**MINHA VIDA, ONDE VOCÊ ESTÁ?** - Manoel Ferreira
Há instantes em que penso
pre-fundamente, tendo eu tanta habilidade em me relacionar intimo com as
palavras, e haver coisa que não consigo dizer, talvez devido às tramóias e
tripúdios do inconsciente, não sendo isto, talvez medo de expressar coisas
muito particulares e não ser entendido, falta-me a cor-agem. Não chego a
qualquer conclusão, resta-me ir seguindo sem dizer, inda acreditando chegará o
tempo, quando será dito com todas as letras.
A vida está passando, muito diferente de o tempo está passando. Jovem, o tempo
passa, vai passando. Na minha idade, a vida está passando, e passando rápido,
amanhã mesmo poderá ser o último suspiro.
Não sei se terei agora engenho e arte para dizer. Entretanto, nada custa
tentar, mesmo que algo fique por ser dito. Inseguranças, dúvidas, buscas por
todo o caminho. Sorriso frágil diante de ínfima resposta, servindo dos impetos
e compulsividades, paradoxos para sentir a felicidade, ser esta ínfima resposta
a felicidade, e logo, logo, vendo não o ser, ilusão apenas. Continuam os
desejos, vontades, as buscas. Pergunto-me circunspecto e introspectivo, naquele
tom de questionamento profundo: "Será que não vou viver a vida?" Sim.
Isto mesmo. Nunca vivi a vida, não conheço o que é isto, a minha vida.
Enveredo-me por aqui, por ali, meto as mãos nas cumbucas, e nada, a minha vida
não se revela.
Se digo a alguém isto, com as mesmas palavras, logo me diz que isto é do
escritor, não sou quem está dizendo, sim o escritor. O escritor é o eterno
insatisfeito, inquieto, não aceita as coisas por aceitá-las simplesmente, quer
a verdade. Ouço em silêncio, por mais que explique e até fundamente não
adiantará, o escritor estará sempre na pauta, jamais verá o homem, o indivíduo.
Amo, quando ouço amigos chamar-me Moreira, Manu, carinho, amizade, ternura,
amor, para eles sou o homem. Aquela coisa de discernir as coisas: o nome real
se tornou o que re-presento, o escritor, os nomes carinhosos e sensíveis são o
ser de mim com quem eles convivem, os sentimentos trazem em si dentro por mim.
E não é nada disso. Jamais vivi a vida, nunca conheci a minha vida, sei não ser
a que nas sendas e veredas vou vivendo, vou sendo-aí, aí-sendo. E estou
sentindo mui pré-fundamente a vida está passando, passando na velocidade da
luz, amanhã poderá ser o último suspiro, e não vivi a minha vida, não a
conheci. Angustio-me, entristeço-me, circunspecto-me, introspecto-me,
ensimesmo-me, e vou seguindo. Ao deitar-me para dormir, antes de conciliar o
sono, fico pensando onde é que a vida está, talvez a tenha perdido nalgum érito
do passado, investigo-me, investigo-me, e não encontro o lugar onde a perdi.
Durmo com o sentimento de querer a minha vida. Andando pelas ruas, alamedas,
avenidas, vou pensando sobre morrer sem ter vivido a minha vida. É chegado o
momento de outra vez colocar a mochila nas costas, buscar a minha vida, ser a
vida que está latente em meu ser, em meu coração.
A vida passa. Encontrei a vida do escritor, vivo-a. Mas o que desejo mais que
tudo é a vida do homem que sou.
Manoel
Ferreira Neto.
(16 de março de 2016)
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