#NO VAZIO, UM CORPO ESTRANHO# GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: PROSA
No vazio, um corpo estranho. Dilata, quando o sol
está amareliçado e brilhando, deixando pingar no chão as gotículas do amarelo,
de sua tinta. Comprime, quando é sombra violácea ou chanfrada. Nos olhos
envidraçados, envoltos no tênue e irreversível nada, envelados no duro e
espesso fio do tempo extinto, a dor viva, "estribuchante",
tremulante, exposta, espontânea e livre. A dor nos olhos. O vazio vai furando
feridas, como um punhal. Mexe e remexe. A dor em todos os sítios, em sítio
algum. O translúcido de ponta a ponta. A claridade até ao fim.
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Alvorece
Infinitas emoções perpassam-me o íntimo
Pássaros gorjeiam, saúdam o tempo de novos sonhos
Uni-vers-itudes re-nascem de primevas utopias do
ser
Plen-itudes nascem lívidas de vernáculos de antigos
desejos
Con-templo fora de minha porta no longínquo eterno
do horizonte
Esperanças enovelando estesias de velhas idéias,
pensamentos
As etern-idades são flores amarelas de ipês que
tapeteiam as calçadas
Brilharei de luz, trilhando as estradas,
E, atingindo o projeto do além,
De onde con-templarei as gaivotas à beira mar,
As águias alçando vôos no infinito,
Os lobos uivando no ápice da colina, orvalho da
noite
Ouvirei o canto da coruja nalguma galha de árvore
Quem sabe me diga em silêncio:
"Andar andei... Andei muito
Mas eis-me aqui
Sou o além que as estesias de sonhos, de verbos
Me fizeram, re-versaram, in-versaram
Sou o além que as linguísticas de cor-agens, de
utopias
Elencaram, re-colheram e a-colheram nos
interstícios de projetos
Sou o além-aquém que as semânticas de entregas
ministraram
As lições do empenho e empreendimento,
perspicácias."
Sou o aquém-além:
Verbos de etern-idades flutuam aos meus olhos
Verbos de etern-itudes pervagam-me o íntimo
Verbos de uni-vers-itudes são sementes de outros
passos
Verbos de in-fin-itudes são húmus que alimentam o
verbo de amar,
Verbos de nad-itudes são águas que saciam os
desejos do sublime.
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Estou suspenso no tênue fio do tempo. Meus olhos
tergiversam-se. Sou-me inerente. Fixo as vistas num monte de papéis rasgados e
amassados. Uma lágrima insiste em deslizar-se em meu rosto, mas nada permite
este ato. Meu corpo jaz em cima desta ponte. Está inerte. Fixo-me no dedo mínimo.
A princípio, consigo delinear a sua forma, o seu comprimento. Tudo escapa. Um
mosquito voa, emitindo um som angustiante. Pudesse, iria acabar com sua vida,
cortar-lhe em pedacinhos ínfimos. O máximo: suportar este barulhinho infernal.
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Alvorece
Luzes, palavras, sons
Versejando no silêncio dos sentimentos
Volúpias, êxtases, sorrelfas
Etern-itudes de etern-idades velam as carências do
ser,
Sussurrando estrofes que sibilam nos interstícios
da alma
Etern-idades de etern-itudes des-velam a felicidade
do verbo
De ser, murmurando esperanças, outras esperanças do
uni-verso
Vedas: "Let it be".
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Oh tu,
Quê in-finitivo de vozes
e náuseas,
Irás suspender as chamas
da vela,
em sete braços do castiçal...
Uma presença de nebulosas brumas. Um frio
envolvente e espesso, transformando tudo, infiltrando-se no gosto agridoce e
pastoso, iluminando uma presença que aparece ausente, nas suas circunstâncias
de medo e pavor.
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Poiésis da aurora
Festejando, dança de querubins, o espírito de
outros verbos
Que nascem lívidos de olvidados sonhos
Tempo de compor o vernáculo da alma
Enamorada da vida de outros horizontes, universos.
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Demônios cinzentos, adocicados. Um inferno frio,
estupidamente gélido, vai até os ossos. Os antes foram excluídos e, no íntimo,
uma presença forte, compacta, decisiva. Na absolutez e totalidade, uma sensação
livre. A existência é absoluta. No prosseguimento, a luta constante dos
absolutos. A morte é absoluta. O tempo a matar cada absoluto. O absoluto maior,
aproximando-se.
Tudo em mim pesa. Nem mesmo um guindaste seria
capaz de levantar-me a cinco centímetros do chão.
Caminho. Olho para trás a todo instante.
#riodejaneiro#, 30 de agosto de 2019#
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