MESTRA RITA HELENA NEVES E MANOEL FERREIRA NETO DIALOGAM SOBRE A IV PARTE DE /**NÁUSEA DO VAZIO/VAZIO DA NÁUSEA**/
Rita Helena Neves - Muito, muito triste o texto, poeta...
Manoel Ferreira Neto - Sim... Depois da crise de vazio, adveio ao
personagem tristeza sem limites, tristeza profunda.
Rita Helena Neves - Sinceridade?! Não gostei. Metamorfose da metamorfose
da metamorfose da tristeza sem fim
Manoel Ferreira Neto - Sem uma fresta de luz... Re-presentei o mundo de
uma pessoa após uma crise forte de vazio. Crise que re-vela a ausência da alma,
a ausência do espírito. O personagem é pura escuridão de si próprio. Ele é a
escuridão. Aliás, a crise de vazio acontece na madrugada. Diz ele que só tem
noção de ser noite porque, quando pronunciou a "palavrita" - não se sabe
qual "palavrita" é esta -, havia olhado para o quintal de seu casebre
e visto a noite.
Rita Helena Neves - O ser dentro do breu, trancado a sete chaves
Está bem escrito, é claro! Mas, uma escuridão que aniquila
Manoel Ferreira Neto - Mergulhou fundo, hein, Mestra, no mundo do
personagem. Não é o "Homem Contemporâneo"? O homem contemporâneo está
trancado a sete chaves na ausência de esperança, sonhos, utopias, ideais.
Rita Helena Neves - Não sei... Não é a náusea de Sartre, nem de
Nietzsche, ... Acho, Dostoiévski, talvez...
Manoel Ferreira Neto - Você é fantástica, Mestra. É a náusea
dostoiévskiana sim. As náuseas dostoiévskianas são abismais. Confesso que, em
1986, tive de interromper as leituras da obra dostoievskiana, estava
mergulhando num mundo de trevas, só escuridão. Fiquei um ano e meio sem ler
Dostoiévski. Neste tempo, adveio-me a náusea do vazio, acompanhada de angústia,
tristeza. Foi quando iniciei a encontrar a luz, a luz em mim. Libertei-me.
Continuei tranquilo a ler Dostoiévski.
Rita Helena Neves - Achei a escuridão da era medieval. Ah! Extrema! Sem
volta.
Manoel Ferreira Neto - Sem volta a escuridão da era medieval. Há
críticos dostoiévskianos que dizem a inspiração de Dostoiévski em sua obra foi
a Era Medieval, só em OS IRMÃOS KARAMAZOVI que ele se liberta da Era Medieval e
mergulha no mundo contemporâneo.
Meu primeiro texto abordando a "náusea" dostoievskiana. Os
personagens de Dostoiévski, após suas crises, não retornam ao mundo da luz,
para sempre trancafiados no breu eterno.
Rita Helena Neves - Exatamente. Drástico! A morte lhes seria uma benção,
ante a essa prisão na escuridão de si mesmos. Assim é Dostoiévski
Manoel Ferreira Neto - Assim é Dostoiévski. Kirilov, personagem de Os
Possessos, suicida-se para provar que Deus não existe. No interdito da obra,
Kirilov quer experimentar se existe luz além da vida, já que o seu mundo são
puras trevas. Está aí uma novidade. Sempre abordo a náusea nietzscheana,
sartreana, agora entrei na "nausea" dostoievskiana.
Rita Helena Neves - Uma existência "vazio do ser."
Manoel Ferreira Neto - Isso. O existir "vazio do ser" não é
buscar sentido da existência, não é suprassumir as dores e sofrimentos. Existir
"vazio do ser" é mergulhar na morte.
Rita Helena Neves - Luz existencial.
Manoel Ferreira Neto - Sim... Creio que o personagem, descrevendo a sua
crise, descrevendo o "após" crise, esteja desejando esta luz
existencial. O diário da crise o ajudará a encontrar esta luz? Luz nas trevas.
Terá de criá-la, inventá-la.
Rita Helena Neves - Resumindo: o ser só existe, isto é, tem vida, se
tiver LUZ!
Manoel Ferreira Neto - Com certeza. O grande problema dessa crise foi
revelar o mais íntimo do personagem, a ausência da alma, a ausência do
espírito. Se o personagem inventar a luz existencial, não será a luz que lhe
habita a alma, mas a luz exterior. Vou continuar escrevendo esta obra. O
personagem procurando a vida, procurando a luz existencial.
Rita Helena Neves - Exatamente. Não se existe só dá carne; há de se ter
o espírito. O espírito é a própria luz. Não é isso?!
Manoel Ferreira Neto - É isso. Nesta obra, o personagem é destituído do
espírito, ele é só trevas. Creio que por isto haja sentido profundamente a
crise do vazio.
Rita Helena Neves - Nem alma, só escuridão... Por isso sofre.
Manoel Ferreira Neto - Verdade sim. Ele é só escuridão. Não há qualquer
frincha ou fresta de esperança nele, totalmente destituído de sonhos.
Rita Helena Neves - Hoje, o homem contemporâneo, mesmo à luz do
conhecimento de toda a ordem, ainda sente a náusea...Seja , então, um mal
necessário e inerente ao homem que o sentir-se nas trevas é o mais alto grau
para o autoconhecimento?! Seja, então, esse estado do nada uma passagem
necessária ao reconhecimento da vida?! O ressurgir-se de si mesmo, numa metamorfose,
feito a fênix?! Uma vez que nada é eterno, se não a eternidade.
Rita Helena Neves e Manoel Ferreira Neto.
(27 de março de 2016)
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