#CINZAS E SEGREDOS DO EXÍLIO# GRAÇA FONTIS: PINTURA Manoel Ferreira Neto: PROSA
A vida é
sempre a primeira hora.
@@@
Sempre em
torno rebenta a esperança de quem inicia, explode a bomba dos ideais do
espírito, renova-se a vida, re-nascem experiências de comunhão. A vida, o
instante primevo – ignoro, se não tenho podido explicar aos homens de alma e
coração puros, seria que tais homens efetivamente existissem?, cenas e imagens
sobre que nem sempre falo, nem sempre emito parecer. Quem sabe a razão de não
saber seja haver instituído um caráter e personalidade intransigentes para não
mostrar a sensibilidade. O medo é saudável, trata-se da preservação da vida.
Defendo a sensibilidade a unhas e dentes sim. O exílio é de meu direito, pedra
angular da liberdade.
@@@
Só nos
ermos
em que
não caíram as cinzas do exílio,
a vida
conserva
a
divindade do talento e do dom,
a
supremacia da consciência e do saber.
@@@
No sonho,
alarme, mistério, a presença de mim a mim, mundo submerso na intimidade,
pensamentos mergulhados nos cofres da alma – só há problema para a vida, o de
conhecer a condição, saber as incapacidades, limites, e de restaurar a partir
daí autenticidade.
@@@
Será que
estou cedendo ao tempo avaro, inverno do mundo? Mas é a nostalgia da palavra,
melancolia do verbo que emocionam o coração e fazem o espírito vibrar de
júbilo. Seja dito que o segredo grita, frágil, para a insolência da meiguice,
nas sementes dos sonhos do verbo; é isto que deve ser dito, qualquer mistério é
liame do silêncio o tempo amarra na eternidade.
@@@
Ai de
mim!... Lá chego, cansado de tantas subidas, às vezes de ladeiras absurdas às
pernas, vejo nada sofreu metamorfose; encontro-me mesquinho como outrora, a
alma sequiosa suspira por água refrescante. Caminhada exaustiva até chegar ao
topo desta serra, vê-se a amplitude do vale.
@@@
Talvez,
estando prestes a morrer de fadiga, possa renunciar ao mausoléu dos néscios
para ir deitar-me na areia do deserto sob a mesma luz, e possa apreender o fogo
ardente penetrou-me. Quase sem forças, rasgo verbos, trituro uma cocada baiana,
adocico a língua que não emite qualquer som.
Os olhos
ofuscados veem os sonhos como vasto campo a revelar-se entre duas realidades, a
do horizonte e a do infinito. É verdade que se me revelou ao espírito, estando
a relembrar esta fala, e que, salvo não estar tergiversando as idéias,
concedendo-lhes substancialidade, não pude me furtar ao desejo de
contemplá-las.
@@@
O segredo
está enterrado no vale de oliveiras,
sob a
relva e violetas frias,
em volta
de casebre cheirando a tinta fresca
que os
lenhadores pintaram.
Noite e
dia, falo, levanto a voz, clamo,
Engrolo
sentidos e desejos,
Engolipo
categorias e pensares.
Tudo se
inclina. Surdo a todas as vozes.
Sou
dragão do abismo, esperando o instante
De cuspir
chamas.
De olhos
abertos a quaisquer movimentos.
@@@
Muitas
das dores amenizaram-se, iniciando outro estilo de ser. Alegria humilde e,
todavia, excessiva, eleva-me, transfere-me à evidência dominadora que respiro
como ar de alhures.
@@@
Penso e
imagino que a tarefa humana é fechar e apertar os olhos, e ver se continua pela
escuridão do quarto de dormir o sonho avesso da ambição e volúpia, inveja e
ansiedade, a utopia reversa do ex-tase e da hipocrisia.
@@@
Dilação
indefinida – desde que tomei consciência desta expressão, tenho sobremodo
pensado nela; talvez seja categoria. Consiste em manter o processo em uma das
fases iniciais. Para conseguir tal coisa é preciso que o acusado e colaborador,
certamente este último, mantenham ininterrupto contato pessoal com a justiça.
@@@
As horas
acham-se encantoadas. Os minutos, presos no pêndulo, entorpecidos. Os segundos,
parados nos ponteiros. É à tarde, quando o dia penetra no abismo do tempo, que
a existência é quotidiana. Há ansiedade vã na noite, céu sem luminosidade. Até
neste torpor sem limites, cada ação e gesto revelam-me.
@@@
Não sei
dizer se fazia pouco de mim, se procurava feixe de luz por abertura estreita;
gostava dela, muito. Dizia “eu” e, dizendo “eu”, era extraordinária maravilha.
@@@
Todo
imenso, abençoado, envolvido por neblina, estende-se diante da alma; coração,
alegre e saltitante, como convém à criança que sai do supermercado Extra,
chupando pirulito, aí mergulha e se perde, da mesma forma que os olhos,
ardentemente aspiro a entregar-me aos prazeres efêmeros, deixando-me impregnar
de sentimento único...
@@@
Devia ter
percebido para que porto o coração selvagem se dirigia, e, selvagem, os
sentimentos puros se revelariam, apesar de a sombra ombrear os passos. De que
me valeria a selvajaria, não fosse a presença da sombra a ombrear-me os passos.
Não sei elucidar os contrários e adversidades. Quem sabe o caminho da
consciência seja itinerário a ser seguido para vencer as dificuldades!...
@@@
Falo com
paixão. Paixão louca pode justificar quimeras e fantasias deléveis. Não
justifica o mais importante: o erro. Sendo este incontestável, fatos não podem
trapacear. Muitos, não olhando de soslaio e se afastando, fá-lo de longe
indecisos, com hospitalidade de sorriso mesclado de dúvidas e medos.
@@@
Homem
que, tomado de espanto diante da mediocridade, apela para forças e transporta
facilmente cargas que, de sangue frio, mal poderia empurrar. A natureza humana
suporta a tristeza, alegria, até certo limite; se o ultrapassar, sucumbirá.
@@@
A questão
não é saber se o homem é digno de respeito ou dó, solidariedade ou pena, mas se
pode aturar a medida da imbecilidade, que lhe é de vocação e direito.
#RIO DE
JANEIRO, 06 DE ABRIL DE 2020, 12:02 p.m.#
Comentários
Postar um comentário