DESDE AS PRÉ-FUNDAS DO NADA... GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferrreira Neto: SÁTIRA
Ao nada de todas as pré-fundas! – isto se a idéia
de serem di-versas e ad-versas é verdadeira, pois que pré-funda não existe, o
plural é metáfora de sarcasmo e mofa – é o que em questão de milésimo de
segundo me veio à cachola – não poderia chamar mente algo destituído de
qualquer senso -, fazendo-me rir, pois que jamais pensei haverem as pré-fundas
do nada, nas pré-fundas habitar o nada, o nada das pré-fundas habitar o homem.
@@@
Se isso me surgiu inesperado, algum sentido deve
haver, algo de muito distante, longínquo, trans-cendente se revelou no
espírito, tive tempo de assimilar ipsis litteris todas as palavras, o que senti
esvaiu-se de imediato, o riso me ficou na memória, não sabendo dizer se de
sarcasmo, ironia, cinismo, se de alegria e felicidade por algo inusitado se me
manifestar, dando-me oportunidade e possibilidade de re-(n)-“ovar”, in-“ovar”,
as sensações do mesmo serem dilacerantes, são de perfeita inutilidade, ser nada
o mundo, isto porque só o criar, recriar , pro-duzir fazem-me sentir sou homem,
habito o mundo. Ser nada sufoca, nós e mais nós górdios atravessados na
garganta, nem pedacinho de sapo seco por ela passa.
@@@
Tenho a certeza, leitor, de que já leu este início
umas três vezes para se certificar da razão de suas gargalhadas altissonantes,
se ri do sentido que re-colheu de minhas palavras, nas entre-linhas era o que
estou querendo dizer, ou se não passa de equívoco de sua parte, não é nada do
que está pensando, o que está entendendo é fruto de sua imaginação. Sabendo ser
eu homem em demasia sarcástico, mofo de tudo e de todos, tiro sarro das
idoneidades e das canalhices, as minhas intenções de gozação aqui estão inda
mais pujantes. Não se preocupe! Continue lendo e o sentido se lhe re-velará ao
longo da leitura, assim poderia rir e gargalhar à vontade, afianço-lhe que o
ácido crítico é daqueles.
@@@
Quando alguém se torna de renome devido aos seus
ácidos críticos, tudo o que disser, se avaliar com percuciência, tem mato atrás
do coelho, tem coelho atrás do mato. Conheci um locutor de rádio que passava
mais tempo na presença do delegado do que na emissora, tudo o que dizia era
crítica deslavada, tudo o que dizia era para lavar a alma das pessoas, o que
polícia queria saber em suas reuniões com o locutor eram as suas verdadeiras
intenções. O seu alvo preferido era os despautérios da polícia cível e militar.
O locutor só dizia que havia levantado inspirado para brincar com as palavras,
não criticara ninguém, o problema real era que as carapuças serviam a todos.
Aquando morreu, no cemitério estavam presentes a polícia militar e a cível em
peso, contavam-se nos dedos as pessoas comuns, dizem que só os parentes
íntimos. Entrei nessa de gaiato. Agora, tudo o que digo tem mato atrás do
coelho. Se nada tenho a dizer, se nada tenho a criticar, aproveito para brincar
com as palavras como dizia o amigo Fernando Neves.
@@@
Desenvolver a idéia de modo e estilo a mergulhar
bem fundo na intenção que me ocorreu tão logo em mim se re-velou, ser
sarcástico, irônico, cínico, com os absurdos e paradoxos da vida, os queixos
das pessoas despequem, a boca fique escancarada de cima em baixo, de orelha a
orelha, os olhos esbugalhados e brilhantes, o coração pulsando sem limites, no
íntimo a indagação caliente de serem quem na vida e no mundo, o que estão
fazendo aqui, outro lugar senão este seria o mais adequado e aconselhável, é
coisa dificílima de ser feita a critério, pois que se não me revelou o que
mesmo esta idéia trouxe em si, o que nela habitava, tão logo a revelação,
talvez até nada, palavras de quem nada tem a pensar, um despautério qualquer,
quero dar-lhe sentido para mais tarde não dizer que não mergulhei fundo no
absurdo, um momento de pura sandice, e não tive nem a ousadia de anotar nas
linhas de frases feitas – mesmo porque as sensações que me surgiram, os
sentimentos que me perpassaram, fizeram-me rir, não lhes dei a mínima atenção,
poderiam ser sementes para outras e também folhas do conhecimento de minha
árvore vivencial e vivenciária, des-cobrir ou des-envelar os mistérios, enigmas
de meu ser, o ser que habita o sou de meu eu, desde as pré-fundas do nada ao
nada de todas as pré-fundas.
@@@
Não perderia esta oportunidade por nada, mesmo que
tudo o que escrevesse a respeito fosse um festival de asnices, asnadas,
deixando aos olhos de quem nas linhas lê o sentimento de desconforto, de quem
se sente incomodado com alguma verdade de si próprio estar sendo dita, e ele
não pode, mesmo que espremesse os miolos, captá-la, pois que não estou sendo
claro na minha exposição da idéia do nada desde as pré-fundas, do sentimento
das pré-fundas desde o nada das idéias – como pode um homem gastar tinta e
tempo e nada dizer senão o nada das pré-fundas de si, de si o nada das
pré-fundas.
@@@
Fico pensando naqueles urubus sedentos de carniça,
críticos o são, sobrevoando o vale das letras apagadas em busca de sentidos em
estado de decomposição, aquela carniça, e só na sua cachola existem, o vale das
letras está limpinho, nada há. Como conseqüência de sua incompetência, sabe
dizer apenas que sou louco, varrido de pedra, não se deve dar qualquer atenção
ao que escrevo, não tenho intenções de dizer coisa alguma, estou apenas tomando
o tempo dos leitores, brincando com suas inteligências e sensibilidades.
@@@
Faz uns quarenta minutos – enquanto escrevo, passam
à velocidade da luz – que venho registrando tais letras à cata de inspiração
que eleve esta idéia desde as pré-fundas do nada ao nada de todas as
pré-fundas, desde o tempo em que Deus era sozinho na espiritualidade, nem lhe
havia surgido no Espírito a criação da vida e mundo – inda não me veio como
desenvolver esta idéia, sinto dificuldades de palavra em palavra tecer linhas,
entre-linhas, despautérios conjugados com absurdos, nonsenses com asnices, ao
final, conseguir mostrar o sentido que habitava as minhas palavras tão logo as
registrei.
@@@
Pode sugerir uma criação de minha parte, apenas
para me ver livre disto de desde as pré-fundas do nada ao nada de todas as
pré-fundas, não ser tachado pelos leitores de imbecil e idiota, de não me porem
na testa o rótulo de “eufemismo das pré-fundas”, pouco me importa, fato é que
um galo entra a cantar com a cigarra, um concerto de vozes, que me acorda
inteiramente de meus idílios das pré-fundas. Sacudo a preguiça, colijo os
trechos de sonho que me ficaram, se algum tive esta noite, e fito o dossel da
cama ou as tábuas do teto. Às vezes, fito um quintal de Roma, de onde algum
velho galo acorda o ilustre Virgílio, e pergunto se não será o mesmo galo que
me acorda desta idéia estapafúrdia que me entrou pela cachola inteira, e se eu
não serei o mesmíssimo Virgílio. É o período de loucura mansa, que em mim
sucede ao sono.
@@@
Subo, então, na memória, a Joaquim Felício, dobro a
rua “da grota”, esbarro com R. B., que me convida para um sarau literário com
os seus amigos, será um encontro das arábias, serão declamados poemas, lidos
ensaios sobre as nossas personalidades literárias – isto de fato aconteceu há
uns quatro dias, neste mesmo local, e depois de me despedir de R. B., não pude
me furtar ao riso e gargalhada altissonantes. Digo-lhe que não entendo bulhufas
de saraus, minha presença lá será um acinte às inteligências supremas de nossa
comunidade. Segue-se a voz de um passarinho, que me canta no jardim, depois
outro, mais outro. Pássaros, galo, cigarra, entoam a sinfonia matutina,
enquanto escrevo estas linhas na mesinha de meu quarto. Abro a janela.
Encosto-me ao parapeito dela, fico observando a nova manhã que surge no mundo.
@@@
Não me seria possível saber o que é isto desde as
pré-fundas do nada ao nada de todas as pré-fundas, a partir e por inter-médio
dos despautérios conjugados com absurdos, nonsenses com asnices? Despautérios
conjugados com asnices mostrariam apenas que as prefundas do nada são os homens
sem alma e espírito, corpo no mundo, são homens sem instinto, ossos na terra
que velam as nuvens brancas no céu; o nada de todas as pré-fundas mostraria só
que Deus deveria por sempre ser sozinho, nada criar, nem mundo, nem vida, não
haver homem, não haver coisa, não haver objeto, nem haver a subjetividade do
mundo sem nada, se é que esta idéia é possível de conceber, na sua concepção,
por ventura, não ser loucura insofismável.
@@@
Ah! enquanto vou escrevendo essas pré-fundas de
melancolias aborrecidas, esse nada de pré-fundas nostálgicas, o sol já cobriu a
terra inteira com os seus raios amareliçados; entra pela janela, já tudo é mar;
ao mar já faltam praias, dizia Ovídio por boca de Bocage. Aqui o dilúvio é de
claridade; mas uma claridade cantante, porque a cigarra não cessa, nem o galo,
nem o passarinho, continuam a cantar, fundindo o som no espetáculo de minhas
pré-fundas e nada.
@@@
Além disso, as asnices do nonsense nas pré-fundas
do nada seriam o sonho da presença do momento, os absurdos das entre-linhas
seriam o pós da ausência do tempo a quimeriar as ausências do tempo e de todas
as dimensões do extra-terreno, do terreno dos extras, excluindo o baldio das
terras inóspitas e largadas à mercê dos séculos e milênios.
@@@
Para mim seria a coisa mais sublime olhar a vida
sem avidez, e não como cães, com a língua de fora. Olhar as pré-fundas sem
orgulho, e não como urubus, com a cabecinha para baixo, perscrutando alguma
carniça à vista. Ser feliz na re-flexão das idéias que me surgem
inesperadamente, com a vontade morta, isento de capacidade e de apetite
egoísta, frio de corpo, porém com os olhos embriagados do nada, con-templando a
lua cheia que cobre a terra de luz. Para mim seria o melhor amar a terra como a
luz a ama, e tocar a sua beleza apenas com os olhos.
@@@
Eis o que denomino o imaculado conhecimento de
todas as pré-fundas do nada, do nada de todas as pré-fundas: não querer das
coisas mais do que poder diante delas estar.
@@@
As minhas palavras são rudes, cínicas, sarcásticas,
irônicas, desdenhadas e disformes: a mim agrada-me recolher o que cai da mesa
nos banquetes suntuosos dos COVIS DE GÊNIOS.
#RIO DE JANEIRO, 24 DE MARÇO DE 2020, 12:52 p.m.#
Comentários
Postar um comentário