncio negro, entristece e causa náuseas e vômitos
como o que cai da abóbada de um sepulcro.
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Não me
recorda estar, de madrugada, tentando conciliar o sono, após ter acordado,
qualquer pensamento ou idéia neste sentido, antes de abordar o dia, cortado de
silêncio, a manhã que se manifesta nítida e plena, não pensei em nada disso;
não posso, contudo, dizer que nalguma madrugada não tenha estado a pensar e
sentir isto no espírito e na alma, e só agora me vem ao espírito e alma num
estilo mais inteligível, consciente. Ajudam-me estas imagens todas, antes de
apresentar este dia, cortado de silêncio, a compreender e entender o que se me
revela ao espírito, o modo e estilo que me sinto, as emoções que perpassam o
íntimo, os pensamentos que sobrevoam as indagações e questionamentos.
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Então um
silêncio, longo, enorme, estende-se pela sala de estar. Ouço-o nítido,
metálico, vem do lado de lá das arribas, vem do lado de cá do subsolo. Aos
confins da eternidade, ao vazio do horizonte... A vida enviou o seu Silêncio, o
que é isto a Vida estar em silêncio. A morte está próxima, a morte da
humanidade, se não se aprender a sentir a Vida.
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Detesto
as recordações, não tenho passado, não o desejo. Rompi com os ajustes de
minérios. Tenho diante de mim o original de que não sou senão a criação; a
essência encarnada de tudo o que me falta: esta faculdade de sentir prazer com
a consciência, de impor-me à sorte e de não ceder a mui poucas metamorfoses. As
letras tornar-se-ão o verbo encarnado. O ardente aspirar pelo reino do espírito
em eterno conflito com os mistérios das águas em mim, com a inocência da
natureza, igualmente sagrada e fascinante.
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A lenta
decomposição da felicidade que me anestesia para me fazer enganar que o tempo
passa em vão e que ando em passos lentos, um mergulho em mim com uma lentidão
precisa e segura, um nada irreal, de escafandro. Não é verdade que não exista
amor feliz. O que acontece é que a felicidade dá tempo ao tempo e a agonia
busca solidão de arriba.
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Por
limites, as águas apartam da morte olhos perspicazes, não perturbados pela
angústia. Muitas vezes. Muita vez quando a luz se apaga sobre a minha insônia,
pergunto-me - fazia-o mais assiduamente - com os ossos entre(dedos): de onde
vem esta indiferença? De onde me vem este mal-estar que não me permite estar em
lugar algum? Deixa-me quieto a perguntar. Quieto e confortável em presença de
alguém? Costumava acordar no meio do sono, respondendo a perguntas não me
lembrava haver feito - sabe que, às vezes, digo algo e não sei o que digo,
minutos após, - ao menos articulado.
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Talvez
seja infame, mas é o único modo de orientar na forma como experimento a
realidade. Afigura-se-me serem a subjetividade, a sensibilidade humana. Todos
os caminhos levam a elas. Busco o ritmo de árias antigas. Ainda em sustenido
pânico, vejo: aquilo pelo qual me sinto desde sempre fascinado não é a morte
propriamente, é a beleza, a beleza que busco permitir-me sentir. Ao invés de
evitá-la e fugir, re-visto-me de calma, vejo o que até então só me permiti
furtivamente: eu, na minha perigosa integridade, afogueado e lúcido. Sinto-me
impressionado pela unidade desta vida.
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Estou
alegre e agradecido de sentir ainda em meu coração, de voltar a olhar a própria
vida com olhos in-flexíveis e res-plandescentes, em que volto a re-conhecer na
casualidade um destino e nas ruínas de minha vida fragmentos espirituais, à luz
do passado que no seu crepúsculo ainda irradia um doce resplendor, o homem
cheio de fé e de alegria, sempre ao encalço do grande e do eterno, nunca me
contentando com o rosto muito bem delineado e modelado, o nariz empinado, as
nádegas arrebitadas, a costura da calça entre elas, uma bolsinha dependurada no
ombro, nos quais não faltam nem o célebre fogo do olhar nem os passos de
solitário com uma rápida sombra de amabilidade e cortesia, detalhes que devem
exigir a sagrada chama da juventude há tanto tempo extinta. Só me recorda o seu
jeito demasiado imperfeito - aprendo nos minutos a dialética do interior,
envolvida na relíquia do sentido e do silêncio.
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A fim de
que me não entristeça, interrompo-me. Intenciono ser, isentar-me, ir ficar no
espírito, ser ele, entregando-me inteiro. Nenhuma satisfação me parece
pertencer. Sou tão feliz, e de tal modo mergulhado no sereno sentimento da
minha própria existência, que me esqueceu a minha arte. Sendo o único a
gozá-la, faço-o tão somente por orgulho e picardia. O desejo de amor
in-terpenetra à lembrança do labirinto cujo estranho e patético rumor chega
através do êxtase. Talvez com a linha do sol crocheteie imagens de um re-nascer
de espectros. As palavras, os modos, as atitudes, a voz dócil e meiga, o corpo
são uma saudade plena e absoluta da vertigem do despertar.
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As
ilusões e intrujices, no roçagar da pena, emitem o ruído com grande energia e
esfrego as mãos como se estivesse meditando, e quando me pergunto se expresso a
verdade que me a-colhe no re-colher da idéia, respondo: "Ora, fique quieto
e se deixe levar".
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Para
pensar, escrever uma comparação, sobremodo esta “reflexo baço e ilusório de uma
cericória”, é necessário ser; o mínimo pensamento ultrapassa o ser
instituindo-o para outrem; faz-se isto num abrir e fechar de olhos: é o absurdo
e definitivo nascimento, acontecimento indestrutível que se transforma em
realização e define a singularidade de uma vida pela sua vocação de morte.
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Memória
do futuro e destino do passado possam parecer contraditórias e arbitrárias, e
na verdade o são e os seus conceitos e significados se chocam e se contradizem
(comumente a memória diz respeito ao passado e às coisas ausentes, mas vivas,
ou melhor, mortas, porque acontecidas, a matéria do destino é sempre o futuro e
as coisas latentes, lívidas, ainda por acontecerem), só recorrendo a uma
arbitrária e contraditória aproximação, a um símile ou metáfora.
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Lá fora,
há um silêncio como se nada existisse. Não tenho dúvidas de que há quando o
desejo é de não estar aqui, deitado na rede no alpendre de minha residência,
mas além do portão presenciando e participando dos acontecimentos quotidianos,
envolvido com eles até à medula espinhal, mas sinto em mim o desejo de alguns
instantes de relação e contato com quem sou, sonhando, inerte, olhando as
coisas sucederem-se aqui e ali, distante de tudo e de todos.
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Distante,
sim, dos sonhos e de suas realizações – aquando tudo não passava de quimeras e
fantasias, de fugas e medos de me olhar de frente compreendo o abismo em que me
encontrava e, infelizmente, não se manifestava qualquer modo de superar, de
transcender, e isto me fazia sofrer, um travo enorme na garganta, o travo de
quem indaga de si mesmo o que é a vida senão um amontoado de pensamentos e
idéias efêmeras e fugazes, um reflexo baço e ilusório de cericória.
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É o autor
desta comparação que desejo construir, não tal como é para si próprio, mas tal
como sua comparação o identifica, como quer compreender a desrazão razoável que
o produziu.
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Se é que
pudesse comigo pensar que prefiro estas horas de solidão, apraz-me a
convivência com ela, sinto-me mui bién, diria com alguma categoria que não é a
solidão que desfruto, mas é sim uma esperança de encontro e perda das coisas
contingentes e naturais.
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No
infinito, fulgor duro do céu, ronda em torno da luz, suave e lentamente, um
abutre, que, na vibração inexorável da luz e da iluminação, parece de longe um
bolor de senilidade e de abandono.
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A
abóbada, lúgubre, manchada de cor de ruínas, cola-se, soturnamente, neste
silêncio negro, uma chaga a cobrir de fios e de lençóis, a estender por cima de
faces mortas e dilaceradas pela ação do tempo, desfazendo-se e decompondo-se
pelo rito latino e grego, tímidos de sangue, percorrendo desesperadamente o rio
que corre eterno, pleno e sereno entre as ruínas das religiões e os túmulos das
dinastias; entre a luz da vela amortecida, esmorecida e enlanguescida,
fumarenta e vermelha; por entre uma ruela e caminho áspero e de longo fôlego,
por onde tem descido um som longo e espreguiçado de buzina morta, na sombra,
sombra esta envolvida num bolor de ruínas, catástrofes, tragédias, velhices,
estrelas que desmaiam ante a mesma luz de tom magoado e entristecido, a cor
doída e angustiada, velando de sombras a nudez de olhos remelosos onde
fervilham moscas, tremendo na vibração de um olhar entenebrecido como um céu
onde vai trovejar, como um grande vento da natureza.
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Disse-o
anteriormente haver quando não tenho qualquer vontade, desejo de crescer, e
isto sobrevém muito nítido nisto de agora não estar interessado em tecer
justificativas e explicações, de explicar e fundamentar o interior de meu
pensamento, e, por isso, acredito o melhor é mesmo transcender esta realidade
numa linguagem poética, assim não tenho qualquer obrigação de apresentar as
idéias fundamentadas e coerentes com o processo de uma investigação das
profundidades do ser, de me posicionar diante de alguém dizer que sente náuseas
– diria que a experiência da náusea é riquíssima para quem tem fôlego e coragem
de se refletir nela, um momento de busca de conhecimento e posturas.
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Aliás, a
linguagem que escolhi nada tem a desejar dos conceitos e definições do
romantismo, uma fuga eminente da preocupação com a objetividade e clareza dos
pensamentos, da sensibilidade, até mesmo dos desejos mais profundos do coração
de nada haver nele de uma única palavra ou termo, mas simplesmente nele estar habitando
o vazio, e assim a comunicação plena da pureza dos desejos e contemplações do
mundo.
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A tarde
diminui-se, esvaece-se, perdendo-se num imenso e incomensurável espaço de vinte
e quatro horas. Uma realidade a separar-se e desunir-se dela, formando um longo
abismo, a alterar-se, alterar-se, a engrossar-se, e, para cá da realidade,
nuvens, incongruências, anomalias, incoerências, contradições, antinomias. São
restos de realidade, são farrapos de sonhos. São dolorosos e doridos pensares
numa inteira despersonalização e quebra de individualidade.
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O tempo
não é o que havia sido. Num átimo, não será mais o que está sendo. Tornou-se
lânguido, tênue, frouxo, desenxabido, podre, destilado. Tornar-se-á perdido,
confuso, lento, cheio de soluções de continuidade, vazio de alterações de
parâmetros e imobilidades, e nestes hiatos vertiginosos de alterações de
parâmetros e imobilidades perco-me, deslizo-me, escorrego, os olhos turvam-se,
numa sensação de queda ou vôo, de fracasso ou de vencimento, de inferioridade
ou superioridade, de certeza ou incerteza, de caos ou de cosmos.
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Nesta
diminuição e esvaecimento do espaço de vinte e quatro horas, as lembranças e
recordações aparecem juntas e conciliadas, como se a formar um todo
indissolúvel e indestrutível, confusas, sumindo-se de repente, pois a junção e
conciliação não demoram muito, exigindo a presença e a ausência, deixando-me no
interior sulcos sombrios, vaporosos, negros. A sobriedade e negrume criam
hiatos que se sucedem ininterruptamente, afastam-se e desvencilham-se da
realidade, com convicção a dar-me um ar estrangeiro, esquisito, vago, perdido. A
vaporosidade adelgaça a memória ressurgida, o nevoeiro mental e consciente
alimentam o descartamento das figuras em redor, numa indolência, bafúrdia,
vagabundagem, destraimento de uma inteligência baixa, de uma baixeza de
inteligência distraída, desinteressada.
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Às vezes,
deixo as idéias estapafúrdias seguirem seu curso. Imagino se nalguns momentos
da vida não teria sido conveniente um amor libertino com alguma prostituta, com
muitas juras de amor e fidelidade, olhando as estrelas no céu, até que alguém
íntimo vendo tanta atitude sem nexo e propósito fosse retirar-me desta paixão
libertina. Concordaria que a imagem “reflexo baço e ilusório de uma cericória”
manifestou a plenitude de minha verdade. Quem o disse, fora muitíssimo feliz.
Ter-se-ia de tecer-lhe os mais profundos encômios. Difícil encontrar homens que
se dignam a assumir quem realmente são.
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A tarde,
através de seu sol ameno, raios frios e destilados, vão criando uma sombra
razoável, quase desconhecida e anônima, não pelo seu conteúdo, mas pelo seu
tema de esvaecimento das trevas mentais, procurando em vão agarrar as idéias,
burilá-las, limpá-las, vesti-las de significados e conotações.
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O final
da tarde causa-me uma fissura, uma ansiedade, um tormento, uma vontade de
torturar-me para tirar e arrancar do interior nebuloso e sombrio meia dúzia de
linhas. Não consigo fazê-lo, no entanto. Sinto-me indiferente e murcho, como se
a tarde não estivesse terminando para mim, mas para outros homens, incapaz de
vencer e superar uma preguiça e enlanguescimento enorme subitamente aparecido,
deixando-me na superfície por algum tempo, querendo dar-me um súbito mergulho
nas profundezas e profundidades, embrulhadas num sorriso de existente, a
humanidade incapaz de uma verdadeira nobreza, de um porte polido.
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Impossível
fixar as vistas num ponto qualquer, sabendo que a tarde se vai, estou aqui
sentado, fumando, olhando as horas passarem, sem mesmo sentir o pensamento
delas, a memória se embotando, observações imperfeitas e desconexas
atabalhoando-se incoerentes e contraditórias, deixando largos espaços obscuros,
desagradável isso, começando e iniciando a percepção em redor de uma indecisão
a fervilhar, uma grossa neblina a boiar na realidade inconcebível, na
humilhação atordoada, nos horrores fictícios da existência.
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No clima
de doidice infernal, tudo se volatiliza e evapora. Sinto-me nojento, sujo,
imundo, coberto de Caracas, quem dera pudesse sentir-me expulso delas!:
partículas de imundície alcançam horizontes perdidos, tomam conta de mim,
envolvem-me por inteiro.
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Tenho o
estranho hábito de coibir-me. Sinto-me fraco. O cansaço amassa-me, amarra-me
com uma grossa corda. Resta de mim a mim um morno fastio, desejo de
aniquilar-me, acabar-me de uma só vez, aumentando-me, diminuindo-se,
aproximando-se, afastando-me, fundindo-me, desagregando-se, isento de
significação, conotação, sentido, rasgando-me por completo, frangalhando-me a
educação, os pudores, os pudicismos, as falsas modéstias, as prepotências
incoerentes e em desarmonia com as atitudes e ações, acabando com os retalhos
de minha moral, delicadezas, preconceitos.
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Experimentaria
a morte num desamparo de um sacro vazio. Viveria o desenlace final em eximir-me
da consciência, ignorando o que perdia, numa loucura ao mesmo tempo fria e
quente, exuberante e fervilhante, diluindo-me inconsistentemente. Nesta
loucura, fragmentos e cifras de idéias embrulhadas, machucadas, cortadas,
ceifadas, retalhadas, fervendo-me na mente. Seriam sombras de um passado morto,
tornando-me crédulo em demasia, em redor de mim tudo demasiado alterado,
alterando-se, as idéias escassas compondo-se novamente.
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A noite
chega. A escuridão parece-me vaga, incompleta. Só os caracteres e
características mais fortes e consistentes conseguem definir-se aos meus olhos.
Consigo novamente embeber-me na esperança, reconquistar a minha liberdade,
compondo as letras, vivificando o meu juízo. Embalo-me em um entusiasmo, em
frágeis e consistentes esperanças. Acho-me capaz de reflexões úteis, povoada de
caracteres regulares, circunstâncias delicadas, agradáveis, deslizo-me em
lágrimas fáceis, sentimentais, românticas, reconcilio-me de utilidades em
aparências de firmeza, convivências prolongadas, momentos de otimismo fugaz
dão-me a esperança de minha comunicação tornar-se fácil, inteligível.
#RIO DE
JANEIRO, 28 DE MARÇO DE 2020, 12:05 p.m#
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