INFINITIVO DO VERBO GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: ENSAIO
IN
MEMORIAM: Antônio Nilzo Duarte (Izabel Cristina Souza Duarte Duarte)
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Em “Uma
data como outra qualquer”, Capítulo 9, Sentimentos da esperança, diz-nos
Antônio Nilzo Duarte “... flamejando raios de luz e sentindo a luminosidade do
céu noturno...”. O espírito é a “fonte da vida”, segundo Jo 4, 134; Sl 36,10, e
a vida brota e a água da vida “jorra” onde habita o Espírito eterno. Com isto
temos a outra imagem: o ser derramado e o fluir do Espírito da Vida. Os frutos
amadurecem nas árvores e a água jorra de sua fonte.
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Onde o
sol brilha, as coisas começam a luzir. O sol re-presenta por excelência o
Numinoso. O numinoso é a experiência que nos toma e nos envolve totalmente. A
experiência de encontro profundo com alguém, que nos lançou uma luz no meio de
uma crise existencial, representa uma experiência do Numinoso.
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Sentimentos
da esperança, con-templado sob os “raios de luz” e a “luminosidade do céu
noturno”, re-vela-nos a experiência que o autor vive no íntimo de si, re-vive
nas páginas de suas memórias, re-pro-jetando a vida, buscando o espírito dos
horizontes e uni-versos do amor vivenciado pela esposa, amor sublime
transcendendo todos os limites O amor nos foi dado para conjugar de sentimentos
verdadeiros e reais o infinitivo do verbo. No amor vivido, compreendeu Antônio
Nilzo Duarte, conjugado com as memórias por ele registradas e eternizadas, que
punha em movimento imenso processo de libertação de suas carências, de
opressões e de limitações de toda ordem. Resgatou o sistema da vida em suas
inter-retro-relações. Recuperou os sentidos, os ouvidos, a voz, as asas, os movimentos,
os olhos e, por fim, a capacidade de seguir as veredas de sua vida
espiritualmente.
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O amor,
“... flamejando de raios de luz e sentindo a luminosidade do céu noturno...”,
amor libertador, fundou a espiritualidade que per-vade o íntimo do autor, que
per-vade as suas páginas, e todo o seu ser é iluminado. Por intuição, vivida e
sentida nesses “raios de luz”, “luminosidade do céu noturno”, soube que no seu
coração de homem que ama com toda a ardência de seu ser que haveria sempre uma
esperança a ser alimentada, uma palavra a ser ouvida, um gesto a ser praticado,
um sinal do eterno a ser interpretado ao longo de sua vida, ao longo de sua
caminhada, trazendo no peito o amor pela saudosa esposa, pela família que
juntos criaram, educaram, mostraram os caminhos do campo a serem seguidos por
todos, e todos os filhos em uníssono re-colheram e a-colheram as lições
espirituais do pai.
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O
entrelaçamento de todos, esposa, filhos, filhas, netos, genros, noras, revela a
insuspeitável riqueza desta relação sensível de amor verdadeiro. Nos dizeres de
Paulo Freire: “Ninguém se liberta sozinho; libertamo-nos sempre juntos”.
Antônio Nilzo Duarte libertou-se de suas dores, angústias, sofrimentos com a
memória de seu amor pela família.
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A
espiritualidade, vista à luz de “... flamejando raios de luz e sentindo a
luminosidade do céu noturno...” é um dado antropológico de base. É a dimensão
profunda do ser humano. A terapia da mente, da alma, escrevendo as memórias,
constitui a meta da construção da Koinonia do ente querido só espírito e do
homem espírito e corpo, a busca da espiritualidade. Assim, Sentimentos da
esperança é rico, di-verso, paradoxal e harmonioso. Os raios de luz
re-presentam o arquétipo da síntese entre o humano e o divino, entre o ser
corporal, mental e espiritual. Sempre estarão aí como uma realidade imanente
das experiências de Antônio Nilzo Duarte. Eles constituem o fundamento da
dimensão espiritual de seu ser. É a base antropológica da espiritualidade que
fora construída com a escritura de sua memória.
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Onde a
natureza se torna fértil há vida. A relação do único Espírito com os múltiplos
dons do Espírito, e da única luz com os múltiplos esplendores, não é a relação
distante do Criador com as criaturas, mas uma relação muito mais íntima.
A realidade
do falecimento da amada e querida esposa do autor trouxe-lhe uma surpresa: a
sua “mente incorporou uma mística sobrenatural do grande amor àquela que,
materialmente desligou-se”.
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Antônio
Nilzo Duarte chama “mística” não as experiências sobrenaturais específicas, mas
sim a intensidade da experiência do amor vivido, que é a busca da fé e
esperança na espiritualidade. As experiências místicas não podem ser
transmitidas através de proposições. A própria vida é para os místicos, desde
Agostinho, o drama do amor a Deus, seja o amor infeliz, o amor desesperado, o
amor libertado, o amor que busca e anseia ou o amor bem-aventurado. Todos os
místicos partem de um mesmo pressuposto: o homem é ser erótico, é seu coração
sedento que o impele, e que só em Deus pode encontrar repouso. Pois o Deus
infinito desperta no homem, sua imagem, uma paixão infinita que destrói tudo
quanto é finito e terreno, se não chegar ao repouso no infinito de Deus. Por
isso a medida do amor místico é o amor sem medida.
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A vida do
autor, desde a perda da esposa querida, é o drama da aceitação, da conformação,
eivado de dores, sofrimentos, tédios, solidão, medo, por na vida conjugal, em
todos os instantes e situações contingenciais, haver sido de uma comunhão
espiritual, de um amor feliz; e, tomando da pena para registrar a sua memória,
narrar e descrever os quase cinqüenta anos de vida juntos com a família, sua
intenção sine qua non é a busca da liberdade, da espiritualidade. Ao longo da
escrita de suas memórias, o autor vai com-preendendo que o amor sentido e
vivido nas profundezas de seu ser despertou nele a imagem da espiritualidade, é
através dessa imagem que superará o finito e terreno de suas dores e
sofrimentos, instituirá o descanso no infinito de seu espírito, em comunhão com
o eterno e o imortal, na síntese de sua vida terrena e da vida transcendente de
sua esposa querida. O que é descrito, narrado, em suas memórias, é no fundo a
história da libertação da dor e sofrimento das formas infelizes e melancólicas,
é a história da espiritualização do amor e do infinitivo do verbo amar.
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O amor ao
próximo pressupõe o amor a si. Não podemos amar os outros se não amarmos a nós
mesmos. Nesta experiência de dor e sofrimento, de angústia e tristeza, o autor
não está perdendo o amor a si, como algumas vezes deixa inscrito nas linhas de
suas memórias, mas este amor por si mesmo está se distanciando a passos
rápidos, e ele necessita resgatá-lo em sua inteireza e plenitude, ele precisa
com este resgate dar continuidade à sua vida. Não poderemos amar a nós mesmos,
se não quisermos ser nós mesmos, mas sim outros. No sentido literal, um amor
“despojado de si” não é amor, porque falta-lhe o sujeito. Através de seus
sofrimentos e dores, o autor sente que lhe está faltando este sujeito, é na
tentativa, através das memórias, que ele buscara o resgate desse sujeito, e
resgatá-lo significara comungar o amor e o infinitivo do verbo amar, nesta
comunhão espiritualizar-se; “espiritualizar-se” significa, para ele, a união de
seu amor contingente com o amor transcendente, com a transcendência do
espírito.
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A vida
espiritual traduz um dado antropológico objetivo, pré-existente á consciência e
independente de nossa vontade. O ser humano possui naturalmente interioridade.
E essa interioridade, na obra Sentimentos da esperança, em Antônio Nilzo
Duarte, é habitada pelos raios de luz e luminosidade do céu noturno.
#RIO DE
JANEIRO, 08 DE ABRIL DE 2020, 12:19 a.m#
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